Descrição de chapéu The New York Times

Casa Branca de Trump exige acordo de silêncio de funcionários 

Documento proíbe staff de revelar o que se passa na sede do governo 

funcionários da Casa Branca prestam juramento
Funcionários da Casa Branca prestam juramento ao assumir cargo - Al Drago - 22.fev.2017/The New York Times
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Quando era executivo do setor imobiliário e astro da 'reality TV', Donald Trump controlava sua própria imagem rigidamente, exigindo que todos à sua volta assinassem acordos de silêncio que os ameaçavam com penalidades monetárias pesadas se revelassem qualquer informação sobre ele ou sua empresa.

Assim, alguns meses depois de chegar à Presidência, Trumpenfurecido com os vazamentos sobre tudo, desde rivalidades entre membros de sua equipe até seu hábito de assistir à TV de robe— instruiu Reince Priebus, seu então chefe de gabinete, a fazer a mesma coisa na Casa Branca.

O advogado da Casa Branca, Donald McGahn 2º, havia avisado o presidente antes que não seria possível adotar uma política desse tipo abrangendo os funcionários federais.

Mas, para acalmar um presidente enfurecido e convencido de que era preciso pressionar as pessoas à sua volta para que guardassem seus segredos, McGahn redigiu um documento amplo proibindo funcionários da Casa Branca de revelar publicamente o que ouviam e viam no trabalho.

Esse acordo de silêncio, apresentado por Priebus aos membros seniores do staff presidencial em abril passado, não especificava penalidades –monetárias ou outras— e era algo que quase todos em volta do presidente entenderam que não poderia ser implementado.

Mas foi um sinal precoce de que Trump, que passara décadas usando táticas de pressão e sigilo em sua vida privada, queria fazer o mesmo na Casa Branca, rompendo com a tradição. Ele elevaria para um novo nível a obsessão de muitos de seus predecessores com vazamentos prejudiciais.

E, se seus assessores principais enxergavam a possibilidade de punição como remota, a mensagem do presidente era inequívoca: façam silêncio.

A Casa Branca se negou a fornecer uma cópia do documento de duas a três páginas, que foi descrito por um funcionário sênior da Casa Branca, ou a informar se os funcionários seniores são obrigados a assinar um documento desse tipo.

Mas advogados anteriores da Casa Branca e especialistas em ética governamental disseram que o acordo suscita questionamentos legais sérios e reflete a recusa de Trump em se submeter às normas de divulgação pública ou a respeitar o direito básico à liberdade de expressão.

“Não se pode proibir toda a expressão, e é preciso provar que há uma justificativa governamental convincente para se fazê-lo”, disse Norm Eisen, o principal advogado de ética no Escritório de Assessoria Jurídica da Casa Branca de Barack Obama.

“Se eles tiverem dado passos mesmo que pequenos –o que dirá passos que parecem ter sido gigantes— no sentido de silenciar comentários normais e permitidos sobre aspectos não confidenciais e não classificados do trabalho na Casa Branca, isso vai engatilhar a proteção prevista na Primeira Emenda constitucional”, ele opinou.

É comum que se peça aos funcionários da Casa Branca que assinem documentos de confidencialidade reconhecendo que não devem revelar informações classificadas a pessoas que não tenham a autorização de segurança necessária.

Mas vários funcionários seniores que trabalharam para Obama disseram que, tirando as informações classificadas, nunca foi pedido que eles assinassem um acordo mais amplo de confidencialidade enquanto estiveram na Casa Branca.

A exigência de Trump de que seus assessores assinassem um acordo de confidencialidade foi levada a público inicialmente esta semana pelo “Washington Post”, mas funcionários da Casa Branca que firmaram um acordo contestaram parte da reportagem, segundo a qual um esboço inicial do acordo de silêncio teria sujeitado os membros do staff a multas de US$ 10 milhões cada vez que violassem o acordo.

Dois funcionários disseram em entrevistas que um documento com termos semelhantes foi circulado durante a transição entre a eleição e a posse de Trump, mas que foi ridicularizado por assessores, que o viram como uma tática equivocada dos advogados pessoais do presidente eleito, e nunca chegou a ser usado.

Acordos de confidencialidade foram uma preocupação de Trump durante sua campanha presidencial, e após a eleição o presidente eleito pediu que fossem preparados acordos que seguissem os moldes dos que ele usava na Organização Trump, sua empresa imobiliária, para todas as pessoas que fossem trabalhar na Casa Branca de Trump.

Entre os defensores da iniciativa estavam sua filha Ivanka e Jason Greenblatt, seu advogado de longa data, que passaria a integrar o staff da Casa Branca no papel do negociador internacional chefe do presidente.

De acordo com uma pessoa com conhecimento direto das discussões, quando McGahn disse a Trump que seria difícil obrigar funcionários federais a respeitar um acordo desse tipo, Trump resistiu, acreditando que a existência de um acordo desencorajaria os potenciais vazadores de informações.

Mesmo assim, Priebus e McGahn demoraram para atender ao pedido de Trump. Em abril, em meio a uma onda de vazamentos embaraçosos, eles não puderam mais conter o presidente.

Mas se este pensava que o uso de uma tática utilizada comumente nos círculos de negócios e entretenimento alimentados pelos tabloides em que Trump havia circulado durante décadas serviria para acabar com vazamentos na Casa Branca, estava equivocado.

Os vazamentos constantes de segredos de sua administração continuaram nos meses seguintes, em parte, segundo funcionários, porque poucas pessoas em volta do presidente acreditavam que o acordo de confidencialidade chegaria a ser implementado algum dia.

Na realidade, essa mensagem foi reforçada na surdina pelo escritório de assessoria jurídica, mesmo quando os assessores estavam assinando os acordos no ano passado, disseram vários funcionários.

Um ex-funcionário se recorda de ter ouvido que a finalidade real do documento era apenas tranquilizar o presidente. Segundo ele, ninguém na Casa Branca achou que estava firmando um documento que jogaria por terra seus direitos previstos na Primeira Emenda.

Outro funcionário disse que, quando assessores tentaram esclarecer se poderiam falar publicamente em instâncias específicas –por exemplo, para atender a um pedido de um comitê do Congresso ou responder a uma pergunta de um parlamentar—, McGahn lhes dizia que eles teriam liberdade ampla.

Ex-funcionários e funcionários atuais comentaram que o acordo continha exceções abrangentes, dizendo que seguia os moldes das proteções dadas a denunciantes e de outras leis de fiscalização e revelação de informações que se aplicam a funcionários federais.

Ao mesmo tempo, advogados do escritório de McGahn faziam questão de garantir que qualquer pessoa que tivesse acesso a informações especialmente sensíveis na Casa Branca firmasse uma cópia do acordo.

Um funcionário que não esteve presente no pedido inicial de Priebus ouviu mais tarde de um advogado da Casa Branca que, como ele tinha estado envolvido em muitas questões potencialmente polêmicas, provavelmente deveria assinar o acordo de silêncio, o que ele teria feito imediatamente.

A Casa Branca de Trump também rompeu com a convenção ao tentar impor acordos de confidencialidade escritos em outras instâncias.

Por razões de segurança, um grupinho de jornalistas que acompanharia o vice-presidente Mike Pence em viagem ao Afeganistão foi instruído em dezembro a assinar um acordo de confidencialidade antes de receber detalhes sobre a viagem.

Jornalistas normalmente concordam em embargar detalhes logísticos sobre viagens a zonas de guerra, mas não é de praxe pedir que assinem um documento em que se comprometem a fazê-lo.

Jarrod Agen, o diretor de comunicações do vice-presidente, disse que o adido militar para a viagem pediu que o documento fosse assinado pelos jornalistas. Quando editores de vários veículos noticiosos hesitaram, funcionários da Casa Branca recuaram e concordaram em anular o acordo.

“Todos os jornalistas que tinham conhecimento da viagem decidiram viajar e embargar os detalhes, tornando o documento desnecessário”, disse Agen.

Mas os limites do esforço de Trump para evitar vazamentos foram ilustrados perfeitamente com a publicação no mês passado na revista “Vanity Fair” de um trecho de um livro ainda inédito, “The Gatekeepers: How the White House Chiefs of Staff Define Every Presidency”, que faz um relato extenso e revelador, redigido por uma fonte interna, sobre os turbulentos seis primeiros meses da Casa Branca de Trump.

O relato foi baseado numa série de entrevistas com Reince Priebus.
 

Tradução CLARA ALLAIN

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