Não vemos o Brics como um bloco rival, diz governo dos EUA

Possibilidade de ampliação do bloco capitaneada pela China é encarada como tentativa de Pequim de fazer frente a potências ocidentais

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Washington

O governo americano não vê o Brics —grupo formado por Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul— como rivais geopolíticos dos Estados Unidos ou de quaisquer outros países, afirmou nesta terça-feira (22) o conselheiro de segurança nacional de Joe Biden, Jake Sullivan, a jornalistas.

Ele disse ainda que o bloco é muito diverso "em sua formação atual", e destacou que os países-membros têm visões divergentes em temas como a Guerra da Ucrânia. "Da nossa perspectiva, vamos continuar a trabalhar nas relações fortes e positivas que temos com Brasil, Índia e África do Sul."

Da esquerda para a direita, o ministro de comércio sul-africano Ebrahim Patel, o presidente Lula e o presidente da África do Sul, Cyril Ramaphosa, durante a cúpula dos Brics em Joanesburgo - Marco Longari/AFP

Mais cedo, Lula (PT) havia negado que o Brics busque ser um contraponto ao G7, grupo formado pelos países desenvolvidos, ou ainda ao G20 ou aos EUA. "A gente quer criar uma coisa que nunca teve, que nunca existiu", disse sobre o grupo fundado em 2009, apropriando-se do acrônimo criado por Jim O'Neil na virada dos anos 2000 para os quatro países que na época encarnavam o futuro da economia mundial. Então, formavam o Bric, no singular —só depois se tornariam o Brics, com a entrada da África do Sul no bloco.

As declarações de Lula e Sullivan acontecem após Brasília e Washington protagonizarem tensões em razão de suas divergências acerca do conflito entre Rússia e Ucrânia. Embora tenha condenado a invasão russa, o governo brasileiro se posiciona de forma crítica à forma como o Ocidente tem tratado a disputa e enviado armas a Kiev.

Lula, em especial, foi alvo de indignação americana após uma série de falas polêmicas sobre o tema, feitas justamente durante sua visita oficial à China, em abril deste ano. "É preciso que os Estados Unidos parem de incentivar a guerra e comecem a falar em paz", afirmou o petista na ocasião, acrescentando que via "um papel muito importante" para Pequim na guerra no Leste Europeu e cobrando "boa vontade" da União Europeia.

As falas incluíram ainda a um ataque à hegemonia do dólar —que o petista repetiu na África do Sul nesta terça-feira ao defender mais uma vez a criação de uma moeda do Brics para transações internas ao bloco— e a uma insinuação de que os americanos pressionavam o governo brasileiro a boicotar a China. Somadas, foram interpretadas por integrantes do governo americano como uma afronta direta.

A grande pauta da cúpula do Brics que ocorre esta semana, a expansão do bloco, também põe o Brasil em posição delicada ao inserir o país no contexto mais amplo da Guerra Fria 2.0, que opõe Estados Unidos e China na disputa por influência no mundo. Uma das razões pelas quais o governo brasileiro é mais reticente em relação à ampliação do bloco é justamente a possibilidade de que o novo desenho fosse encarado como uma espécie de aliança anti-Ocidente.

Nesta segunda, Sullivan conversou com Celso Amorim, assessor especial da Presidência para assuntos internacionais. Segundo o americano, eles trataram da possibilidade de Biden e Lula se encontrarem paralelamente à Assembleia-Geral da ONU, que acontece em Nova York no próximo mês, e sobre iniciativas de interesse de ambos os presidentes relacionadas à promoção de direitos trabalhistas. Questionado sobre uma eventual visita de Biden ao Brasil, Sullivan afirmou que esse tema não foi tratado com Amorim.

Na mesma conversa com jornalistas nesta terça, o conselheiro americano afirmou ainda que os Estados Unidos vão aproveitar o próximo encontro do G20, na Índia, para promover o Banco Mundial e o FMI (Fundo Monetário Internacional) como mecanismos de financiamento para países emergentes, em alternativa ao que chamou de "financiamentos coercitivos" pela China.

Questionada pela Folha por email se o Novo Banco de Desenvolvimento (NDB, também conhecido como banco dos Brics, chefiado hoje pela ex-presidente Dilma Rousseff) seria um desses instrumentos coercitivos, a Casa Branca não respondeu.

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