Governo avalia usar recursos de garantias do Pronampe para reduzir impacto do Desenrola

Medida reduziria custo orçamentário do programa, que pode envolver R$ 120 bi em dívidas, mas deve esbarrar em pressão

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Brasília | Reuters

O governo avalia redirecionar recursos do seu FGO (Fundo de Garantia de Operações) atualmente carimbados para cobrir financiamentos do Pronampe, voltado a pequenas e médias empresas, para viabilizar o Desenrola, programa de renegociação de dívidas das famílias, informaram à Reuters fontes em diferentes áreas dentro e fora do governo.

O uso do dinheiro já presente no caixa do FGO reduziria o custo orçamentário da nova iniciativa, que foi promessa de campanha do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, mas pode esbarrar em pressões de setores que defendem a manutenção do Pronampe.

O plano do governo é lançar o Desenrola ainda neste mês. A ideia, segundo a autoridade e uma fonte do setor financeiro que acompanha as negociações, é que o programa ofereça garantia do governo para a renegociação de dívidas de pessoas com renda de até dois salários mínimos, em operação que pode envolver R$ 120 bilhões em dívidas.

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Cédulas de real - Gabriel Cabral - 21.fev.2019/Folhapress

De acordo com o membro do governo que participa da elaboração do Desenrola, projeção conservadora prevê uma necessidade de R$ 20 bilhões em garantias para as operações. Foram desenhados outros cenários mais otimistas, que preveem taxas maiores de desconto sobre as dívidas e índices menores de inadimplência, com o custo podendo cair a R$ 5 bilhões.

O Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (MDIC) informou à Reuters que o FGO tem hoje R$ 9,6 bilhões disponíveis para novas contratações.

Os recursos do fundo atualmente são usados para garantir operações do Pronampe (Programa Nacional de Apoio às Microempresas e Empresas de Pequeno Porte), que foi criado como instrumento de socorro a companhias durante a pandemia de Covid-19, mas acabou prorrogado na gestão do então presidente Jair Bolsonaro.

O governo estuda agora a possibilidade de fazer um redirecionamento de parte dos recursos do fundo.

Segundo uma fonte do governo, o objetivo de criação do Pronampe, que era dar suporte na pandemia a pequenas e médias empresas, já perdeu "um pouco" do sentido, e há discussões sobre a migração dos recursos.

IMPACTO FISCAL

Repasses do Orçamento ao FGO geram impacto fiscal, piorando o resultado primário do ano. Por isso, na prática, quanto mais o governo conseguir aproveitar para o Desenrola recursos já disponíveis no caixa do fundo, menor será a necessidade de novos aportes do Tesouro para disponibilizar garantias ao programa.

De acordo com o MDIC, considerando a atual média de concessões do Pronampe, os R$ 9,6 bilhões disponíveis no fundo se esgotariam em cerca de um ano e dois meses. A pasta confirmou que é possível que recursos livres do FGO sejam usados como garantia no Desenrola "caso haja previsão legal".

A fonte do setor privado afirma que os bancos ainda estão se informando sobre o programa para avaliar sua viabilidade. Um ponto considerado positivo pelo setor é que uma vez resolvido o débito desse conjunto de pessoas, elas poderão voltar ao mercado de crédito, abrindo novas possibilidades de serviços aos bancos.

Dados da Serasa apontam que 69 milhões de brasileiros estão inadimplentes, com dívidas em atraso no valor total de R$ 301,5 bilhões. Em média, cada pessoa inadimplente deve R$ 4.400.

O programa, disse essa fonte, deve contemplar dívidas bancárias e não bancárias, como pendências com varejistas e companhias de energia elétrica e telefonia.

O cenário base do Desenrola, construído pelo Ministério da Fazenda, estima que as instituições vão oferecer um desconto de aproximadamente 70% do valor total das dívidas renegociadas. Uma pessoa que deve R$ 1.000, por exemplo, teria o direito de quitar seu débito com o pagamento de R$ 300, se confirmado esse cenário.

Segundo a fonte do governo, há uma expectativa de renegociação de R$ 120 bilhões em débitos dessas pessoas com renda de até dois salários mínimos. Com o desconto estimado, o montante a ser pago por esses devedores após a renegociação ficaria próximo a R$ 40 bilhões.

A partir desse valor, o governo tenta estimar uma possível taxa de inadimplência. Segundo a fonte, o Banco do Brasil sugeriu que um cálculo conservador seria de 50% de inadimplência, o que levaria a uma necessidade máxima de R$ 20 bilhões em garantias.

Esse valor poderá ser menor se as negociações com as instituições financeiras forem mais agressivas, permitindo descontos maiores do que 70% nas dívidas, e se a inadimplência efetiva for menor.

Considerado bem-sucedido durante a pandemia, o Pronampe se tornou permanente após decisão do Congresso. A liberação de recursos do Tesouro para implementar as garantias foi determinante para viabilizar o programa, já que o instrumento cobre possíveis desfalques nos financiamentos, o que diminui o risco aos bancos.

O coordenador de Acesso a Crédito e Investimentos Sebrae (Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas), Giovanni Beviláqua, avaliou que o Desenrola é um programa importante, mas destacou que o Pronampe continua dependendo de garantias do FGO.

Segundo ele, a redução do fluxo de empréstimos no Pronampe é reflexo da alta da Selic, que referencia as operações, e do endividamento das companhias.

"Esses dois fatores ajudam a explicar a redução da quantidade de operações de crédito, mas não podemos afirmar pela queda na quantidade de operações ou dos valores concedidos que tenha sido reduzida a necessidade dos empréstimos", disse.

Procurado, o Ministério da Fazenda informou que o Desenrola está em fase final de formulação e em breve mais informações serão fornecidas. Gestor do FGO, o Banco do Brasil disse que não comentaria por estar no período de silêncio que antecede a divulgação de seus resultados financeiros.

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