Descrição de chapéu Artes Cênicas

'A Filha Perdida', romance de Elena Ferrante, chega ao teatro entre dores e amores

Espetáculo com Juliana Araujo e Maristela Chelala, em cartaz no Sesc Bom Retiro, retrata relações complexas entre mães e filhas

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São Paulo

"Como pode um peixe vivo viver fora da água fria?". A tradicional cantiga brasileira, entre seu tema marítimo e a síntese característica desse tipo de tema, embala a montagem de "A Filha Perdida", peça baseada no livro da italiana Elena Ferrante que também já virou filme pela Netflix, com Olivia Colman no papel principal.

A música apareceu na dramaturgia quando a atriz Juliana Araujo estava com os pés na areia, em uma viagem, e começava a vislumbrar a encenação após anos de preparação para a montagem, idealizada e protagonizada por ela ao lado de Maristela Chelala e Alex Huszar.

A imagem mostra duas mulheres em uma pose expressiva. A mulher à frente tem cabelo cacheado e está usando uma blusa preta de alças. Ela tem uma expressão séria e está olhando diretamente para a câmera. A mulher atrás dela tem cabelo liso e está parcialmente escondida, com as mãos sobre os ombros e o peito da mulher à frente. O fundo é neutro, com uma cortina de cor clara.
As atrizes Juliana Araujo e Maristela Chelala em cena da peça 'A Filha Perdida' - Julio Aracack/Divulgação

"É uma canção emblemática. Tem a ambiguidade da maternidade, que o livro trata. É uma música de ninar, envolta em ternura e que nos remete a uma memória afetiva e, ao mesmo tempo, fala de algo forte", diz Araujo.

Em cartaz no Sesc Bom Retiro, a peça começou a ser pensada em 2017, quando a atriz leu o livro de Ferrante. Ela cursava o segundo semestre na Escola de Arte Dramática, a EAD, da Univesidade de São Paulo e acabara de ser mãe pela primeira vez.

No livro, lançado em 2006, Leda, uma professora universitária, aproveita sozinha as férias no litoral da Itália e entra em contato com uma barulhenta família napolitana. Ao observar Nina, jovem mãe de uma menina, sempre acompanhada de uma boneca, Leda reflete sobre os conflitos da própria maternidade e a relação difícil com a mãe.

A personagem recorda o período em que deixou as crianças aos cuidados do pai para lidar com a própria vida profissional e sentimental.

O universo de Araujo se encontrou com o da escritora. Na fase da EAD, a atriz levava a filha recém-nascida para as aulas noturnas. Não queria perder a oportunidade de mudar de profissão, após dez anos atuando como jornalista. E também teve uma relação difícil com a mãe.

"Eu já há muito anos não me relaciono com a minha mãe e me identifiquei de cara com esse traço da infância da Leda. Pareceu claro que eu iria trabalhar de alguma maneira com esse livro", afirma.

As idas e vindas entre o presente e as memórias estão na obra literária e no espetáculo, com as atrizes se revezando nos papéis de mãe e filha, em um jogo cênico ágil e comovente.

Está ali o desejo das mulheres de serem vistas como pessoas, não apenas como funções, inclusive após a maternidade. É como se uma saísse do corpo da outra e reconhecesse as dificuldades e as belezas da condição feminina, entre dores e amores.

Instigantes, os sons escolhidos para a montagem contribuem para a atmosfera. Além de atuar nos papéis masculinos, Alex Huszar assina e executa a trilha sonora ao vivo, a partir de um computador e com uso de sintetizadores.

A imagem mostra três pessoas sentadas sob um grande guarda-sol. À esquerda, uma mulher de cabelos cacheados e vestindo uma blusa preta com um casaco verde. No centro, um homem de barba e cabelo cacheado, usando um chapéu e uma camisa listrada. À direita, uma mulher de cabelos escuros e franja, vestindo uma blusa estampada e segurando um bebê de brinquedo. O fundo é iluminado com uma luz quente, criando uma atmosfera acolhedora
Maristela Chelala, Alex Huszar e Juliana Araujo no espetáculo - Julio Aracack/Divulgação

A trilha tem, além de "Peixe Vivo", uma música de David Bowie ("The Man Who Sold the World") e uma de Marina Lima e Arnaldo Antunes ("Grávida"). Inclui também ruídos que remetem ao cenário marítimo, ao choro de crianças e ao caos da fase inicial da maternidade. Projeções visuais e um cenário com poucos objetos e luz quente completam o clima, que alterna aconchego e estranheza.

O governo Bolsonaro, a pandemia, a segunda gravidez de Araujo e uma longa negociação com o escritório que representa Ferrante preencheram o período entre a ideia de montar o espetáculo e a estreia, há uma semana.

Para viabilizar o trabalho, a idealizadora da peça conseguiu um acordo em que os direitos autorais foram liberados para que o projeto fosse apresentado a editais e o pagamento pela obra viria depois. No meio das conversas, foi lançado o filme, o que ajudou a tornar a história mais conhecida.

A atriz acreditava que seria uma mulher solta no mundo e não pensava em casar e ter filhos. Também não planejava escrever um texto dramatúrgico com pontos de encontro com a sua realidade. No entanto, hoje mãe de duas filhas e totalmente envolvida pela história, não viu outro caminho a não ser o de adaptar ela mesma o livro para os palcos.

"Senti que precisava. É como se estivesse contando a minha história através dessa", diz. "Tudo parece uma bela chance de ressignificar o passado com arte, da maneira mais bela possível."

A Filha Perdida

  • Quando Até 28 de julho. Sex. e sáb., às 20h. Dom. e feriados, às 18h
  • Onde Sesc Bom Retiro - al. Nothmann, 185, São Paulo
  • Preço R$ 15 a R$ 50
  • Autoria Elena Ferrante e Juliana Araujo
  • Elenco Juliana Araujo, Maristela Chelala, Alex Huszar
  • Direção Fernanda Castello Branco e Paula Weinfeld
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