Cinemateca Brasileira não tem cargo prometido por Bolsonaro a Regina Duarte

Deputada Carla Zambelli, que tutelou saída da atriz da Cultura, diz que nomeação depende de burocracias

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Brasília e São Paulo

Ao anunciar o afastamento da atriz Regina Duarte do comando da Secretaria Especial de Cultura nesta quarta (20), o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) disse que ela iria para a Cinemateca Brasileira, responsável pela preservação e difusão do patrimônio audiovisual brasileiro.

Questões jurídicas podem dificultar a ida da atriz para a instituição, no entanto. Isso porque a Cinemateca Brasileira deixou de ser administrada diretamente pelo governo federal há quatro anos, quando teve sua gestão transferida para uma organização social, a Acerp, Associação de Comunicação Educativa Roquette Pinto. O modelo usa características de administração privadas em entidades públicas.

A advogada Marcela Arruda, sócia do escritório Rubens Naves Santos Jr. e especialista em direito administrativo, afirma que, para Regina assumir alguma função relacionada à Cinemateca, haveria três alternativas.

A primeira seria a sua contratação pelo próprio governo federal para a coordenação-geral da Cinemateca, um cargo de confiança. Nele, Regina atuaria como representante da Secretaria do Audiovisual e supervisionaria as ações do equipamento.

Nada impede também que a própria Acerp contrate diretamente Regina. Mas, lembra a advogada, uma das principais características do modelo das organizações sociais é a autonomia de gestão.

Internamente, o principal cargo existente que poderia ser ocupado pela atriz é o de superintendente da Cinemateca, hoje ocupado por Roberto Barbeiro, indicado pelo Republicanos e que conta com a bênção do bispo Edir Macedo, da Igreja Universal.

Uma terceira possibilidade seria a ruptura com o modelo de organizações sociais e o retorno da Cinemateca à administração federal, em que os funcionários são alocados diretamente pelo governo.

Seja qual dos meios for escolhido, no entanto, antes de tudo o governo federal precisaria resolver a situação da Cinemateca, hoje ameaçada por falta de recursos.

O contrato governamental com a Acerp foi assinado há dois anos. Desde então, o governo faz um repasse anual à Roquette Pinto para gerir o espaço.

No ano passado, a previsão era de entrada de R$ 13 milhões, mas só R$ 7 milhões foram transferidos até dezembro. A demora, dizem pessoas ligadas ao tema, está relacionada à desestruturação da Secretaria Especial da Cultura, que tem parte de suas funções na Cidadania e parte no Turismo.

Com 64 funcionários, tem previsão de receitas de R$ 11 milhões para 2020, queda de 14,7% com relação ao ano passado, em termos nominais.

Pessoas do meio veem risco de prejuízo ao acervo, já que são exigidas salas climatizadas e processos químicos para o correto acondicionamento.

No Congresso, parlamentares relatam dificuldades para transferir, por exemplo, recursos de emendas para a Cinemateca por impedimento por parte do governo federal em empenhá-las.

Responsável por costurar a saída de Regina Duarte da Secretaria Especial da Cultura, a deputada Carla Zambelli (PSL-SP) disse nesta quarta (20) no Palácio do Planalto que a formalização da ida da atriz para a Cinemateca de São Paulo ainda está pendente.

Segundo a deputada, a nomeação da agora ex-secretária depende de questões burocráticas que não têm prazo para serem resolvidas.

Depois de passar por semanas de fritura, Regina foi destituída do cargo de secretária especial de Cultura, no qual permaneceu por menos de três meses.

Como mostrou a Folha nesta quarta (20), a atriz costurou uma "saída honrosa" do governo Bolsonaro com a ajuda de Zambelli e de militares auxiliares do presidente.

"A secretária [Regina] não saiu ainda [do cargo]. Ela vai fazer a transição", disse Zambelli no Palácio do Planalto.

"Vai primeiro ter um decreto, tem uma organização que precisa ser feita para ela poder ir para a Cinemateca", acrescentou. "A formalização da ida [para a Cinemateca] dela [Regina] precisa resolver essa questão burocrática. E aí vincular como um cargo do governo em São Paulo."

Os detalhes do que seriam essa transição não foram esclarecidos nem pela parlamentar, nem pelo Planalto e nem pela atriz.

Após café da manhã no Palácio da Alvorada, a ex-atriz da TV Globo se deixou filmar com Bolsonaro para dar uma versão mais leve para sua saída, de que estaria com saudades de seus familiares, que moram em São Paulo, e que por isso deixaria o governo para assumir a Cinemateca, que fica na capital paulista.

Aliados de Regina, que viam com ceticismo essa costura de acordo com Zambelli, também são reticentes sobre essa indicação para a Cinemateca e veem grandes chances de isso não ser cumprido.

Segundo Zambelli, a nomeação de Regina depende da edição de um decreto que reestrutura a Secretaria Especial da Cultura. Essa mudança está pendente desde janeiro deste ano, quando Roberto Alvim foi demitido do cargo depois de parafrasear um ministro da Alemanha nazista.

Reduzida de ministério a secretaria na gestão Bolsonaro, a Cultura era subordinada ao Ministério da Cidadania e foi transferida para o Turismo no fim do ano passado. Como a mudança não foi feita completamente, a estrutura está na prática dividida entre as duas pastas.

A edição do decreto foi mais uma das derrotas de Regina em sua rápida passagem pelo governo. Ela tentou, sem sucesso, modificar a estrutura da Secretaria, o que poderia lhe garantir mais autonomia para trabalho.

Zambelli afirmou ainda que a ex-secretária da Cultura deve preparar uma série de vídeos com divulgações sobre o trabalho da atriz à frente da estrutura.

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