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Cinema

'A Cidade dos Piratas' é filme obrigatório para fãs de HQs e de Laerte

Ao costurar histórias publicadas em vários anos diferentes, longa expõe as transformações do trabalho da cartunista

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A Cidade dos Piratas

  • Quando Estreia na quinta (31)
  • Produção Brasil, 2018
  • Direção Otto Guerra

O humor de Laerte nunca foi convencional. Por isso, um filme inspirado em seus trabalhos nunca poderia ser uma obra convencional. "A Cidade dos Piratas" é uma animação inquieta, com trechos de filme e uma mescla de humor com visões históricas e filosóficas sobre o Brasil.

O  diretor Otto Guerra criou, com os roteiristas Laerte, Rodrigo John e Thomas Créus, uma história que reúne HQs clássicas, resgatadas de "Piratas do Tietê", uma das revistas mais bem-sucedidas no boom do quadrinho nacional nas bancas, nos anos 1980 e 1990.

Quem é fã certamente vai se lembrar dos piratas de Laerte capturando Fernando Pessoa em pleno rio Tietê, ou do homem que se apresenta como orador em um evento público nu da cintura para baixo.

O caráter nada politicamente correto do Capitão e seu bando continua intacto. Nos tempos atuais, em que beijos homoafetivos de heróis Marvel praticamente param o país, é quase inconcebível que Laerte publicasse hoje as aventuras de seus piratas sem ser alvejado por críticas ferozes e tentativas de censura.

Mas "A Cidade dos Piratas" é mais do que uma colagem de ótimas histórias para homenagear a trajetória de Laerte. Há muito material criado diretamente para a animação. A vida real da cartunista e do diretor do filme se insinuam pela narrativa. No meio das imagens no traço personalíssimo de Laerte, a própria surge em depoimentos que servem para entrelaçar mais ainda a vida real e a obra no papel.

Guerra optou por uma edição que vai e volta em cenários e personagens. Cria uma sensação de looping, que realça pontos cruciais na assimilação do trabalho da cartunista. Laerte é genial ao reconhecer o ridículo e o absurdo no dia a dia.

Ao costurar histórias publicadas em vários anos diferentes, o filme expõe as transformações do trabalho de Laerte. Nos últimos tempos, a cartunista parece mais, digamos, reflexiva em seu humor. Nos quadrinhos em tiras para jornal, opta pela ruptura da lógica, numa desconstrução do óbvio. Nos cartuns, preserva o olhar afiado para a cena e os personagens políticos e sociais, expondo a crítica ácida que os tempos inspiram.

"A Cidade dos Piratas" traduz essas características muito bem. Guerra sabe o que faz, com experiência em levar para a tela o humor de cartunistas, como Adão Iturrusgarai ("Rocky & Hudson: Os Caubóis Gays") e Angeli ("Wood & Stock: Sexo, Orégano e Rock'n'roll").

Laerte e Guerra combinam vidas e obras num filme obrigatório para quem gosta de quadrinhos.

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