Imperador Akihito faz seu último discurso de Ano-Novo antes de abdicar

Em três décadas de reinado, ele visitou antigos rivais e atuou como pesquisador

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O imperador Akihito saúda o público em seu discurso de Ano Novo em Tóquio - Kazuhiro Nogi/AFP
São Paulo | AFP

O imperador japonês Akihito pronunciou nesta quarta-feira (2) seu último discurso de Ano-Novo antes de abdicar e disse que reza pela paz no mundo.

Segundo o Palácio Imperial, mais de 72 mil pessoas se reuniram na residência real na manhã desta quarta, em Tóquio, em sua última oportunidade para ver o imperador de 85 anos pronunciar sua mensagem de Ano-Novo. Muitos agitavam bandeiras japonesas e gritavam "vida longa".

"Rezo pela paz e pela felicidade do povo do nosso país e do mundo", disse Akihito, ao lado da imperatriz Michiko e de outros familiares.

Akihito deixará o posto em 30 de abril de 2019, quando abdicará em prol de seu filho, o príncipe Nahurito, 58. 

Ao longo de seu reinado, o atual imperador buscou aproximar-se do povo japonês e ampliar as relações com outros países, incluindo antigos rivais.

Ele pertence à monarquia hereditária mais antiga do mundo, iniciada em 660 a.C. Por séculos, acreditava-se que os imperadores tinham poderes mágicos e podiam se comunicar com os deuses. 

O último líder japonês a ser considerado divino foi o pai de Akihito, o imperador Hiroito (1901-1989), que conduziu o país na Segunda Guerra Mundial. 

Com a derrota, Hiroito teve de fazer um discurso de rendição no rádio. Foi a primeira vez que os japoneses comuns puderam ouvir a voz de seu líder. 

A constituição de 1947, imposta pelos países vencedores da guerra, obrigou Hiroito a renunciar ao status de divindade. O cargo de imperador passou a ser apenas simbólico, sem poderes políticos. Hiroito ficaria mais quatro décadas na função, até sua morte. 

Akihito foi proclamado príncipe herdeiro em 1952, quando fez 18 anos. Sua primeira viagem oficial ao exterior foi a Londres, para a coroação da rainha Elisabeth 2ª, em 1953.

No fim da década de 1950, ele quebrou a tradição e se casou com uma plebeia, a atual imperatriz Michiko, que conheceu em um clube de tênis. 

Enquanto esperava para assumir a coroa, Akihito fez mais de 50 viagens ao exterior, duas delas ao Brasil. Em 1967, mais de 60 mil pessoas, boa parte descendentes de japoneses, foram vê-lo em um evento no estádio do Pacaembu, em São Paulo. O monarca também foi homenageado por um desfile de carros alegóricos no vale do Anhangabaú. 

Além das viagens, ele se tornou pesquisador da biologia marinha e publicou dezenas de artigos científicos em revistas como Science e Nature. Sua pesquisa é centrada nos peixes goby. 

Durante seu reinado, Akihito viu o Japão enfrentar anos de estagnação econômica e ser ultrapassado pela China no posto de maior potência asiática. Em 1990, quando tomou posse, o PIB japonês era de US$ 2,92 tri, nove vezes maior que o chinês (US$ 393 bi, ambos em valores da época). Em 2017, o PIB chinês (US$ 12,2 tri) foi três vezes maior do que o japonês (US$ 4,87 tri). 

​​Akihito foi à China em 1992 e falou sobre os danos causados durante a invasão japonesa, em 1937, mas sem pedir desculpas. “Na longa história entre nossos países, houve um período desafortunado no qual meu país infligiu grande sofrimento ao povo da China. Sobre isso, eu sinto profunda tristeza”, discursou em Pequim. 

Como imperador, ele visitou o Brasil em 1997 e se encontrou com o presidente Fernando Henrique Cardoso. Em 2005. recebeu o presidente Luiz Inácio Lula da Silva em Tóquio. “O imperador tem grande simpatia pelo Brasil e, especialmente, pelos nipo-brasileiros”, diz Yasushi Noguchi, cônsul do Japão em São Paulo

No cargo, Akihito também acompanhou desastres naturais marcantes no Japão, como o terremoto em Kobe, que deixou cerca de 6.400 mortos em 1995, e o tremor seguido de tsunami que matou mais de 20 mil pessoas em 2011.

“O imperador sempre mostrou muita solidariedade às vítimas e visitou os lugares das tragédias, para ajudar a levantar o ânimo das pessoas”, lembra Noguchi. O cônsul recorda que o pai de Akihito, o imperador Hiroito, viajou por várias cidades japonesas para motivar os japoneses a seguir no trabalho reconstruir o país após a Segunda Guerra.

Conforme envelheceu, Akihito teve vários problemas de saúde, incluindo um câncer de próstata, diagnosticado em 2003, uma hemorragia estomacal e uma obstrução cardíaca. 

As questões de saúde fizeram com que ele reduzisse sua agenda de compromissos aos poucos. Em 2017, o Congresso japonês aprovou uma lei que o autorizou a abdicar do cargo. Nos últimos 201 anos, nenhum imperador saiu do trono em vida. 

A troca imperial marca literalmente o início de uma nova era no Japão. Cada monarca dá nome a um período histórico. Para alguns documentos oficiais, estamos no ano 30 da era Heisei, que significa “cumprimento da paz”. O nome da nova fase será anunciado apenas no ano que vem.

Antes de deixar o cargo, Akihito será homenageado em uma festa pelos 30 anos de reinado, em fevereiro. Em 2019, o país também receberá a próxima reunião do G20, em junho e, em 22 de outubro, uma grande festa marcará a coroação do novo imperador.

 

CRONOLOGIA

7.jan.1989: Assume como imperador do Japão, após a morte do pai

Out.1992: Realiza a primeira visita de um imperador japonês à China

Jan.1995: Terremoto de 7,3 graus atinge Kobe e deixa mais de 6.000 mortos

Jun.2002: Japão sedia a Copa do Mundo de futebol. Akihito comparece à final, mas não entrega a taça de campeão para a seleção brasileira

Jan. 2003: É operado para a remoção de um câncer de próstata

Jul. 2009: Visita o Havaí, atacado pelo Japão na Segunda Guerra

Fev. 2011: China ultrapassa o Japão no posto de 2ª maior economia do mundo

Mar.2011: Faz o primeiro discurso de um imperador japonês na TV, após o terremoto e o tsunami que atingiram o país

Fev. 2012: É internado para uma cirurgia cardíaca

Abr.2013: Publica um estudo de 350 páginas sobre o peixe goby, em parceria com outros pesquisadores

Jan.2016: Visita as Filipinas e presta homenagem às vítimas da Segunda Guerra

Ago.2016: Em discurso, sugere o desejo de deixar o trono.

30.abr.2019: Data marcada para a abdicação

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