Mostra reúne artistas argentinos e estabelece a cópia como arte provocativa

Coleção Oxenford, considerada a mais expressiva de arte contemporânea no país, está em cartaz em São Paulo

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São Paulo

A estátua de um rapaz em tamanho real parece ter sido feita com chicletes mascados. Relaxando sobre uma espreguiçadeira, ele segura uma revista de pornô gay enquanto faz uma bolha de goma de mascar com a boca —que, na realidade, não é a guloseima, mas uma camisinha.

'El pibe Bazooka', 1988, de Pablo Suárez
'El pibe Bazooka', 1988, de Pablo Suárez - Divulgação

"El Pibe Bazooka" é uma obra do artista plástico argentino Pablo Suárez, de 1988, em homenagem ao garoto-mascote da marca de chicletes homônima e mais consumida no pais naquela década. Cada unidade do doce era acompanhada por uma história em quadrinhos com o personagem que, na representação de Suárez, trocou os gibis pelo conteúdo adulto.

A obra faz parte do segundo capítulo da exposição "Un Lento Venir Viniendo", que traz ao Instituto Tomie Ohtake, em São Paulo, a coleção Oxenford, que reúne 550 peças de 150 e promove um panorama artístico da Argentina entre o final do século 20 e início do 21.

Nessa edição da mostra, o tema utilizado para amarrar os trabalhos expostos é o da cópia enquanto estímulo produtivo e criativo, segundo o curador Mariano Mayer. "Como podemos fazer arte a partir da cópia? A cópia afeta o seu original e inicia um novo circuito, ligado a aprendizagem e a criação de novos contextos com linguagens menos acadêmicas, mais simples, econômicas, até."

Exemplos são uma enorme escultura de um cigarro pousado sobre um cinzeiro, de Eduardo Navarro, que não pretende representar nada além de si mesmo, ou "Falda Pizarrón", de Lucrecia Lionti, um enorme pano preto com desenhos em giz que lembra uma lousa escolar. Os desenhos e rabiscos parecem querer contar uma história impossível de ser rastreada.

Em outra parede, uma série de desenhos de Sérgio Avello e Daniel Joglar reproduzem o mapa da Argentina repetidamente, com alterações nervosas nos contornos dos estados e das fronteiras, dispostos a poucos metros de uma série de frames fotográficos de Alberto Goldenstein. As tiras eram utilizadas pelo fotógrafo para analisar os cliques e escolher quais se tornariam cópias ampliadas.

O centro da mostra é ocupado majoritariamente por esculturas, entre elas o que parece ser um corpo humano deitado composto inteiramente por grossos cacos de vidro, em referência aos mesmos fragmentos colocados sobre os muros das casas argentinas para impedir a entrada de invasores.

"Quando a demanda por segurança está no topo das reivindicações da população e, não por acaso, das agendas governamentais, esse corpo de vidro nos aparece como manifestação das mais precárias estratégias de defesa cidadã", diz Mayer, o curador.

A crítica social também é central no trabalho do brasileiro Dudu Quintanilha, formado em Buenos Aires, que integra a exposição com com algumas fotos da série "Variaciones". Em um dos retratos, um homem negro aparece com a mão dentro das calças, em formato de arma, apontada para fora da braguilha.

A coleção, agrupada pelo empresário Alec Oxenford, é considerada a maior de arte contemporânea da Argentina e, para Mayer, sua viagem ao Brasil é benéfica para a reaproximação entre as produções artísticas dos países —já que, por vezes, o Brasil é considerado distante do restante do cenário latino-americano. "Se não participávamos de forma tão ativa, agora há um grande interesse em entender contextos próximos e como estes são similares aos nossos."

Un Lento Venir Viniendo - Capítulo 2

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