Combate à impunidade é avanço, dizem empresários

Um dia após decretada a prisão de Lula, empresários da Azul, AB InBev e 3G falam nos EUA

David Neeleman, fundador da Azul
David Neeleman, fundador da Azul - Paulo Whitaker/Reuters
Boston e São Paulo

Um dia depois de decretada a prisão do ex-presidente Lula, empresários influentes no Brasil elogiaram nos Estados Unidos mudanças agora em curso na política do país.

Falando na Brazil Conference, evento organizado por alunos das universidades Harvard e MIT em Boston, o fundador da Azul e um dos donos da TAP, David Neeleman, disse que o Brasil precisa de transparência na política, criticou as leis trabalhistas, defendeu a reforma da Previdência e  um “governo menor com incentivo para melhorar a economia”.

"Estamos num momento em que as coisas estão mudando", disse o empresário, sem mencionar a prisão de Lula. Ele fez ainda uma comparação entre os cenários políticos brasileiro e americano, lembrando que os empresários dos EUA tendem a buscar uma carreira política, enquanto no Brasil fogem dela.

O presidente-executivo da AB InBev, Carlos Brito, disse no encontro que "o Judiciário está mudando o Brasil", que o Estado "é maior que deveria ser" e que "faz coisas erradas porque a sociedade estimula". Na visão dele, um caminho possível para mudar a situação é regulamentar a atividade dos lobistas.

"Essa profissão precisa ser regulamentada, porque no Brasil isso ainda é feito na sombra", afirmou Brito, acrescentando que seria "uma maneira de a sociedade poder ajudar o governo".

Questionado depois do debate sobre sua reação ao decreto de prisão do ex-presidente Lula, Brito disse esperar que a "página possa ser virada" e que só quer o melhor para o consumidor brasileiro, que merece um ambiente mais estável". "Queremos um ambiente em que o governo funcione", afirmou.

André Street, dono da Stone, empresa de sistemas de pagamento, disse que o país ainda está "aprisionado no sistema político" e elogiou o que chamou de patriotismo em manifestações recentes.

"Temos uma tendência de ter pessoas de cada vez mais qualidade se interessando pela política, sendo mais patriotas", disse. "Quando olharmos para a história, vamos ver que as pessoas foram para a rua com bandeiras para serem patriotas. No Brasil, não se levanta a bandeira como aqui nos Estados Unidos."

No encontro, os empresários ainda brincaram sobre possíveis candidaturas ao Planalto. Brito disse que não tem pretensões políticas, mas que vai "tomar uma cerveja com quem ganhar" a eleição.

Alex Behring, cofundador da 3G Capital, brincou que Street "tem cara de Luciano Huck" e poderia se candidatar. O dono da Stone também negou querer alçar esse voo.

Mais tarde, depois de participar de outro debate, o economista Gustavo Franco, estrategista-chefe e presidente do conselho de administração da gestora Rio Bravo Investimentos, disse que a expectativa do mercado é eleger um candidato liberal, lembrando que o país acaba de passar por "dois maus governos" --ele falava sobre as gestões de Dilma Rousseff e Michel Temer.

Franco disse, no entanto, que investidores ainda estão cautelosos e avaliam quais candidatos teriam, de fato, uma visão econômica liberal.

"Há candidatos que a gente não sabe bem se são liberais de verdade ou se são oportunistas", afirma Franco. "Os eleitores brasileiros não gostam de estelionatos."

Na visão dele, o pré-candidato Jair Bolsonaro, por exemplo, é um desses que despertam dúvidas, já que não se sabe ainda como seria o plano econômico de uma eventual gestão do ex-militar.

CORRUPÇÃO

Empresários ouvidos pela Folha no Brasil têm uma avaliação semelhante. Consideram que a prisão de um ex-presidente, ainda que dolorosa no aspecto institucional, tem o fator positivo de reforçar a percepção de que o Brasil vai atuar de maneira mais efetiva no combate à corrupção, abrindo espaço para o fim de relações viciadas entre o público e o privado.

Cristopher Vlavianos, fundador da comercializadora de energia Comerc, uma das maiores do setor, vê na prisão de um ex-presidente um reforço à mensagem de que a impunidade não impera mais no país, o que pode criar um ambiente mais propício ao investimento.

"Não é só prisão de Lula ou Marcelo Odebrecht. Ver um presidente popular como Lula condenado depois de usar todos os recursos mostra que qualquer um pode ser condenado também. Isso cria ambiente propício ao investimento. Investidor estrangeiro não gosta de entrar em mercados em que a competição é viciada por corrupção."

SETOR ELÉTRICO

​Vlavianos diz que a mudança é especialmente positiva para o setor elétrico, que é muito vulnerável à corrupção porque concentra grandes obras.

"Além de o setor ter sofrido com decisões erradas do governo do PT, ele acabou também arcando com esse impacto da corrupção. Muito da corrupção estava concentrado em Petrobras, grandes obras, como Belo Monte."

Para o empresário Ricardo Nunes, presidente da empresa de varejo Máquina de Vendas, existe hoje um descolamento entre os acontecimentos políticos e a economia.

A prisão de Lula não vai provocar turbulências ou inseguranças no ambiente de negócios, ao contrário do que ocorreu na ocasião do impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff. "O nosso setor de varejo está mais conectado à evolução dos juros, do emprego, da indústria. O povo se acostumou."

Ricardo Nunes conta que se reuniu com executivos de um fundo americano na tarde desta sexta (6), enquanto vencia o prazo para Lula se apresentar à Polícia Federal, e o clima era de otimismo. "Eles consideram que o país está se consertando, e traz estabilidade ver que já não há impunidade. Faz muito bem para a imagem do país entre investidores estrangeiros."

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