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Morte de Fujimori aprofunda visão de que política do Peru é cheia de pontas soltas

Legado controverso do ditador divide população e não deve trazer novo fôlego à carreira política de seus filhos Keiko e Kenji

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Buenos Aires

A morte do ditador peruano Alberto Fujimori nesta quarta-feira (11), aos 86 anos e em decorrência de um câncer na língua, pegou os peruanos com algum tom de surpresa.

Havia os que acreditavam que Fujimori era um líder contra o narcotráfico, em parte porque ele ainda surfava na popularidade decorrente do fim da guerrilha rural e urbana dos anos 1970-1980. Acreditavam que ele poderia figurar como um dos candidatos à Presidência em 2026 ou eleger um substituto para tal.

Kenji Fujimori (ao fundo), filho do ex-ditador do Peru Alberto Fujimori, comparece ao velório do pai no Museo de la Nación, em Lima, capital do país - Gerardo Marin - 12.set.24/Reuters

"O que temos hoje é um Congresso ultraconservador, que inclusive mantém refém a débil presidente Dina Boluarte, nascida da esquerda, mas hoje comprometida com os principais grupos de interesse do país", diz à Folha Alberto Vergara, professor da Universidad del Pacífico. Para ele, a perspectiva é que a líder peruana siga até o fim do mandato amarrada a essa configuração, no qual o fujimorismo leva ligeira vantagem, embora seja incapaz de dar as cartas sozinho.

Na manhã desta quinta-feira (12), os noticiários peruanos deram espaço assimétrico ao que houve de bom ou de ruim nos anos Fujimori. As pessoas ouvidas pelas TVs locais ressaltaram como positivo o fim da guerrilha esquerdista Sendero Luminoso e a estabilização econômica, que vinha desorganizada e com hiperinflação descomunal.

Porém, os crimes contra a humanidade se fizeram lembrar. Foram eles, e os de corrupção, que colocaram Fujimori atrás das grades: esterilização compulsória de mulheres pobres, massacres de civis onde se pensava que havia guerrilhas, e o abuso de poder contra todos que tivessem pinta de subversivos.

Analistas ouvidos pela Folha afirmam que, para as eleições de 2026, alguns fatos devem se concretizar. Por exemplo, sob a bênção do fujimorismo, Boluarte e o Congresso, que se mostram mais atados uns aos outros, seguirão assim.

"Será que Keiko tem algo a acrescentar junto à seu eleitorado depois de três tentativas falidas [na disputa pela Presidência]? Não parece, tampouco há um aspecto de dinastia no legado de Fujimori", diz o jornalista e analista David Rivera.

"É por isso que é difícil dizer se Fujimori desagradou mais a esquerda do que a direita, ele deixou uma sensação de desesperança no país que resultou no que temos hoje: partidos de curto prazo, ligados a universidades corruptas, que permitiram centenas de negócios ilícitos ou a associações vinculadas ao puro narcotráfico", acrescenta.

Rivera aponta ainda que as pesquisas já vinham mostrando que tanto Keiko quanto Kenji, seu irmão, perdem fôlego no cenário político. "Os dois já passaram da idade de serem apadrinhados e até aqui não demonstraram outra carta que serem filhos de Fujimori. Não me parece suficiente para as eleições de 2026, onde devem-se apresentar mais de 50 candidatos."

Para o escritor Santiago Roncagliolo, Keiko e Kenji foram muito inteligentes ao utilizar os últimos anos de vida do pai como um balão de oxigênio para seu próprio partido no Congresso.

Vergara, da Universidad del Pacífico, aponta, no entanto, que o Legislativo peruano hoje tem muitas pontas soltas. "Os grupos hoje respondem a poderes, a universidades ligadas a cartéis, os políticos honestos saíram das funções. E é daí que concluímos que não se aprenderá nada para 2026", diz, em tom de desânimo.

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