Descrição de chapéu guerra israel-hamas líbano

Brasileira ferida no Líbano registrou à polícia agressão do marido quando vivia no interior de SP

Primo de Ahmed Aidibi, denunciado por Fatima Boustani, nega acusações e diz que se tratou de briga de casal

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São Paulo

A brasileira ferida em um ataque atribuído a Israel no sul do Líbano, Fatima Boustani, relatou em boletim de ocorrência uma suposta agressão de seu marido, Ahmed Aidibi, quando o casal ainda morava no interior de São Paulo, em setembro de 2023 —oito meses antes do bombardeio que atingiu a casa dela em meio à guerra no Oriente Médio.

Segundo o documento, ao qual a Folha teve acesso, Aidibi a agrediu na noite do dia 19 de setembro, durante uma briga interrompida por vizinhos que entraram na casa da família em Marília, a 400 quilômetros de São Paulo —eles teriam encontrado o marido tentado enforcar Boustani no quarto do casal, de acordo com o relato. A informação foi revelada pelo UOL.

Acervo pessoal
Fatima Boustani, 30, brasileira ferida em bombardeio no sul do Líbano - Acervo pessoal/Acervo pessoal

Segundo o boletim de ocorrência, Aidibi saiu do local em seguida, levando o celular de sua esposa e ainda o RNE (Registro Nacional de Estrangeiros) dela e de seus quatro filhos, além dos passaportes das crianças —Boustani nasceu no Líbano e obteve cidadania brasileira em janeiro deste ano.

Quatro dias depois, ela teria sido surpreendida com a visita de um amigo de seu marido, que levou os filhos para a casa do cunhado dela, em Itapevi, na Grande São Paulo, sem o seu consentimento, de acordo com o relato.

"Como forma de me punir, meu marido (...) embarcou para o Líbano (...) levando nossos filhos sem a minha autorização", diz o relato do documento. A viagem, que teria ocorrido na madrugada do dia 26 de setembro, foi o que motivou o registro do boletim.

Em condição de anonimato, um vizinho de Marília que presenciou a suposta agressão afirmou que não era a primeira vez que os moradores se preocupavam com o que acontecia dentro da casa. No dia 19 de setembro, ele trabalhava de casa quando ouviu os filhos do casal gritando por socorro na garagem.

Após entrar na residência vizinha e interromper a agressão, ele teria chamado a polícia enquanto sua mulher acudia Boustani com a ajuda de um aplicativo de tradução, já que ela não falava português. Até aquele momento, diz o vizinho, Boustani queria fazer a denúncia, mas foi desencorajada após um conhecido da família chegar ao local e conversar com ela.

Consultada pela reportagem, a Secretaria de Segurança Pública de São Paulo afirmou que o caso foi registrado como subtração de incapazes, mas acrescentou que investigações com a Polícia Federal revelaram que o pai tinha a autorização da mãe para fazer a viagem. "O caso foi arquivado por não haver a constatação de crime", diz a pasta em nota.

Um parente de Boustani, porém, afirma que ela autorizou por ter sido enganada pelo marido. Aidibi teria induzido a esposa a assinar um documento dizendo que o papel era referente ao processo de naturalização dela. Segundo o familiar, Boustani não lia nem falava português à época e, por isso, assinou a autorização de viagem sem saber do que se tratava.

Ainda de acordo com o parente de Boustani, Aidibi deixou os filhos com familiares no Líbano e viajou à África a trabalho. Em abril, ela teria voltado ao país do Oriente Médio para ficar com as crianças. A intenção era retornar ao Brasil posteriormente —plano que não se concretizou devido ao bombardeio.

Procurado pela reportagem, Aidibi não quis se manifestar, mas seu primo, Hussein Ezzddein, nega as acusações e afirma que não houve agressão —os dois discutiam naquele momento e ambos gritavam, segundo ele. "Os vizinhos entraram [na casa], mas era uma briga de casal", afirma.

Ezzddein também nega que o primo tenha enganado a esposa para assinar a autorização. "Eles combinaram de ela ficar no Brasil, e ele foi com as crianças para o Líbano", diz. Ainda segundo o parente de Aidibi, o casal se comunicava normalmente pelo celular até o momento do ataque. Desde então, ela teria parado de responder às mensagens do marido.

Sem entrar em detalhes, Ezzddein afirmou que seu primo estaria a caminho da Polícia Federal na manhã desta quinta-feira (13) para pedir esclarecimentos e que iria consultar um advogado para cuidar do caso.

Boustani ficou ferida após um ataque aéreo atingir a casa em que morava na cidade de Saddikine, no sul do Líbano, em 1º de junho. Naquele dia, Israel bombardeava instalações na região, palco de trocas de fogo quase diárias entre Tel Aviv e o Hezbollah, grupo extremista libanês que apoia o palestino Hamas.

Dias depois, as Forças Armadas israelenses disseram à Folha que haviam aberto uma investigação para apurar um possível "mau funcionamento técnico" em uma ou mais bombas usadas na ofensiva daquele dia, embora não tenham assumido a autoria do ataque que feriu a brasileira.

Boustani teve alta do hospital na última terça-feira (11), dez dias após o incidente, e agora está sob cuidados domésticos. Antes disso, ela havia sido transferida de um hospital em Tiro, cidade perto de Saddikine, para a capital, Beirute. De acordo com seu tio, Jihad Azzam, ela ainda precisará passar por outros procedimentos, incluindo uma cirurgia plástica.

Dois dos filhos de Boustani também foram atingidos pelos bombardeios. Zahraa, 10, passou por uma operação bem-sucedida na perna e chegou a ficar estável após ficar na UTI, mas agora precisará ser submetida a outra operação, segundo Azzam. Ali, 9, que havia sofrido ferimentos leves, foi liberado no começo da semana passada.

A reportagem tentou entrar em contato com Boustani, mas ela desistiu da entrevista após ser informada da nova cirurgia de sua filha, segundo um familiar.

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