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'Chuva É Cantoria na Aldeia dos Mortos' tende a ser mais visto no exterior

Filme brasileiro estreia no país após ser exibido em Cannes no ano passado

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“Chuva É Cantoria na Aldeia dos Mortos”

  • Classificação Livre
  • Elenco Henrique Ihjãc Krahô, Raene Kôtô Krahô
  • Produção Brasil, Portugal, 2018
  • Direção Renée Nader Messora e João Salaviza

Costumamos ver nossos índios pelo estado miserável a que foram reduzidos após o contato com os brancos, pela descaracterização de sua cultura por missionários cristãos de várias tendências, do roubo de suas terras pela ação de grileiros e fazendeiros, da pura e simples ameaça de extinção.

Sabemos ainda, por palavras e atos do atual governo federal, que essa ameaça é ainda maior hoje do que no passado. Mas não é esse o ponto de “Chuva É Cantoria na Aldeia dos Mortos”. O que o português João Salaviza e a brasileira Renée Nader Messora pretendem mostrar no filme que conceberam e dirigiram é a beleza e a riqueza de culturas indígenas praticamente ignoradas pelos brancos.

No caso, estamos em uma aldeia krahô, na região Norte do país, onde o jovem Ihjac se defronta com duas questões: a chegada do momento do ritual de passagem do espírito paterno (que significa o fim do luto) e a hipótese de se tornar pajé de seu grupo.

É em torno dos dramas pessoais de Ihjac, Henrique para nós, que se desenvolve o filme. Se a questão do pai é envolta em dor, o peso da indicação (por entidades da natureza) para pajé lhe pesa como chumbo. Pesa o bastante para deixar a aldeia e tentar viver entre os brancos de uma cidade próxima.

O filme evita indispor brancos e índios. Ao contrário: ali parece haver harmonia no convívio entre eles, apesar de certas dificuldades (linguísticas, para começar). Não se trata de negligenciar os perigos que envolvem as culturas indígenas, mas a abordagem dos cineastas procura, justamente, trazer a nós a riqueza e a beleza dessas culturas.

É possível se espantar, sempre, com algum excesso de beleza, seja nos hábitos da tribo, seja na natureza que a cerca. Uma edulcoração da sociedade indígena? Mas é possível também o espectador se deixar levar pelos encantos que desconhecemos dessa cultura, exemplo de nossa imensa ignorância sobre os modos de se comportar dos indígenas.

Se já conhecemos à saciedade o sofrimento e a miséria a que foram os índios reduzidos pelo homem branco, não nos fará mal algum a descoberta de hábitos, rituais, belezas, dores e magias que fazem parte do modo de vida krahô (ainda que vez por outra essa visão pareça contaminada por alguma complacência).

A notar, ainda: 1) certas rimas muito interessantes, como a visão do lago onde se revela a Ihjac o momento de cuidar do ritual de passagem do espírito paterno, no início, e no final um suicídio, no mesmo local, e que não deixa de remeter a outro belo filme sobre a existência indígena, “Uirá” (1973), de Gustavo Dahl. 2) Como é triste a imagem de um índio vestindo uma camiseta patrocinada por alguma loja e perambulando numa aldeia de brancos. 3) O título internacional do filme, “Os Mortos e os Outros”, parece mais claro e mais comunicativo. Talvez lhe tenha ajudado a ganhar um prêmio especial do júri da mostra Um Certo Olhar, em Cannes, em 2018.

De todo modo, mais um filme brasileiro que tende a ser mais visto no exterior do que entre nós.

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