O filme "Menarca", da cineasta paulistana Lillah Halla, foi apresentado neste domingo (18) na Cinemateca Francesa. O curta, selecionado pela Semana da Crítica do Festival de Cinema de Cannes e pelo Festival Biarritz América Latina, aborda questões como os ritos de iniciação e a sexualidade feminina a partir do mito da “vagina dentada”.
“Menarca”, cujo título faz alusão à primeira menstruação, conta a história de Nanã e Mel, duas meninas que entram na adolescência em um vilarejo brasileiro cercado por piranhas. A diretora Lillah Halla, que vive atualmente na Alemanha, sublima a transformação das duas meninas em mulheres em um contexto machista e repleto de mitologia.
Um dos fios condutores da trama é o conceito da “vagina dentada”. “Esse mito tem várias expressões em culturas diferentes, mas sempre com a ideia de que na vagina existem dentes e que, portanto, é preciso fazer certos rituais violentos com uma mulher para garantir que ela seja domada”, resume a diretora em entrevista exclusiva à RFI.
“Até hoje esse mito é bastante conhecido. Ele tomou várias formas mas, em geral, parte de um medo e pertence mais ao imaginário masculino”, afirma a cineasta, que trabalhou cercada por mulheres roteiristas no projeto. Segundo ela, esse é um mito que resume um “medo de castração, mas que, ao mesmo tempo, encobertou e legitimou muitas violências”.
No filme, Nanã, de 13 anos, interpretada por Amanda Yamamotto, vê seu corpo se transformar e sente na pele como a relação com os homens se altera. “Queríamos partir desse mito bastante misógino e violento e nos perguntar o que acontece se transformamos isso numa ferramenta imaginária de poder”, aponta.
Em meio a todas as transformações, a personagem principal encontra refúgio numa espécie de fascinação pelas piranhas que cercam a região. “Partimos desse sentido ambíguo que têm as piranhas no Brasil, que é um termo pejorativo para uma mulher sexualmente livre, ativa ou empoderada”, defende a diretora.
Numa das leituras possíveis dessa mesma fábula, Lillah Halla usa a “vagina dentada” para abordar o conceito de monstruosidade que, segunda ela, está embutido no mito. “A ideia do monstro é muito importante dentro do filme. Não o monstro como nos contos da Disney, e sim do ponto de vista etimológico. Monstro vem de 'mostrare'. É essa figura que vem mostrar algo que talvez você não esteja preparado para ver e, por isso, existe essa tendência a ter medo do que o monstro mostra”, ela acrescenta.
O curta “Menarca” segue sua carreira participando de vários festivais internacionais.
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