Japão anuncia plano militar de US$ 320 bilhões e rompe tradição pacifista

Novo orçamento da defesa prepara país para possíveis guerra e lista China como maior desafio estratégico

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Tóquio | Reuters

O Japão anunciou nesta sexta-feira (16) o maior reforço em seu orçamento militar desde a Segunda Guerra Mundial. O plano de US$ 320 bilhões, na prática, prepara o país para um conflito contínuo e inclui a compra de mísseis capazes de atingir a China.

Em meio à Guerra da Ucrânia, que já dura dez meses, e às tensões regionais na Ásia, o orçamento bélico que antes seria impensável no Japão tradicionalmente pacifista posiciona o país na terceira posição do ranking de maiores gastos militares, atrás apenas de Estados Unidos e China.

Soldados do Exército do Japão durante revisão das tropas em Asaka - Kazuhiro Nogi - 14.out.18/AFP

O primeiro-ministro Fumio Kishida descreveu o plano bilionário como ele é —"um ponto de virada na história"— e disse que esta foi sua resposta aos vários desafios de segurança que o Japão enfrenta.

Nessa lista, entra o temor de que a invasão russa da Ucrânia encoraje a China a atacar Taiwan. Isso ameaçaria as ilhas japonesas próximas do território que Pequim considera uma província rebelde, interromperia o fornecimento de semicondutores cruciais para a indústria global e poderia estrangular as rotas marítimas que fornecem petróleo ao Oriente Médio.

Em sua Constituição, datada do pós-guerra, o Japão abre mão do direito de guerrear e dos meios para fazê-lo. O novo orçamento militar, portanto, parece acenar em outra direção, embora Tóquio argumente que todo o investimento previsto é parte de uma estratégia de autodefesa.

"A invasão russa da Ucrânia é uma grave violação das leis que proíbem o uso da força e abalou os alicerces da ordem internacional", diz o texto que anuncia o plano.

Além disso, à semelhança da estratégia de defesa revisada dos EUA, o plano japonês observa que Pequim nunca descartou o uso da força para subjugar Taiwan a seus interesses e define a China como o maior desafio que o Japão já enfrentou —documentos estratégicos anteriores citavam ainda a Rússia e a Coreia do Norte.

"O primeiro-ministro [Kishida] está fazendo uma declaração estratégica clara e inequívoca sobre o papel do Japão como provedor de segurança no Indo-Pacífico", disse o embaixador dos EUA no Japão, Rahm Emanuel, em comunicado. "Ele colocou um D maiúsculo ao lado da dissuasão do Japão", acrescentou, em referência à capacidade de frear possíveis impulsos bélicos de adversários de Tóquio.

Taiwan, como esperado, deu boas-vindas ao plano japonês. A presidente Tsai Ing-wen manifestou o desejo de que a cooperação Tóquio-Taipé se prolongue em todos os aspectos.

A China, por sua vez, acusou o Japão de fazer falsas acusações sobre as atividades militares de Pequim. O orçamento de defesa da China ultrapassou o do Japão na virada do século e é agora quatro vezes maior.

O plano de Kishida dobrará os gastos com defesa para cerca de 2% do PIB (Produto Interno Bruto) em cinco anos, ultrapassando a marca estabelecida em vigor desde 1976 que limitava essa fatia a 1%.

O aumento de gastos vai favorecer empresas japonesas —como a Mitsubishi Heavy Industries (MHI), que deve liderar o desenvolvimento de três dos mísseis de longo alcance que farão parte da nova força de mísseis do Japão— e estrangeiras, como a Raytheon Technologies, que fabrica os mísseis de cruzeiro Tomahawk dos EUA.

O orçamento bilionário, porém, já provocou alguns reveses políticos para Kishida. Isso porque parte da verba que compõe o novo plano virá de um aumento de impostos anunciado também nesta sexta, mas sem data para entrar em vigor. Uma ala do Partido Liberal Democrático, a sigla do premiê, opõe-se à alta das taxas, o que pode comprometer a liderança de Kishida à frente do país.

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Tópicos relacionados

Leia tudo sobre o tema e siga:

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.