Descrição de chapéu Financial Times inflação

Zara em casamento de luxo surpreende Espanha

Uso de vestido da marca por convidadas seria impensável até recentemente, mas empresa tem caído no gosto de celebridades e se reposicionado no mercado

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Barney Jopson
Arteixo (Espanha) | Financial Times

O casamento de Ricardo Gómez-Acebo Botín, sobrinho da presidente do Banco Santander, Ana Botín, foi um evento da alta sociedade perto de Madri este mês, atraindo ampla cobertura da revista Elle sobre os chapéus floridos das convidadas, capas farfalhantes –e o fato de algumas pessoas estarem usando Zara.

Tão marcante foi a presença de dois "looks inspiradores" da marca espanhola, no valor de 129 euros (R$ 670) e 36 euros (R$ 190), que viraram manchete. Mas os resultados da Inditex, proprietária da Zara, alguns dias antes, sugeriam que as peças para casamento não são um caso raro.

A Inditex, que vem de uma cidade sem glamour na Galícia, distante da capital espanhola, registrou um salto de 13% nas vendas no primeiro trimestre, após um aumento de 17,5% em todo o ano de 2022. O crescimento ajudou a elevar seu valor de mercado para 105 bilhões de euros (R$ 550 bilhões), ainda abaixo do pico de 2017, mas o mais alto desde uma pandemia da qual a Zara emergiu como uma das vencedoras no varejo mundial.

Kate Middleton, Princesa de Gales, na premiação Bafta
Kate Middleton, princesa de Gales, usou brincos da Zara no Bafta, maior premiação do cinema britânico - Chris Jackson/AFP/Getty Images

Embora ainda venda itens básicos como camisetas, a Zara tentou se diferenciar da sueca H&M e escapar do rótulo de "fast fashion" descartável, tornando-se uma criadora de roupas elegantes para festas. No ano passado, a cantora americana Selena Gomez usou um terno Zara azul-elétrico de 150 euros (R$ 780) no casamento de Britney Spears. As vendas da Inditex refletem a mudança.

Óscar García Maceiras, que se tornou executivo-chefe no ano passado, quando o ex-presidente e CEO Pablo Isla deixou o cargo, disse que a Zara não tem uma nova estratégia de subir de classe no mercado. "Mas estamos sempre nos esforçando para melhorar a qualidade, o estilo e o design, e queremos abrir espaço para o inconformismo em nossa moda. Isso nunca mudou", disse García ao Financial Times na sede da Inditex em Arteixo.

Patricia Cifuentes, analista da Bestinver, disse: "Eles se reposicionaram ligeiramente para cima para chegar ao centro dos eventos. Antigamente, na Espanha, você nunca poderia usar Zara num casamento. Mas agora com todos os influenciadores e celebridades vestindo Zara, pode. A Inditex reforçou a ideia de que a Zara vende moda".

No Reino Unido, sites de fofocas rastreiam as roupas da Zara usadas por Kate Middleton, a princesa de Gales, há mais de uma década. Mas a mudança nas percepções do consumidor é mais recente.

Em parte, isso se deve a Marta Ortega, filha do fundador Amancio Ortega e presidente não executiva da empresa desde o ano passado, que ajudou a lançar coleções de moda premium com parceiros como o estilista nova-iorquino Narciso Rodriguez e a marca sul-coreana Ader Error.

Outro fator é o uso crescente de fotografias de desfiles de alto nível em seu site. "As clientes podem ver as roupas em situações que não veriam na loja", disse um membro da equipe online da Zara. "O comércio eletrônico é o melhor outdoor que podemos ter."

Enquanto isso, a Zara manteve sua capacidade de se mover mais rapidamente do que os concorrentes. Por ter fábricas próprias na Galícia e fornecedores em Portugal e Marrocos, consegue desenhar novos looks inspirados nas passarelas e colocá-los nas lojas em menos de três semanas.

Um analista, mais cauteloso em relação à Inditex, disse que um dos principais riscos nos próximos dois anos é que a inflação continue aumentando as despesas operacionais, mas os clientes que enfrentam a crise do custo de vida resistam aos aumentos de preços.

Rivais como Cos, & Other Stories e Arket –todas de propriedade da H&M–, além da espanhola Mango, enfrentam o mesmo desafio. Mas no último trimestre pelo menos a margem bruta da Inditex subiu para 60,5% das receitas, 10 pontos percentuais acima da H&M. García Maceiras disse que a Inditex sempre se concentrou em manter preços estáveis "e proteger nossas próprias margens".

A Inditex, que reportou 33 bilhões de euros em vendas e 4 bilhões de euros em lucro líquido no ano passado, tem várias marcas de luxo, incluindo Massimo Dutti, Pull & Bear, Bershka e Stradivarius. Mas a Zara é o rolo compressor que respondeu por 73% da receita.

O que ela quer é mais equilíbrio ao redor do mundo. Ela opera em mais de 90 países, mas a Espanha ainda é seu maior mercado, com mais de 1.200 lojas Inditex e 14% das vendas no ano passado.

O grande choque foi o desaparecimento de sua segunda maior operação, a Rússia, onde a Inditex congelou e acabou vendendo seu negócio de 500 lojas após a invasão da Ucrânia pelo país. Os últimos números que ela deu ao deixar a Rússia, numa atualização de fevereiro e março, foram que reduziu o crescimento das vendas em quatro pontos percentuais, para 13,5%. O fato de não ter causado mais danos é uma prova de sua força em outros lugares.

O novo mercado número dois são os Estados Unidos, que na avaliação de Cifuentes respondem por 9% das vendas. Embora a Inditex não goste de se expandir a uma velocidade vertiginosa, García Maceiras disse que está capitalizando uma consequência inesperada da Covid-19.

"O apetite pela moda nos Estados Unidos se espalhou ainda mais pelo país à medida que as pessoas se mudaram devido à pandemia e se afastaram de Nova York e da Califórnia", disse ele. "Essa é uma das razões pelas quais abrimos lojas em lugares como Nashville, Salt Lake City, Denver ou San Antonio."

Analistas avaliam que o terceiro maior país da Inditex é o México, seguido pelo Reino Unido, França e Itália, cada um com cerca de 5% das vendas. A China também está nessa faixa, e o que acontecer lá terá uma grande influência no futuro da Zara.

Jie Zhang, analista da Alphavalue, com sede em Paris, disse que a Zara há muito se posicionou em um segmento superior na China ao da Europa, porque queria ficar fora de um segmento de mercado repleto de "marcas locais diferentes e mais baratas".

A economia em desaceleração da China também pode fornecer um impulso. "Estamos vendo certa mudança de hábito entre os consumidores ricos. As pessoas que poderiam ter comprado um vestido de marca de luxo agora estão felizes em comprar um da Zara", disse García Maceiras.

Depois de seu próprio casamento, uma influenciadora chinesa chamada Saneiei postou uma foto sua no pós-festa e escreveu: "Ninguém imaginaria que esse vestido prateado de lantejoulas que parece caro é na verdade da Zara!"

Colaboraram Adrienne Klasa, em Paris, e Xueqiao Wang, em Xangai

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