Descrição de chapéu África

Bolsonaro convida africano acusado de guinada autoritária para visita oficial

Presidente diz que deve ter encontro com líder de Guiné-Bissau, o 'Bolsonaro da África', em setembro

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Brasília

O presidente Jair Bolsonaro (sem partido) convidou um líder africano acusado de promover uma guinada autoritária em seu país para uma visita oficial ao Brasil.

A informação foi revelada pelo próprio Bolsonaro em conversa com apoiadores na noite de quarta-feira (28). Porém, na ocasião ele não se lembrou do nome de seu convidado ou do país governado por ele.

O presidente de Guiné Bissau, Umaro Sissoco Embaló, logo após vencer as eleições no país africano, no final de 2019 - Seyllou - 28.dez.2019/AFP

"Eu vou receber, final de setembro se eu não me engano. Lá da África, qual o país da África? Eu conversei com ele", disse o presidente aos simpatizantes.

"Ele é conhecido como Bolsonaro da África. Ele por acaso é general de Exército", afirmou.

De acordo com interlocutores, Bolsonaro se referiu ao presidente de Guiné-Bissau, Umaro Sissoco Embaló. O presidente brasileiro conversou por telefone com Embaló na semana passada. O compromisso não constou da agenda oficial.

No telefonema, o presidente realizou o convite para que Embaló venha ao Brasil.

Apesar de o presidente ter dito que espera receber o guineense em setembro, pessoas que acompanham o tema disseram à Folha que ainda não há planejamento para a visita.

O líder guineense é um admirador de Bolsonaro e partilha com o brasileiro um passado militar.

Na Guiné-Bissau, ele é criticado pela indicação de militares para postos-chave da estrutura do Estado, em detrimento de servidores civis, e por apoiar a repressão policial contra uma greve de professores e profissionais de saúde.

Embaló também tem defendido uma reforma da Constituição do país. Segundo críticos, a mudança constitucional tem por objetivo concentrar poderes nas mãos do presidente.

O autoritarismo do líder guineense faz com que opositores o acusem de tentar implementar uma ditadura no país.

Militar da reserva, Embaló disse em entrevista recente ver Bolsonaro como uma inspiração.

"O vice-presidente do Brasil [Hamilton Mourão] disse-me durante a cimeira [cúpula] da CPLP [Comunidade dos Países da Língua Portuguesa], em Luanda, que o Jair Bolsonaro decidiu candidatar-se à Presidência brasileira por entender que o Brasil não podia correr mais riscos. Porque os civis não se entendem", afirmou Embaló em 20 de julho, segundo o serviço em português da Deutsche Welle, rede pública de comunicação da Alemanha.

Guiné-Bissau é uma ex-colônia portuguesa, que faz parte da CPLP.

"Então, [Bolsonaro disse:] vamos concorrer às presidenciais e, se ganharmos, vamos pôr ordem no Brasil", disse o presidente guineense ainda de acordo com o portal alemão. Embaló afirmou feito a mesma coisa em seu país.

A cúpula da CPLP ocorreu em meados de julho, na capital de Angola.

De acordo com Alexandre dos Santos, professor de África no Instituto de Relações Internacionais da PUC-Rio (Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro), Embaló usa a associação com Bolsonaro para defender suas ações de política interna.

Ele citou o presidente brasileiro para justificar a militarização de seu governo, ao afirmar que os fardados estão preenchendo diversos cargos no Estado para lidar com problemas para os quais os civis não encontraram solução, como a corrupção.

Além do mais, disse Santos, Embaló usou a retórica de Bolsonaro ainda na campanha presidencial, ao se apresentar como um postulante contra a "velha política".

Se a visita se concretizar, Embaló deve encontrar em Brasília um cenário diferente do que o descrito por ele para a população guineense.

Acuado por uma crise de popularidade e com sua reeleição ameaçada, Bolsonaro selou uma aliança com o centrão, que, na prática, reduziu o poder da ala militar do governo.

Na avaliação de Santos, a eventual visita a Brasília representará um ganho político expressivo para Embaló e deve ser explorada pelo guineense.

"Para o Bolsonaro não vai fazer diferença alguma, porque ele vai receber alguém com quem apenas tem proximidade ideológica. Quem vai ganhar muito é o Embaló, porque vai usar a viagem para defender suas posições ideológicas internamente, o que é muito ruim para a democracia de Guiné-Bissau", afirmou.

O convite ao líder guineense ocorre na mesma semana em que Bolsonaro foi criticado por ter recebido no Palácio do Planalto a líder de ultradireita alemã Beatrix von Storch. Ela é neta de um ex-ministro das Finanças do governo do nazista Adolf Hitler.

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