Nicarágua desiste de reforma da Previdência após onda de protestos e saques

Atos ocorreram por causa de plano de aumentar contribuições dos trabalhadores à Seguridade Social

Manifestantes exibem cápsulas de balas que teriam sido disparadas contra ele pela polícia da Nicarágua, durante onda de protestos
Manifestantes exibem cápsulas de balas que teriam sido disparadas contra ele pela polícia da Nicarágua, durante onda de protestos - AFP
Reuters

O presidente da Nicarágua, Daniel Ortega, anunciou neste domingo (22) que recuou de um plano de reforma da Previdência, que deu origem a uma onda de manifestações e saques que deixou ao menos sete mortos e centenas de feridos desde a última quarta-feira (18).

Num encontro com empresários, que haviam declarado apoio às manifestações, Ortega disse que o Instituo Nicaraguense de Seguridade Social (INSS) revogou a resolução do último dia 16, "que serviu como gatilho para começar toda essa situação".

A reforma previa o aumento das contribuições patronais e dos trabalhadores para a Previdência, para tentar diminuir o déficit do sistema.

Segundo Ortega, a revogação da resolução servirá para manter diálogo com os setores que convocaram as manifestações. Ele disse que convidaria o cardeal Leopoldo Brenes, arcebispo de Manágua (capital do país), para uma mesa de autoridades que discutirá o tema.

O presidente criticou, no entanto, os manifestantes, ao compará-los com as gangues de criminosos de outros países da América Central.

Os protestos vinham desde a última quarta-feira (18). Diante da desordem, comerciantes tentavam proteger suas lojas de saqueadores, e postos de gasolina e supermercados registraram longas filas de clientes preocupados em armazenar produtos.

No fim da noite deste sábado (21), a mídia local informou que um repórter foi baleado e morto enquanto fazia uma transmissão ao vivo em uma cidade do interior onde houve passeatas. Supostas imagens do episódio logo tomaram as redes sociais, provocando indignação.

A violenta repressão policial contra os manifestantes e as restrições a certos veículos de comunicação nos últimos dias ampliaram as críticas a Ortega, que em 2016 foi eleito para um terceiro mandato seguido (não há limite de reeleição no país), em um pleito no qual a principal coalizão opositora foi impedida judicialmente de participar.

Em nota, o Departamento de Estado dos EUA cobrou "um amplo diálogo" entre governo e oposição e a "restauração do respeito" aos direitos humanos. "Condenamos a violência e a força excessiva usada pela polícia contra civis que estão exercendo seu direito de liberdade de expressão e reunião."

A situação chamou a atenção inclusive do papa Francisco, que neste domingo pediu o fim da violência e que as divergências fossem "resolvidas pacificamente e com senso de responsabilidade".

A Nicarágua vinha mantendo certa estabilidade em comparação com seus vizinhos da América Central, como Honduras, Guatemala e El Salvador, assolados pela guerra de gangues criminosas.

Os anos de governo Ortega têm sido de crescimento na economia, e o presidente mantinha boa relação com o empresariado. Agora, a principal entidade do setor declarou que apoia protestos pacíficos contra o plano de reforma previdenciária e que só voltará a dialogar com o governo quando a repressão for interrompida.

As críticas aumentam também em relação ao cada vez mais claro propósito de Ortega de se perpetuar no poder. Um dos líderes da Frente Sandinista de Libertação Nacional, foi personagem-chave para derrubar a ditadura da família Somoza, em 1979. Eleito presidente em 1984, governou por um mandato e só voltou à Presidência após vencer o pleito de 2006.

Desde então, Ortega tem tomado medidas autoritárias para cercear a oposição e a imprensa, além do movimento para reformar a Constituição e permitir a reeleição indefinida.

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