Vera Holtz volta aos palcos de teatro em 'jam session' à luz dos ataques golpistas

Atriz encena 'Ficções', que traz o livro 'Sapiens', do autor israelense Yuval Noah Harari, a um Brasil apocalíptico

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São Paulo


A certa altura, em "Ficções", peça que chega ao palco do teatro Faap nesta quinta-feira, Vera Holtz faz uma proposta ao público e, em troca de aplausos, abre botões da blusa do figurino. Segundo a artista, mais que moeda de troca, aplaudir é historicamente uma forma de fazer os deuses atentarem a algo extraordinário na Terra.

Segundo Holtz, o que houve de extraordinário foi o retorno do Ministério da Cultura, agora sob a gestão de Margareth Menezes. A cantora assume a pasta no novo governo de Luiz Inácio Lula da Silva, do PT, de quem a atriz foi eleitora.

"Temos um tempo novo para rever, reorganizar, então estou motivada e aplaudo. Quero chamar a atenção dos deuses para que iluminem os caminhos dessas pessoas."

A atriz Vera Holtz em cartaz de divulgação da peça 'Ficções', baseada no livro 'Sapiens', de Yuval Noah Harari
A atriz Vera Holtz em cartaz da peça 'Ficções', baseada no livro 'Sapiens', de Yuval Noah Harari - Ale Catan/Divulgação

O perfil da cantora é, na visão da atriz, o ideal para que a pasta volte a gravitar em torno dos interesses do setor das artes. "Vejo aquela mulher forte, com aquela vivência de palco, de cima de um trio elétrico, dialogando com a população, e isso me anima. Ela está ali para o preparo das novas gerações, deixando caminho para que nos enxerguemos."

É justo o talento de observar e se manter aberta ao outro que inspirou o produtor Felipe Heráclito Lima a convidar Holtz para o projeto que idealiza com base em "Sapiens, Uma Breve História da Humanidade", de Yuval Noah Harari.

Longe dos palcos desde o início da pandemia, quando interrompeu a turnê por Portugal, ela aceitou o convite após uma pausa introspectiva, da qual saiu esperançosa no mundo, com fome de produzir.
"Queria ficar quieta. Foi um processo intenso, as pessoas fizeram muitas coisas e tudo me interessava. No TikTok, por exemplo, você chega a todos os lugares do mundo, se conecta, e isso me fascina."

Fã do Instagram, a atriz viralizou com fotos conceituais, que repercutem o momento político e social do Brasil. Mas ela separa criatura e criadora, embora diga respeitar e reverenciar o olhar de seu público.
"Virou entidade, né? Não tenho controle sobre o que as pessoas acham ou como me veem, mas tenho cuidado e responsabilidade sobre a imagem e o que ela desperta."

Essa entidade inspirou o diretor e dramaturgo Rodrigo Portella a reforçar o convite. Mesmo sem jamais ver a atriz em cena, a entidade Vera Holtz guiou a adaptação, que não é uma encenação, mas um produto novo, que Holtz caracteriza como "jam session".

"A peça é um ponto de interrogação, uma grande pergunta. É sobre a teoria que o Harari levanta no livro, com a perspectiva de um homem israelense no final da primeira década deste século, mas é também uma tensão entre o que penso enquanto um homem brasileiro no início da terceira década deste século, com as adaptações que o tempo permitiu", diz o diretor.

A montagem reverbera a teoria de Harari sobre o conceito de humanidade e como a nossa espécie foi alçada ao topo da cadeia alimentar por um processo evolutivo e da nossa capacidade de crer, criar coletivamente e cooperar.

Acompanhada em cena pelo multi-instrumentista Federicco Puppi, Holtz não vê como não se deixar tocar pelos atos violentos e golpistas de 8 de janeiro, em Brasília. Ele, contudo, não acredita que isso interferira na leitura de "Ficções", embora veja a montagem como uma celebração da reconexão com o público.
"Celebramos em coletivo as questões a serem vividas. É lugar de recriar e se conectar, ir de encontro. O outro também me vê, e quero ser vista."

Ficções

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