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25/07/2012 - 14h47

A guinada à direita de Batman

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MARK FISHER
DO "GUARDIAN"

O novo filme de Batman não é a parábola conservadora simples que os direitistas prefeririam, mas oferece uma visão reacionária

"Quanto tempo você acha que isso vai durar?", pergunta Selina Kyle (Anne Hathaway) a Bruce Wayne (Christian Bale), em meio à opulência de um luxuoso baile de caridade, em "Batman: O Cavaleiro das Trevas Ressurge".

Divulgação
Cena de "Batman - O Cavaleiro das Trevas Ressurge"
Cena de "Batman - O Cavaleiro das Trevas Ressurge"

"A tempestade está chegando". Uma tempestade de tipo bastante inesperado se abateu sobre o filme na última sexta-feira, com o aterrador massacre em Denver. Mas o filme já havia causado controvérsia política nos EUA, onde o radialista conservador Rush Limbaugh alegou que o nome do adversário de Batman no filme, Bane, era referência ao candidato à Presidência Mitt Romney e sua antiga empresa, a Bain Capital.

Mas, como Limbaugh também mencionou, não é Bane mas o bilionário Bruce Wayne que mais se parece com Romney, enquanto a retórica de Bane parece refletir o movimento Occupy.

John Nolte, um colunista de direita, argumenta que o filme forçou o Occupy Wall Street a um recuo para consertar estragos, e elogia o diretor, Christopher Nolan, por "utilizar a espécie de tema conservador que a maior parte de Hollywood, falida artisticamente, se recusa a abordar".

Christian Toto, outro comentarista de direita, afirma que é impossível entender o filme a não ser como um manifesto de oposição ao Occupy Wall Street. "Os capangas de Bane literalmente atacam Wall Street, espancando os ricos de forma selvagem e prometendo ao bom povo de Gotham que 'amanhã, aquilo a que vocês têm direito será seu'".

Esse tipo de leitura oferece uma combinação espúria entre o anticapitalismo do Occupy Wall Street e a violência indiscriminada praticada por Bane e seus seguidores.

Quando Nolan retomou a série Batman, em 2005, o cenário --Gotham em um momento de depressão econômica-- parecia anacrônico, uma referência à origem do super-herói nos quadrinhos, nos anos 30.

"Batman: O Cavaleiro das Trevas", de 2008, saiu cedo demais para registrar o impacto da crise financeira. Mas "Batman: O Cavaleiro das Trevas Ressurge" tenta claramente responder à situação surgida depois de 2008. O filme não é parábola conservadora simples que os direitistas prefeririam, mas oferece uma visão em última análise reacionária.

ACERTO DE CONTAS

A tempestade que o personagem de Hathaway promete é a hora do acerto de contas para os ricos, e o que impede que o filme seja uma celebração aberta dos valores conservadores, como prefeririam Nolte e Toto, é o prazer que parece demonstrar com os ataques aos ricos.

"É melhor que você e seus amigos tranquem bem as portas", diz Kyle, "pois quando a tempestade chegar vocês ficarão imaginando por que imaginaram que poderiam viver tão bem, deixando tão pouco para o resto de nós". Uma cena inicial mostra a Bolsa de Valores, onde temos a satisfação de ver Bane agredindo alguns operadores predatórios. Mais tarde, quando Wayne conta a Kyle que está falido mas não precisa abrir mão de sua casa, ela comenta, acidamente: "Nem quando vão à falência os ricos são como nós".

O anticapitalismo em Hollywood não é novidade. De "Wall-E" a "Avatar", as grandes empresas costumam sempre ser descritas como malévolas. A contradição de ter filmes produzidos por grandes empresas denunciando grandes empresas é uma ironia que o capitalismo é capaz não só de absorver mas de usar como fonte de lucro.

O anticapitalismo do cinema, porém, sempre tem limites. "Batman: O Cavaleiro das Trevas Ressurge" traça linhas claras: comentários anticapitalistas (como os de Kyle) são aceitáveis, mas ações diretas contra os ricos, ou operações revolucionárias de redistribuição de propriedade, resultam em pesadelos distópicos.

Bane fala em devolver Gotham "ao povo" e de libertar a cidade de seus "opressores". Mas o povo não tem parte no filme. Apesar da pobreza e do desabrigo endêmicos em Gotham, não existe ação organizada contra o capitalismo até que Bane surge.

No final de "Batman: O Cavaleiro das Trevas", o herói sacrifica sua reputação para salvar a cidade, e é tentador interpretar a continuação como uma alegoria dos esforços da elite para reconstruir sua posição depois da crise financeira --ou ao menos para preservar a ideia de que os bons ricos, depois de aprenderem a devida humildade, poderão salvar o capitalismo de seus excessos.

A fantasia que sustenta os filmes de Nolan sobre Batman --e encontra ecos desconfortáveis em Romney-- é a de que os excessos do capitalismo financeiro podem ser controlados por uma combinação de filantropia, violência perpetrada às escuras e simbolismo.

"Batman: O Cavaleiro das Trevas" ao menos expunha a duplicidade e violência necessárias a preservar as ficções em que os conservadores desejam que acreditemos. Mas o novo filme demoniza a ação coletiva contra o capital e nos pede que depositemos nossa fé e esperança nos ricos, que agora aprenderam a lição.

Tradução de PAULO MIGLIACCI.

 

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