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Como fazer a conectividade chegar à população de baixa renda no Brasil?

Pacote de dados custa quase 10% da renda dos trabalhadores com menores salários

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Marcos Ferrari

Presidente executivo da Conexis Brasil Digital, entidade que representa as operadoras de telecom

No mundo digital de hoje, pessoas e empresas aprenderam a conviver com a tecnologia, que segue transformando de maneira definitiva os relacionamentos e os negócios.

Não é mais possível pensar em renunciar aos benefícios sociais que ela gera, desde produtividade –por meio do uso de aplicativos de toda sorte– até o ganho de eficiência experimentado por setores produtivos.

Essa realidade faz com que o acesso à conectividade precise ser tratado urgentemente como prioridade no Brasil. Países que largaram na frente possuem diversas políticas públicas para garantir que seus cidadãos usufruam dos serviços digitais e impedir que sua restrição gere mais desigualdade. Nesse sentido, vale entender quais são essas iniciativas e como elas contribuem para endereçar o problema.

A ONU estabelece um padrão de referência para mensurar a acessibilidade da população. Segundo a entidade, 1 GB de dados deve custar menos de 2% da renda nacional bruta per capita. O Brasil cumpre a meta quando se avalia toda a população. Porém, ao segmentar por faixas de renda, encontra-se uma clara barreira.

Limpeza no computador
Homem mexe em computador portátil - Unsplash

O pacote de consumo médio custa 6% da renda média mensal das pessoas que estão entre os 40% da população com menores salários no país. Ainda mais grave, chega a quase 10% da renda média para a parcela dos 20% mais pobres. Essa realidade ocorre mesmo com o preço médio do serviço tendo caído 80% nos últimos dez anos, o que mostra que somos um país de média/baixa renda per capita.

O custo da conectividade no Brasil é baixo. Considerando os 15 países que mais acessam banda larga no mundo, o preço praticado por aqui é 55% menor do que a média. O problema recai sobre a renda bastante insatisfatória da população e é preciso haver ferramentas para contornar essa questão.

Os Estados Unidos foram além e criaram o Lifeline, programa para permitir o acesso aos serviços de comunicação para consumidores com poucos recursos. Subsidiam descontos mensais de US$ 9,25 (R$ 52,68) para a faixa menos abastada, equivalendo a 25% do ticket médio do cidadão americano.

O abatimento ajuda a assegurar, àqueles que mais precisam, o acesso ao trabalho, aos serviços de saúde e à educação. Em julho de 2021, mais de 33 milhões de domicílios eram elegíveis ao pleito.

O Brasil possui condições para um programa semelhante, mas, por ora, apenas na teoria. O Fundo de Universalização dos Serviços de Telecomunicações (Fust) foi criado há mais de 20 anos, mas nunca foi usado para tal finalidade. A mudança legislativa de 2020, chamada de "Novo Fust", tem o potencial de mudar esse cenário.

Ela visa permitir que os recursos sejam destinados para investimentos focados na conectividade, em programas e planos para ampliar o acesso aos serviços de telecomunicações, incluindo a banda larga.

Como comparação, o valor arrecadado até hoje pelo Fust em termos reais —que nunca foi usado— poderia subsidiar, nas mesmas condições do Lifeline, a população elegível do Auxílio Brasil por quase 60 anos! Ainda dá tempo de corrigir essa grave falha de Estado.

O subsídio da conectividade para o Auxílio Brasil custaria aproximadamente R$ 800 milhões por ano, frente a uma arrecadação média anual de R$ 1 bilhão. Para evitar o custo da burocracia, as próprias operadoras poderiam fazer a transação, conforme permitido pelo "Novo Fust". Garantiria mais agilidade, mais conectividade e menos desigualdades sociais.

Houve bastante progresso na legislação de telecom nesses dois últimos anos. Todo avanço deve certamente ser comemorado. Mas a consciência de que o Brasil precisa de resoluções profundas e estruturais não pode arrefecer o ímpeto por mudanças urgentes, principalmente para atender aos mais vulneráveis.

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