Maduro e presidente da Guiana devem se encontrar na quinta (14); Lula é convidado

Petista havia alertado aliado na Venezuela para 'crescente preocupação' dos países da região sobre a disputa de território

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São Paulo

O ditador da Venezuela, Nicolás Maduro, e o presidente da Guiana, Irfaan Ali, vão se encontrar na próxima quinta-feira (14) numa reunião em São Vicente e Granadinas, para a qual o presidente Luiz Inácio Lula da Silva também foi convidado. A reunião acontece em meio à disputa territorial por Essequibo, região rica em petróleo da Guiana que é reivindicada por Caracas.

O encontro bilateral foi anunciado neste sábado (9) em um comunicado da Celac (Comunidade dos Estados Latino-Americanos e Caribenhos), divulgado horas depois de uma conversa telefônica de Lula com Maduro, ligação na qual o presidente brasileiro pediu ao venezuelano para "evitar medidas unilaterais que levem a uma escalada da situação".

"Lula transmitiu a crescente preocupação dos países da América do Sul sobre a questão", disse nota sobre o telefonema divulgada pelo Palácio do Planalto, segundo a qual o presidente ainda teria recordado a longa tradição de diálogo na América Latina, "uma região de paz", e sugerido que o atual líder da Celac, Ralph Gonsalves, medie a questão.

Procurado pela Folha, o Itamaraty disse que não tinha confirmação sobre a presença de Lula no encontro. Já a Secretaria de Comunicação Social afirmou que o presidente não participará da reunião.

O líder da Venezuela, Nicolás Maduro, e o presidente do Brasil, Luiz Inácio Lula da Silva, durante cúpula de países da América do Sul no Palácio do Itamaraty, em Brasília - Ueslei Marcelino - 30.mai.2023/Reuters

As falas de Lula neste sábado repetem a declaração na qual Brasil, Uruguai, Paraguai, Argentina, Colômbia, Peru, Equador e Chile manifestaram "profunda preocupação" com o assunto, divulgada durante a Cúpula do Mercosul, nesta semana. "A América Latina deve ser um território de paz e, no presente caso, trabalhar com todas as ferramentas de sua longa tradição de diálogo", diz o comunicado.

No encontro do bloco econômico, sediado no Rio de Janeiro, o presidente já havia mencionado a Celac como possível mediadora, além do próprio Brasil. "Caso considerado útil, o Brasil e o Itamaraty estarão à disposição para sediar qualquer e quantas reuniões forem necessárias", afirmou ele em um discurso a chefes de Estado. "Não queremos que esse tema contamine a retomada do processo de integração regional ou constitua ameaça à paz e à estabilidade."

Pouco antes da publicação do comunicado sobre o telefonema, Maduro afirmou que Guiana e ExxonMobil, petroleira americana à frente da exploração das reservas em Essequibo, terão que conversar com a Venezuela. "De coração e alma, queremos paz e compreensão", disse o ditador em sua conta no X.

Na mesma plataforma, o presidente guianense disse neste sábado estar "comprometido com a paz na região". "A Corte Internacional de Justiça é quem vai decidir, ao fim, sobre a controvérsia nas fronteiras entre Guiana e Venezuela. Somos intransigentes quanto a isso e ao respeito ao direito internacional. Deixamos claro que não somos contrários a conversas e reuniões como pessoas e país responsáveis", afirmou.

Nesta sexta (8), em meio ao aumento da tensão na fronteira entre os dois países, o ministro da Defesa brasileiro, José Múcio Monteiro, disse que o Brasil não vai ser "instrumento de incidente diplomático", nessa crise. Na prática, a fala indica um entrave a eventuais ações terrestres da Venezuela contra a Guiana, uma vez que as forças militares de Maduro necessariamente teriam que passar pelo Brasil.

Após Maduro fazer um plebiscito no domingo passado (3) para consultar a população sobre a anexação da região, o Exército brasileiro antecipou o envio de 16 blindados para Boa Vista (RR). Na votação, 96% foram favoráveis à criação do estado Guiana Essequibo, de acordo com dados do regime.

O imbróglio entre os dois países remonta ao começo do século 19, quando a Venezuela tornou-se independente da Espanha. Na partilha da região ao norte do Brasil, um tratado entre Reino Unido e Holanda deu, em 1814, terras que eram de Amsterdã na margem esquerda do rio Essequibo.

Em 1831, elas comporiam dois terços da nova Guiana Inglesa, vizinha da Francesa, até hoje território de Paris, e da Holandesa, que se tornou o Suriname independente em 1975.

Os venezuelanos questionavam a divisão. Em 1899, um laudo deu posse definitiva da área para os britânicos. Isso perdurou até o fim dos anos 1940, quando recomeçou uma campanha de Caracas, agora baseada na acusação de que o acordo era fraudulento e fora influenciado por Londres.

Novas negociações ocorreram e, em 1966, foi firmado o Acordo de Genebra entre Londres e Caracas. Segundo ele, todos concordavam em discordar: a Venezuela firmava sua rejeição ao laudo de 1899 e o Reino Unido, sem fazer isso, aceitava discutir a questão fronteiriça até haver uma "decisão satisfatória".

Poucos meses depois, contudo, a Guiana tornou-se independente, e Essequibo representava dois terços de seu território. As negociações não prosperaram no prazo previsto de quatro anos, um novo protocolo foi firmado e o assunto ficou congelado por 12 anos.

Em 1982, a Venezuela por fim decidiu não ratificar o protocolo e o assunto acabou sendo levado à ONU, até hoje sem resolução. A discussão ficou adormecida até ganhar novo fôlego a partir de 2015, quando foram descobertos bilhões de barris de petróleo nas águas profundas da Guiana —parte delas justamente na disputada Essequibo.

Com AFP

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