Premiê da Espanha antecipa eleições gerais após derrota em pleito regional

Partido do governo socialista teve 28% dos votos, frente aos 31% dos conservadores do PP

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Madri

Horas após a derrota que o Partido Socialista Operário Espanhol (PSOE) teve frente ao Partido Popular (PP) nas eleições regionais da Espanha, no domingo (28), o premiê Pedro Sánchez, do primeiro grupo, antecipou em quase quatro meses as eleições gerais que estavam programadas para 10 de novembro.

O escrutínio agora será realizado em 23 de julho, durante o verão europeu, algo inusitado na Espanha. A ideia do PSOE é conter um desgaste maior frente ao crescimento da direita e diminuir a possibilidade de que o conservador PP e o Vox, de ultradireita, consigam uma maioria capaz de eleger o próximo premiê.

"Assumo a responsabilidade desses resultados e acredito ser necessário dar uma resposta. Muitos políticos com gestão impecável já perderam o cargo. O melhor é que os espanhóis tomem a palavra para definir os rumos políticos do país", disse Sánchez na manhã desta segunda.

O premiê espanhol Pedro Sánchez em discurso no Congresso, em julho do ano passado
O premiê espanhol Pedro Sánchez em discurso no Congresso, em julho do ano passado - Pierre-Philippe Marcou - 12.jul.22/AFP

"Embora as votações deste domingo tivessem alcance municipal e regional, o significado da votação transmite uma mensagem que vai mais longe. E é por isso que, como primeiro-ministro, e também como secretário-geral do Partido Socialista, assumo a responsabilidade pelos resultados e creio ser necessário dar uma resposta e submeter o nosso mandato democrático à vontade popular."

Durante a tarde, o Conselho de Ministros se reuniu para dar formato jurídico à decisão, que inclui a dissolução do Parlamento. Antes, o rei Filipe 6º, chefe de Estado, foi avisado da movimentação.

Nas eleições de domingo para 8.135 prefeituras e para Parlamentos de 12 das 17 províncias, o PP conseguiu 750 mil votos a mais que o PSOE, invertendo a dinâmica das eleições de 2019. O PP teve 31% dos votos (23% há quatro anos), e o PSOE, 28% (29%). Já o Vox alcançou 7%, o dobro dos 3,5% de 2019.

No pleito passado, o PP havia tido o pior resultado de sua história, e o Vox era só uma possibilidade. Quatro anos depois, a esquerda vê o risco de o país passar a ser governado pela direita como provável.

"Sánchez é um político ousado e corre riscos que poucos correriam. Essa é sua maior aposta", afirmou à Folha Michael Reid, jornalista britânico que lançou há três meses o livro "Spain: The Trials and Triumphs of a Modern European Country" (Espanha: as provações e os triunfos de um país europeu moderno).

"A razão imediata de sua decisão é a séria derrota que seu partido sofreu nas eleições regionais. Ele temia que, se continuasse por mais seis meses, fosse visto como um líder enfraquecido e que se tornasse alvo de todos os lados. Em vez de sofrer seis meses, escolheu cortar a gangrena."

Para Reid, ainda que seja comum no parlamentarismo que premiês convoquem eleições —Sánchez se referiu à prática como "a mais infalível" para ouvir a opinião do povo, a raiz do problema atual está na fragmentação da política espanhola nos últimos 10 ou 15 anos.

Até então, o PP e o PSOE eram os dois grandes partidos em luta pelo poder. Havia ainda o Ciudadanos, de centro-direita, que vem definhando para a irrelevância. Mais recentemente, blocos foram formados, como o PSOE e o Podemos (ultraesquerda, fundado em 2014) e o PP com o Vox (ultradireita, de 2013).

"Nessa ânsia para formar maiorias, Sanchéz buscou alianças polêmicas com certos partidos ou coligações", diz Reid, citando separatistas do Eh Bildu, do País Basco, e a Esquerda Republicana, da Catalunha. "Os socialistas não gostaram dessas alianças e o risco agora é que eles não saiam para votar."

Outra dificuldade para o governo é o atual embate interno do Podemos, que desestabiliza a esquerda. O fundador do partido, Pablo Iglesias, prefere apoiar Sánchez, mas Yolanda Díaz, comumente vista como sua sucessora, tem ambições próprias para La Moncloa, a sede do governo espanhol.

O socialismo perdeu o controle em seis das doze comunidades autônomas, como Andaluzia, Aragão, Valência e Rioja. Contudo, o PP precisará se unir ao Vox para governar em cinco delas: Aragão, Valência, Cantabria, Baleares e Extremadura.

"Há o risco de que a derrota esteja fresca na cabeça das pessoas, mas a grande questão é se os eleitores socialistas irão normalizar o apoio aos partidos separatistas e se mobilizarão para votar", afirma Reid. Já a direita parece ter conseguido essa mobilização, sob a ideia de "revogar o sanchismo".

Há também, é claro, o aumento do custo de vida no país, potencializado pela Guerra da Ucrânia. Em 2019, a inflação na Espanha foi de 0,7% para todo o ano, enquanto em 2022 o número saltou para 8,39%. Uma reunião do governo para analisar os resultados foi realizada nesta segunda. Segundo o diário ABC, fontes disseram que não imaginavam uma derrota eleitoral de tal magnitude e que perderam o aspecto nacional da campanha.

O líder do Partido Popular, Alberto Núñez Feijóo (ao centro), celebra com a presidente da comunidade de Madri, Isabel Díaz Ayuso, e o prefeito da capital, José Luis Martínez-Almeid, na sede da sigla - Javier Soriano/AFP

Para El País, principal jornal da Espanha, "Sánchez, acostumado a decisões arriscadas ao longo de sua carreira, optou pela mais perigosa de todas, mas também a única que ninguém esperava na noite das eleições". "O presidente [no país europeu, o cargo de premiê é chamado de presidente do governo] coloca os eleitores, sobretudo os progressistas, na posição de terem de decidir quase imediatamente se querem consolidar o resultado das eleições regionais e municipais, que entregam quase todo o poder ao PP e ao Vox, e de permitirem que isso chegue à Moncloa [sede do governo] ou se mobilizarem para evitá-lo."

Nas eleições gerais, os espanhóis votarão em partidos, que, por sua vez, indicarão os deputados de sua preferência. O partido ou a coalizão que conquistar a maioria de 176 cadeiras estará apto a indicar o nome do primeiro-ministro. Sánchez concorrerá novamente ao cargo após cinco anos no poder, que se completam nesta semana.

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