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Suprema Corte dos EUA decide que condenação por ameaças online viola liberdade de expressão

Caso envolve homem que mandou milhares de mensagens a cantora; juízes entenderam que intenção não foi provada

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Washington

A Suprema Corte dos EUA reverteu nesta terça (27) a condenação de um homem do estado do Colorado que enviou milhares de mensagens pelo Facebook —incluindo afirmações antes interpretadas como ameaças de morte— a uma cantora que nunca chegou a encontrar pessoalmente.

O réu, Billy Counterman, argumentava que o que enviou a Coles Whalen estaria protegido pela Primeira Emenda da Constituição, que garante a liberdade de expressão.

Na decisão desta terça-feira, sete dos nove juízes afirmaram que ameaças não estão protegidas pela liberdade de expressão, mas defenderam que a Primeira Emenda "requer provas de que o réu tinha algum entendimento subjetivo da natureza ameaçadora de suas declarações".

Prédio da Suprema Corte dos EUA, em Washington - Elizabeth Frantz - 26.jun.22/Reuters

Ou seja, segundo a Corte, é preciso provar que quem envia mensagens não solicitadas sabe que elas podem ser lidas como ameaças, o que pode abrir espaço para reverter outras condenações por perseguição no país. No Brasil, desde 2021 esse tipo de conduta, conhecida como "stalking", pode provocar até dois anos de prisão, pena que é dobrada caso a vítima seja perseguida por ser mulher.

O entendimento da Suprema Corte não foi tomado com base na orientação política dos juízes, que em sua maioria são conservadores. Todos os três juízes mais progressistas, assim como quatro dos conservadores, concordaram que o réu não poderia ser condenado. Discordaram apenas Clarence Thomas, nome mais conservador da corte, e Amy Coney Barrett.

Outro julgamento da Suprema Corte em 2015 já havia decidido em favor do réu com argumento parecido, ao reverter a condenação de um homem na Pensilvânia acusado de ameaçar colegas de trabalho.

No caso do Colorado, foram dois anos de mensagens, a partir de 2014, com ameaças de morte tanto no perfil pessoal quanto na página pública da cantora. Quando começou, Counterman estava em liberdade provisória por outro crime do tipo. Uma das mensagens dizia: "Você não está sendo boa nas relações humanas. Morra. Não preciso de você."

A cantora disse no processo que teve ansiedade devido ao conteúdo e que precisou cancelar alguns de seus shows. Segundo a acusação, Whalen obteve licença para andar armada e passou a dormir com a luz acesa. Ela nunca respondeu o stalker e bloqueou pelo menos quatro perfis diferentes criados pelo réu.

Counterman havia sido condenado em 2017 a quatro anos e meio de prisão por perseguição, com base na lei de stalking de Chicago, que não faz menção a intenções subjetivas de um acusado. A condenação depois foi mantida em um tribunal de apelações. Ele dizia em sua defesa que nunca teve a intenção de ameaçá-la e que tinha distúrbios mentais —argumento acolhido nesta terça pela Suprema Corte. Agora, com a condenação revertida, o caso volta para tribunais inferiores.

Tribunal rejeita caso que mudaria forma como eleições são organizadas

Outra decisão importante da Suprema Corte dos EUA nesta terça-feira foi a rejeição da ampliação do poder dos Legislativos estaduais na organização dos distritos eleitorais, o que poderia alterar de maneira substancial as eleições no país.

Com maioria de 6 a 3, os juízes decidiram contra parlamentares republicanos da Carolina do Norte que tentavam mudar o desenho de 14 distritos, o chamado "gerrymandering", o que prejudicaria a eleição de democratas à Câmara dos Representantes, segundo o processo. Os republicanos questionavam decisão do tribunal máximo da Carolina do Norte que havia bloqueado o redesenho de distritos.

Em debate estava a chamada doutrina da "legislatura estadual independente", que argumenta que a Constituição reserva exclusivamente aos legislativos estaduais a organização das eleições federais, quando diz que "o tempo, o lugar e o modo de realizar eleições para senadores e representantes devem ser prescritos em cada estado por sua própria legislatura". Os defensores dessa teoria queriam tirar o poder dos Judiciários locais e das Constituições estaduais na contestação a decisões do Legislativo.

Se a Suprema Corte concordasse com os deputados, poderia abrir um precedente para que os tribunais do país não pudessem mais questionar ações tomadas pelos Legislativos, o que abriria espaço para mudanças heterodoxas das regras eleitorais e, no extremo, invalidação de resultados das urnas.

"A Cláusula Eleitoral [da Constituição] não isola as legislaturas estaduais do exercício ordinário da revisão judicial estadual", disse o juiz John Roberts na decisão.

O "gerrymandering" é comum em todos os lados do campo político, mas passou a ser adotado de maneira mais expressiva pelos republicanos após a contestação das eleições de 2020 por Donald Trump, com aumento de restrições ao voto sob o argumento de "evitar fraudes".

Assim como a decisão sobre o caso do stalking, juízes progressistas e conservadores formaram maioria contra os republicanos da Carolina do Norte. A dissidência partiu de outros três membros conservadores do tribunal, Samuel Alito, Clarence Thomas e Neil Gorsuch.

Quem é quem na Suprema Corte dos EUA

  1. John Roberts, 68 (conservador)

    Indicado por George W. Bush em 2005. Ainda que seja considerado conservador, o atual presidente da Corte às vezes atua mais ao centro

  2. Clarence Thomas, 74 (conservador)

    Indicado por George Bush em 1991

  3. Samuel Alito, 73 (conservador)

    Indicado por George W. Bush em 2006

  4. Neil Gorsuch, 55 (conservador)

    Indicado por Donald Trump em 2017

  5. Brett Kavanaugh, 58 (conservador)

    Indicado por Trump em 2018

  6. Amy Coney Barrett, 51 (conservadora)

    Indicada por Trump em 2020

  7. Sonia Sotomayor, 68 (progressista)

    Indicada por Barack Obama em 2009

  8. Elena Kagan, 63 (progressista)

    Indicada por Obama em 2010​

  9. Ketanji Brown Jackson, 52 (progressista)

    Indicada por Joe Biden em 2022

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