Descrição de chapéu

Amber Heard vira uma persona tóxica e terá os seus 20 anos de solidão

A ex-mulher de Johnny Depp agora é uma mulher-bomba, de quem ninguém vai se aproximar por muito, muito tempo

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Acabou nesta sexta-feira, depois de 45 dias, o julgamento em que Johnny Depp acusa Amber Heard de difamação e ela o contra-acusa do mesmo crime. Ele pede uma indenização de US$ 50 milhões, ela, de US$ 100 milhões. Foi um mês e meio de muita lavação de roupa suja, em que o pior dos dois atores americanos foi exibido, estudado, analisado por um dos lados e depois negado pelo outro.

Nesta sexta, os advogados fizeram as considerações finais, e a advogada estrela de Johnny Depp, Camille Vasquez, não estava em seu melhor dia. Leu o texto sem emoção, não fez uma recapitulação dos fatos de maneira convincente, não estava com a gana que mostrou diversas vezes quando interrogava as testemunhas do outro lado ou interrompia o discurso delas com pedidos frequentes de objeções, a maioria concedida pela juíza.

O time de Amber Heard, que parecia apático e mal preparado, nesta sexta se levantou e falou com autoridade sobre o caso para os sete membros do júri. No último dia em que ouviu testemunhos, o time de Heard já tinha saído em vantagem, por causa do discurso feito pela própria atriz, que pela primeira vez chorou com verdade quando contou como estava sendo a vida dela desde que o julgamento dominou as redes sociais. Ameaças de morte diárias, xingamentos toda vez que chegava e saía do tribunal em Fairfax, no estado americano da Virginia.

A atriz Amber Heard durante depoimento na corte de Fairfax, nos Estados Unidos - Michael Reynolds/Reuters

Mas é improvável que essa reviravolta final mude alguma coisa. Os sete membros do júri passaram tempo demais ouvindo as mesmas histórias, esmiuçadas de todas as maneiras, com especialistas dos dois lados dizendo coisas conflitantes. É quase desumano pensar que eles vão, de fato, esperar até o último minuto para decidir em qual dos dois acreditam.

Dispensados no começo da tarde desta sexta, foram instruídos a não fazer nenhuma pesquisa sobre o julgamento, não falar com ninguém sobre o assunto e descansar. Segunda-feira, dia 30, é feriado nos Estados Unidos, então eles só voltam ao caso na terça-feira, dia 31, para deliberar e chegar a um veredito.

Alguém acredita que um ser humano razoavelmente normal aguenta se desligar completamente dessa história nesse fim de semana prolongado? Sem comentar com a família, com os amigos, sem espiar o Instagram, o Facebook, o WhatsApp?

Ninguém será preso, isso não está em jogo. Um dos dois será considerado culpado, condenado a pagar ao outro uma indenização que valerá uma grande quantidade de dinheiro –e fim.

Tanto Johnny Depp quanto Amber Heard já perderam contratos, trabalhos, tempo, dinheiro e energia nesse processo. Um dos dois vai recuperar uma parte ou todo o dinheiro que perdeu, mas, se a história recente nos dá algum insight em relação ao futuro, Amber Heard já está condenada ao ostracismo pelos próximos 20 ou 30 anos.

Ainda que ela saia vencedora na semana que vem, ela não terá provado que não é a alpinista social dissimulada, cruel, vingativa e mentirosa que os milhões de TikTokers juram que ela é, e que a opinião pública em geral, se não tem certeza que ela seja a bruxa imunda que os advogados de Johnny Depp apresentaram no julgamento, no mínimo desconfia.

É possível que ela tenha mentido sobre tudo, que nunca foi agredida por seu ex-marido e só queria o dinheiro dele, assim como as propriedades mais valiosas. Também é possível que ela tenha aumentado todas as histórias para prejudicar o ator, pintando uma imagem de monstro em pele de cordeiro. E, sim, pode muito bem ser tudo verdade. O fato é que nenhum dos dois conseguiu provar o que foi ao tribunal para provar –que é inocente, e o outro, louco.

Mas agora Amber Heard é tóxica. E será por muitos e muitos anos.

Quase sempre, quando um homem e uma mulher famosos têm a intimidade exposta ao mundo, não importa se estão simplesmente transando com o marido na lua de mel, ou tendo um caso com o chefe, para falar de duas situações reais e bem corriqueiras, a mulher tende a carregar essa marca por muito mais tempo que o homem.

Basta lembrar Pamela Anderson, a noiva que teve um vídeo de sua lua de mel com o marido, o músico Tommy Lee, roubado e vendido para milhões de pessoas em 1995. A carreira dela nunca mais se recuperou, enquanto a dele, que estava entrando em decadência, foi alavancada pelo caso. Tommy Lee foi preso por quatro meses por agredir Pamela Anderson, enquanto ela segurava o filho dos dois no colo. Foi assim que acabou o casamento deles.

Em 2001, um menino de quatro anos de idade se afogou e morreu na piscina de sua casa. Os pais da criança o processaram por negligência. Ele foi absolvido. Em 2004, lançou uma autobiografia que virou best-seller, "TommyLand". Em 2005, estreou o reality show "Tommy Lee Goes to College". A banda de que fazia parte, Mötley Crüe, anunciou o fim das turnês em 2015, mas voltou a fazer shows quando a cinebiografia "The Dirt", de 2019, foi lançada e fez sucesso na Netflix.

Pamela Anderson nunca conseguiu ser levada a sério como atriz, como era o seu desejo. Só neste ano, 27 anos depois do escândalo, aos 54 anos de idade, conseguiu um papel de destaque em uma peça na Broadway, "Chicago", em que estreou coincidentemente no dia 12 de abril, primeiro dia do julgamento de Johnny Depp e Amber Heard.

Dois meses antes, foi ao ar a série "Pam & Tommy", que contava, em oito episódios, a história do romance que viralizou por causa de uma fita VHS que introduziu ao mundo vários novos conceitos e preconceitos –o primeiro, justamente o de que algo poderia viralizar, mesmo que esse termo só tenha sido criado vários anos depois; o segundo, que "sex tapes" de gente famosa valeriam ouro (naquela época, hoje isso já foi assimilado e banalizado).

Um terceiro ponto é que mesmo uma mulher recém-casada, transando com o marido na lua de mel, seria considerada uma piranha se as pessoas a vissem no ato. Por fim, a série deixou claro que o ponto de vista de Anderson só seria considerado quase 30 anos depois.

O outro exemplo é Monica Lewinsky, a ex-estagiária da Casa Branca que teve um relacionamento com o presidente Bill Clinton durante dois anos, entre 1995 e 1997. Sua história veio a público quando uma colega de trabalho, Linda Tripp, para quem ela contou seu segredo, começou a gravar os telefonemas da amiga. A notícia provocou um escândalo em 1998, quando o site Drudge Report publicou a história pela primeira vez.

Clinton negou o caso várias vezes, inclusive numa entrevista coletiva na Casa Branca. Por fim, admitiu numa gravação para a TV que teve um relacionamento "não apropriado" com sua ex-estagiária. Correu o risco de sofrer um impeachment por ter mentido sobre o caso e tentado obstruir a Justiça, mas foi absolvido. Sua mulher, Hillary Clinton, nunca deixou de apoiar o marido.

Monica Lewinsky, por outro lado, foi demitida, humilhada e virou o assunto favorito de todos os comediantes da época, que faziam piadas com o seu sobrepeso, seu cabelo, suas roupas e todos os detalhes que haviam sido tornados públicos no processo. Quem não pensa em Monica Lewinsky quando vê um charuto?

Ela tentou lançar uma linha de bolsas, um plano de dieta, mas nenhum dos dois deu certo. Foi embora dos Estados Unidos e decidiu estudar psicologia em Londres para fugir dos holofotes. Em 2014, 16 anos depois do escândalo, decidiu fazer campanha contra cyberbullying, termo que nem existia quando ela passou por isso.

No ano passado, a terceira temporada da série "American Crime Story", que reconta crimes reais americanos, narrou, em dez episódios, a história de Monica Lewinsky, que foi uma das produtoras executivas da trama.

Foi como se a sociedade estivesse finalmente pronta, 24 anos depois do escândalo que transformou a ex-estagiária de 22 anos num pária, numa pessoa intocável, por ter se envolvido com um homem sedutor, mulherengo e que ocupava o cargo mais poderoso do mundo, a examinar de novo aquela história e pedir desculpas a Monica Lewinsky.

Bill Clinton e sua mulher ganharam US$ 230 milhões desde que ele deixou a Casa Branca, em 2001. Suas palestras custam entre US$ 225 mil e US$ 500 mil. Ele publicou um livro de memórias em 2004, "Minha Vida", que ficou em primeiro lugar na lista de best-sellers do jornal The New York Times durante diversas semanas. Aos 75 anos, mora com a mulher no vilarejo de Chappaqua, de onde coordena o trabalho da Clinton Foundation, que tem como missão juntar parceiros para melhorar a vida das pessoas no mundo todo.

Johnny Depp tem uma carreira de 38 anos no cinema, é um dos atores mais versáteis e talentosos de Hollywood e carrega com brio a imagem de menino mau com coração de ouro desde 1990, quando interpretou um personagem com esse perfil, Cry Baby, no filme de mesmo nome.

Ele corre um risco enorme de ser o perdedor na semana que vem. Mas o tipo de engajamento que ele conquistou com esse julgamento não vai evaporar de uma hora pra outra. O que os sete jurados vão dizer quando chegarem a um consenso não vai nem arranhar o que ele ganhou até aqui.

Amber Heard, por sua vez, pode até sair dessa trama com um belo pé de meia. Mas é muito provável que a gente só venha a conhecer o lado dela dessa história lá pelo ano 2050.

.

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Tópicos relacionados

Leia tudo sobre o tema e siga:

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.