Itamaraty diz que classificação de Hamas como terrorista cabe à ONU, não ao Brasil

Diplomacia brasileira descarta tomada de posição unilateral e convoca reunião sobre Gaza no Conselho de Segurança

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Brasília

O Ministério das Relações Exteriores informou nesta quarta-feira (11) que o status do Hamas e eventual classificação do grupo como uma organização terrorista deve ser tratado no âmbito do Conselho de Segurança da ONU. Com isso, descarta uma tomada de posição unilateral —Brasília historicamente obedece a categorizações da entidade para questões do tipo.

A Folha questionou o embaixador Carlos Sérgio Sobral Duarte, secretário do Itamaraty para a África e o Oriente Médio, se Brasília poderia rever sua posição unilateralmente. Duarte respondeu que o governo condenou os ataques assim que eles ocorreram, assim como o presidente Lula. Também ressaltou que ambos chamaram os atos de terroristas e repudiaram o terrorismo em geral, sobretudo quando ele tem como alvo a população civil. "Essa posição do Brasil é muito clara e muito forte", disse.

"O Brasil está tratando do assunto, no âmbito político, no Conselho de Segurança", prosseguiu. "Do ponto de vista imediato, o Brasil expressou também muito claramente a sua preocupação com a escalada de hostilidades. Essas posições são as mesmas que o Brasil tem defendido no âmbito do Conselho de Segurança."

Palestinos caminham entre escombros de edifícios destruídos no centro da cidade de Khan Yunis, no sul da Faixa de Gaza - Said Khatib/AFP

Brasília convocou uma nova reunião do colegiado do órgão mais importante da ONU sobre o conflito no Oriente Médio, dessa vez para tratar especificamente da Faixa de Gaza, para a sexta-feira (13). Segundo o Itamaraty, o ministro Mauro Vieira vai participar —na primeira reunião, no domingo (8), o representante brasileiro era o embaixador Sérgio Danese. O Brasil preside o conselho, formado por dez membros rotativos e cinco permanentes, em outubro. Até agora, o órgão não emitiu nenhum posicionamento sobre a guerra. A ONU, por sua vez, vem reforçando a preocupação humanitária com Gaza.

Em entrevista à Globonews, o ministro Paulo Pimenta, da Secretaria de Comunicação Social (Secom) afirmou que o Brasil não reveria sua posição histórica "em função de uma situação específica". "Existe uma competência para informar esse conceito de organização terrorista para o mundo inteiro", afirmou ele, acrescentando que essa classificação depende justamente do Conselho de Segurança da ONU.

"O Brasil sempre respeitou e acompanhou as decisões da ONU sobre isso. Hoje, Estado Islâmico e Al-Qaeda são organizações terroristas", prosseguiu. "Nossa posição histórica faz com que o Brasil seja conhecido como um país protagonista na possibilidade de construção de acordos internacionais."

Pimenta também minimizou o fato de ter assinado em 2021 uma nota, ao lado de outros parlamentares do PT, na qual apoiou o Hamas depois que o Reino Unido passou a considerá-lo um grupo terrorista. O ministro afirmou que o texto, divulgado no contexto da pandemia, tinha como objetivo evitar criar obstáculos para a ajuda e a cooperação internacionais, e segundo ele tem "sido utilizado de forma absolutamente equivocada por pessoas que tentam transformar qualquer coisa em disputa política".

Enquanto isso, o governo brasileiro lida com a situação de brasileiros em Israel e em territórios palestinos. Ao falar à imprensa, o embaixador Duarte disse que o Itamaraty ouviu que haveria brasileiros entre os reféns do Hamas, mas que ainda não conseguiu verificar os relatos —o porta-voz militar internacional de Tel Aviv primeiro afirmou que sim, há brasileiros entre os reféns; horas depois, voltou atrás e disse que não tem certeza.

Tampouco tinha atualizações acerca do paradeiro de Karla Stelzer Mendes, brasileira que está desaparecida desde que a festa de música eletrônica em que estava no fim de semana foi atacada pelo Hamas. Dois dos brasileiros que tinham desaparecido no mesmo evento, Bruna Valeanu e Ranani Glazer, foram declarados mortos nos últimos dias.

A lista de pedidos de repatriação de brasileiros em Israel atualmente tem 2.700 nomes, incluindo os 211 que chegaram ao Brasil na madrugada desta quarta. A pasta já constatou que há pedidos duplicados, porém, e anunciou que passará um pente-fino na relação.

Em relação à Faixa de Gaza, o Itamaraty havia afirmado que há 30 brasileiros ou filhos de brasileiros aguardando a tramitação do pedido de acesso feito pelo governo ao Egito. Na tarde desta quarta, porém, deles desistiram de integrar o grupo de inscritos, que passou a ser composto por 28 pessoas: 15 crianças, seis mulheres adultas, seis homens adultos e uma mulher idosa.

A situação deles é tensa: a ideia do Itamaraty de levá-las para a o posto de Rafah, junto à fronteira egípcia, esbarra no fato de que toda a área está sob bombardeio. A ação ainda tem que ser autorizada pelo Egito —o chanceler Mauro Vieira está em contato com o país para viabilizar a abertura do posto para os brasileiros, algo que outras nações também estão fazendo.

Israel entrou nesta quarta-feira (11) em seu quinto dia de ofensiva contra o Hamas na Faixa de Gaza, uma reação ao ataque surpresa feito pelo grupo terrorista a partir do território palestino no fim de semana. Somando os mortos dos lados israelense e palestino, o número de mortos no conflito já supera 2.300.

O Hamas invadiu Israel por terra, mar e ar no sábado (7). Durante o ataque, o grupo sequestrou dezenas de pessoas, incluindo mulheres civis, crianças pequenas e idosos, e as levaram de volta à Faixa de Gaza na condição de reféns, segundo o Exército israelense.

Logo após o ataque, o presidente Lula usou suas redes sociais para condenar o ataque, que chamou de "terrorista". Sem mencionar o grupo islâmico extremista Hamas, que assumiu a autoria dos ataques, o petista afirmou que o Brasil não poupará esforços para evitar uma escalada no conflito e pediu que a comunidade internacional trabalhe imediatamente para que as negociações de paz sejam retomadas.

Ao mesmo tempo, o presidente também defendeu ações que garantam a existência de um Estado palestino. "Conclamo a comunidade internacional a trabalhar para que se retomem imediatamente negociações que conduzam a uma solução ao conflito que garanta a existência de um Estado Palestino economicamente viável, convivendo pacificamente com Israel dentro de fronteiras seguras para ambos os lados", escreveu.

Colaboraram Fernanda Perrin e Igor Gielow

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