Militar celebrado na Austrália perde ação por difamação em caso de assassinato de afegãos

Envolvimento de Ben Roberts-Smith na morte de seis civis de 2006 a 2012 foi reportado por três jornais

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Sydney | Reuters

Ben Roberts-Smith, 44 , um dos veteranos de guerra mais condecorados da Austrália, perdeu um processo por difamação movido na Justiça contra três publicações do país que noticiaram seu envolvimento no assassinato de cidadãos indefesos, de 2006 a 2012, durante a guerra do Afeganistão.

As reportagens relatam que ele matou a tiros um adolescente desarmado e chutou um homem algemado para fora de um penhasco. Roberts-Smith estaria envolvido na morte de ao menos seis civis. O veterano processou os jornais Sydney Morning Herald, The Age e The Canberra Times, alegando ter sido retratado como alguém que "quebrou as regras morais e legais do engajamento militar".

O ex-militar australiano Benjamin Roberts-Smith, acusado de ter cometido crimes de guerra
O ex-militar australiano Benjamin Roberts-Smith, acusado de ter cometido crimes de guerra - Lewis Whyld - 15.nov.11/Pool/AFP

Na acusação, os relatos são tachados de falsos e baseados em declarações de "soldados fracassados", que estariam com ciúmes de seu sucesso. Ele ainda pediu uma indenização, cujo valor não foi revelado.

Considerado um herói nacional, Roberts-Smith ganhou várias honras militares pelas ações nas seis vezes em que esteve no Afeganistão. Após se aposentar, construiu uma carreira bem-sucedida de palestrante. O ex-militar tem um retrato no Australian War Memorial, em Camberra, que homenageia militares.

Ao longo de meses, os jornais defenderam as reportagens na Justiça. Soldados e ex-membros das Forças Armadas que contribuíram com a apuração foram ouvidos na condição de testemunhas. "À luz de minhas conclusões, cada processo [de difamação] deve ser arquivado", disse o juiz Anthony Besanko, em Sydney.

Na decisão, o magistrado menciona o assassinato de um afegão com deficiência e manifesta perplexidade diante da brutalidade dos crimes que teriam sido cometidos por Roberts-Smith. "[Ele] era tão insensível e desumano que levou a prótese da perna [da vítima] de volta para a Austrália e encorajou seus soldados a usá-la como um novo recipiente para beber cerveja", afirmou o juiz federal.

Besanko também destacou que o ex-militar incentivava companheiros a cometerem crimes. Uma das testemunhas acusa Roberts-Smith de ter ordenado a um soldado australiano de baixo escalão que executasse um afegão idoso e desarmado para receber o que chamou de "sangue de novato".

A decisão é uma vitória para os veículos que investigam a responsabilidade de militares da Austrália em eventuais crimes de guerra. A discussão do tema é considerada um tabu no país, e processos na Justiça costumam ser sigilosos. "[O veredicto] é um reconhecimento para as muitas pessoas em nossas Redações e em nossa organização que apoiaram este jornalismo de interesse público", disse James Chessell, editor-chefe de publicação da Nine Entertainment, empresa que controla os jornais processados.

"É uma vingança para os bravos soldados do SAS [Serviço Aéreo Especial] que serviram o país com distinção e depois tiveram a coragem de falar a verdade sobre o que aconteceu", acrescentou.

O Talibã, atualmente no poder no Afeganistão, disse que forças estrangeiras cometeram "incontáveis crimes" durante a guerra no país. Para Bilal Karimi, porta-voz da organização extremista, os incidentes relacionados no caso foram uma "pequena parte" dos muitos supostos crimes que ocorreram. Já o advogado de Roberts-Smith, Arthur Moses, disse que seu cliente deve recorrer da decisão.

À agência Reuters organizações que atuam na defesa dos direitos humanos celebraram a decisão. "O caminho para responsabilidade, verdade e justiça é longo", disse Fiona Nelson, diretora de defesa legal do Australian Centre for International Justice, entidade sem fins lucrativos que investiga crimes. "Este caso é um lembrete de que precisamos de um jornalismo corajoso para nos ajudar a chegar lá."

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