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13/06/2010 - 07h54

Caetano Veloso fala sobre fotos de Anna Mariani no Nordeste

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DE SÃO PAULO

Leia, abaixo, texto de Caetano Veloso sobre as imagens realizadas pela fotógrafa Anna Mariani no Nordeste brasileiro. Originalmente escrito para o catálogo da exposição "Des maisons comme des tableaux" (Centre Georges Pompidou, Paris, setembro de 1988), o texto integra reedição do livro "Pinturas e Platibandas" (IMS, 236 págs., R$ 110).

Anna Mariani/Divulgação
Condado, Pernambuco, 1987
Condado, Pernambuco, 1987

Publicado originalmente em 1987, a obra traz também textos de Ariano Suassuna e Jean Baudrillard.

Em exposição no Instituto Moreira Salles, em São Paulo, de 17/6 a 1º/8, as fotografias de Mariani tematizam fachadas de casas ressaltando sua pintura à base de cal (veja galeria de imagens)

O que dizem essas casas? Sob o sol-a-todo-sol do Nordeste Brasileiro, em meio à dura vida humana, o que insinua sua lírica geometria?

De frente para a câmera de Anna Mariani, elas parecem esboçar um sorriso silencioso. A câmera não pretende interpretar os seus signos, mas entrar numa espécie de estado amoroso com a delicadeza de sua poesia. As fotografias são como monalisas pintadas por Volpi.

Para mim, são coisas íntimas. Casas que conheço por dentro. Em Santo Amaro, onde nasci, no Recôncavo baiano, as pessoas pintam suas casas a cada fevereiro para as festas da padroeira: é como comprar um vestido novo. A cidade fica endomingada, como se fosse um cenário de teatro ingênuo, com todas as casas recém-pintadas. É simples: é a alegria de viver, a vontade de ser mais bonito. Aos olhos do próximo, aos olhos de Deus.

É complicado: vendo essas casas reduzidas à sua "essência" formal, em retratos frontais, sobretudo aquelas que Anna foi encontrar longe da minha microrregião, no sertão, onde exibem mais inspiração e rigor, eu me pergunto qual o caráter do ensinamento que elas trazem. O impacto estético que produzem em nós sem dúvida confirma e ultrapassa o sentido de superação da miséria. Os homens que desenvolveram esse estilo visual numa região tão pobre do Brasil nos fazem ver que há muitos níveis insondados, muitos estágios misteriosos nas relações entre as massas e o que se convencionou chamar de modernidade.

Caetano Veloso

 

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