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Guatemala vê tensão agravada entre denúncias de 'eleições nulas' e 'ruptura democrática'

Promotoria aponta irregularidades no pleito e é rebatida por Justiça Eleitoral e OEA, que acusa tentativa de golpe

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São Paulo

Em escalada retórica que aumenta a tensão na Guatemala após a disputa presidencial, o Ministério Público do país afirmou nesta sexta-feira (8) que a eleição deveria ser anulada devido a irregularidades encontradas no pleito vencido pelo esquerdista Bernardo Arévalo. Organizações internacionais acusam tentativa de golpe de Estado no país latino-americano cuja democracia é considerada frágil.

O presidente eleito da Guatemala, Bernardo Arévalo, em entrevista na Cidade da Guatemala
O presidente eleito da Guatemala, Bernardo Arévalo, em entrevista na Cidade da Guatemala - Johan Ordonez - 1º.set.23/AFP

Os procuradores apontaram o que seriam inconsistências no registro dos eleitores antes da eleição e nas atas físicas e resultados da votação no sistema digital. Segundo a promotora Leonor Morales, portanto, as eleições para presidente, vice-presidente e deputados deveriam ser consideradas nulas devido ao que chamou de anomalias no pleito. Ela acrescentou que todos os partidos seriam atingidos pela medida e disse que a investigação tem "caráter científico".

Mas organizações internacionais criticam a investigação, descrevendo-a como uma tentativa de impedir que Arévalo assuma o cargo em janeiro. Minutos após o pronunciamento de Morales, a Organização dos Estados Americanos (OEA) acusou a promotoria guatemalteca de tentar aplicar um "golpe de Estado".

O Tribunal Supremo Eleitoral (TSE) da Guatemala também reagiu com agilidade. Blanca Alfaro, a presidente da instância máxima jurídica, descartou nesta sexta repetir as eleições presidenciais. "Quero ratificar que os resultados estão validados, oficializados e são inalteráveis", disse em nota.

Promotores do Ministério Público já haviam declarado que tentariam anular a eleição vencida por Arévalo. O presidente eleito, por sua vez, vem denunciando o que chama de "ataque contra a democracia".

No mês passado, o Ministério Público anunciou que iria pedir a retirada da imunidade de Arévalo, e de sua vice, Karin Herrera, por suposta relação deles com a ocupação da Universidade de San Carlos (Usac), que durou de maio de 2022 a junho de 2023, e na qual teriam sido cometidos delitos. Segundo a Procuradoria, após a ocupação, a universidade teria sido convertida em plataforma política para candidatos do Movimento Semilla (Movimento Semente), partido do presidente eleito.

O Movimento Semilla tem origem no que alguns chamaram de "primavera guatemalteca", protestos contra a corrupção política no país, revelada por um órgão de investigação apoiado pela ONU.

Filho do primeiro presidente eleito em eleições transparentes na Guatemala, na década de 1940, Arévalo prometeu durante a corrida presidencial uma nova "primavera democrática" para o país, como ficou conhecido o período de dez anos que seu pai inaugurou.

O Semilla foi fundado em 2017 e surgiu após protestos que derrubaram em 2015 o então presidente Otto Pérez Molina, alvo de investigações da Cicig (Comissão Internacional contra a Impunidade na Guatemala), órgão independente apoiado pela ONU para apurar casos de corrupção no país.

A Cicig foi dissolvida em 2019, e seu fim levou a uma onda de perseguições contra aqueles que participaram do projeto.

Também em novembro o TSE inabilitou o partido Semilla em cumprimento a uma ordem emitida por um juiz em agosto devido a supostas irregularidades em sua inscrição. O partido já havia sido inabilitado em 28 de agosto pelo Registro de Cidadãos por ordem judicial, o que levou Arévalo a denunciar um plano de "golpe de Estado". No entanto, o TSE suspendeu temporariamente a inabilitação em 3 de setembro até que o processo eleitoral fosse formalmente encerrado em 31 de outubro.

Em nota, o governo brasileiro repudiou as declarações dos promotores sobre a anulação do pleito, além da solicitação para a retirada da imunidade de Arévalo. "Ao recordar que o recente anúncio se soma a outras arbitrariedades cometidas desde o período eleitoral, o governo brasileiro considera que as declarações e medidas anunciadas obstruem o andamento do processo democrático na Guatemala e ameaçam o exercício dos mandatos das autoridades legitimamente eleitas", diz o comunicado divulgado pelo Itamaraty.

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