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Esvaziada de europeus e asiáticos, ONU vira instituição americana

Mídia nova-iorquina mostra uma Assembleia-Geral em que os EUA defendem a Ucrânia, a quem abandonaram no G20

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Taipé (Taiwan)

Na primeira página desta quarta (20), em papel, o New York Times abriu uma foto da Assembleia-Geral da ONU, com Joe Biden falando e Volodimir Zelenski em dois telões, de uniforme, ouvindo. A manchete trazia a exortação do presidente americano ao mundo para "se levantar pela Ucrânia".

Duas semanas antes, na cúpula do G20 em Nova Déli, Biden não defendeu a Ucrânia nem Zelenski. Queria agradar Narendra Modi, o primeiro-ministro indiano; assinou embaixo quando este negou o pedido de participação do ucraniano e, na prática, apagou a condenação da guerra.

Na capa do NYT de quarta (30), Biden e Zelenski na Assembleia Geral da ONU; no Financial Times, a acusação do Canadá contra a Índia, de assassinato político - Reprodução

Em Nova York, esvaziada de potências europeias e asiáticas, a Assembleia-Geral da ONU vai ganhando ares de instituição americana. A atenção do jornalismo local para Zelenski ajuda a esquecer a impressão ruim de seu abandono por Biden no G20.

Em contraste, a primeira página do europeu Financial Times nesta quarta, inclusive em sua edição para os Estados Unidos, destacou a notícia do dia, de fato, que era a acusação do Canadá de que o governo indiano, de Modi, assassinou um dissidente em território canadense.

A acusação já teria sido levada tanto a Modi como a Biden, antes do G20, mas ocultada pelo governo canadense e pelos demais, para não atrapalhar a cúpula de Nova Déli —e o agrado americano ao governo indiano. Dissimulação que só aumenta o esvaziamento de sentido para G20 e ONU.

A manipulação das cúpulas multilaterais pelas potências, tanto EUA como Índia ou China, estende-se ao noticiário. O NYT, que havia criticado Biden por sumir com a democracia no G20, agora justifica a opção como uma imposição realista, para ter mais aliados.

Países que não tomam partido na guerra "tendem a ser democracias imperfeitas (como Brasil, Índia, Israel e Nigéria) ou autocracias (como Arábia Saudita e Vietnã)". Ou seja, "se os EUA sugerirem que apenas as democracias são bem-vindas na sua aliança, essa aliança diminuirá".

Importa a aliança, não democracia —ou desigualdade, lembrada por Lula para pouca repercussão externa. Mas esta é a realidade como exposta em mídia de alcance cada vez menor. Fora do NYT, como se verifica em agregadores como Mediaite, a notícia nos EUA já é Trump, não Biden.

Elon Musk, talvez o mais influente publisher americano hoje, comparou há dois dias o alcance de Tucker Carlson na plataforma X, 265 milhões de impressões (número de vezes que uma determinada publicação foi exibida na tela dos usuários), com a audiência que tinha na Fox News, 3 milhões. "Diferença gigante, não importa como você conte", escreveu.

Para o homem mais rico do mundo, pelo que se acompanha em sua plataforma, Nova York mal existe, e a Assembleia-Geral não está acontecendo. O mesmo vale para diversas potências ao redor do mundo, que enviaram representantes sem expressão e seguiram com as suas agendas.

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