Descrição de chapéu
mostra de cinema de sp

Drama 'Dentro do Casulo Amarelo' é uma incursão pela fé do Vietnã rural

Longa ganhou prêmio em Cannes e retrata a despersonalização provocada pelas cidades, mas peca pelo excesso de cenas longas

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Dentro do Casulo Amarelo

Thien é um homem na casa dos 30 anos que se acostumou a viver no caos de Saigon, maior cidade do Vietnã. Ou pelo menos aprendeu a conviver com ele. Entre bicos que faz para sustentar um minúsculo apartamento e seu vício em cigarros, que fuma constantemente, está o de editor de vídeo de casamentos.

Cena do filme 'Dentro do Casulo Amarelo', de Pham Thien An
Cena do filme 'Dentro do Casulo Amarelo', de Pham Thien An - Divulgação

Nos momentos de lazer, vai à sauna com os amigos, local que também oferece massagens sensuais em salas privativas de paredes tingidas por um verde desbotado. Mas, em um desses dias, que parecem se repetir com frequência pelo ar entediante de Thien, seu celular toca sem parar.

Ele se recusa a atender, pensando ser um cliente ligando fora de seu horário de trabalho. Até que, no momento em que a massagista finalmente toca suas partes íntimas, o seu amigo bate à porta e diz que se trata de uma emergência familiar.

Thien é informado sobre a morte de sua cunhada em um acidente. Dao, seu sobrinho de cinco anos, sobrevive, e agora cabe ao tio levar a criança para a cidade natal de ambos, no interior.

É com o deslocamento para longe das buzinas repetitivas e ruas abarrotadas de gente que a narrativa de "Dentro do Casulo Amarelo", dirigido pelo jovem Pham Thien An, vencedor do Caméra D’Or de melhor primeiro longa-metragem em Cannes e agora exibido na 47ª Mostra de Cinema de São Paulo, inicia de verdade. Além de promover mais silêncio em tela, o novo cenário dá as boas vindas ao espectador com um longo take das colinas vietnamitas, cobertas por uma neblina espessa.

Mas a visão turva da paisagem impede que o cenário seja idílico. Pelo contrário, o torna sublime, no sentido dado pelos pintores românticos de que a natureza, com toda sua grandeza, se torna confusa e ameaçadora.

Uma boa pista para o desenrolar do filme. Se em um primeiro momento Thien acompanha o sobrinho para amenizar seu luto, o retorno às suas origens o forçam a ficar cara-a-cara com desejos antigos, relações perdidas e abandono de tradições.

Seus pais não estão mais lá, migraram para os Estados Unidos. Um dos irmãos, o pai de Dao, está sumido desde que abandonou a mulher e o filho, ainda bebê. A paixão da juventude de Thien aderiu ao celibato e se tornou freira.

Através da crise existencial de Thien, o filme aborda, de forma sutil mas certeira, a despersonalização de indivíduos provocada pela migração forçada em direção às áreas urbanas, em que o individualismo impera sobre qualquer senso de comunidade.

Um bom exemplo é o momento em que Thien vai até a casa de um vizinho com o intuito de pagar pela mortuária de sua cunhada. O senhor, um ex-soldado, recusa o dinheiro e argumenta que o ofício é o que o mantém ativo e útil, dando-lhe sentido à vida. No longo diálogo que se prossegue, o idoso fala sobre como o fim da Guerra do Vietnã o deixou sem propósito, visto que tudo que sabia fazer antes era matar.

Enquanto isso, a câmera nos leva para um passeio no interior da casa camponesa —repleta de santos católicos, flores e objetos desgastados pelo uso.

Em determinado momento, Thien fica obcecado em encontrar o pai de Dao. Sua peregrinação de motocicleta pelos campos o leva a sonhos e diálogos envolvendo espiritualidade, mas "Dentro do Casulo Amarelo" não é um filme sobre religião.

É sobre como a cidade, obediente ao ritmo do consumo e da tecnologia, pode deglutir a fé das pessoas e dissociá-las da busca por dar um sentido à vida. Pena que o longa peca por takes silenciosos excessivamente longos, que tornam a reflexão cansativa.

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Tópicos relacionados

Leia tudo sobre o tema e siga:

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.