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Alfredo Behrens: Gap histórico das escolas de negócios no Brasil

A cultura da obediência, do tipo cada macaco no seu galho, dificulta que quadros gerenciais se posicionem frente a empregadores que os administram apenas para vender

Os alunos Felipe Obino, Bruno Silveira, Isabela Pizzolatti, Laura Schirmer e Denis Yeh, apresentam a carteira magica que se acopla ao celular. Eles participaram de um programa da ONG Junior Achievement, que usa metodologia desenvolvida pela Universidade Harvard para ensinar empreendedorismo
Os alunos Felipe Obino, Bruno Silveira, Isabela Pizzolatti, Laura Schirmer e Denis Yeh, apresentam a carteira magica que se acopla ao celular. Eles participaram de um programa da ONG Junior Achievement, que usa metodologia desenvolvida pela Universidade Harvard para ensinar empreendedorismo - Eduardo Anizelli - 29.nov.17/Folhapress

Por que o Brasil segue na rabeira dos EUA há mais de um século? Não há boas escolas de negócios no Brasil? Certamente, as instituições de ensino são parte do problema, porque seus ensinamentos estão em desarmonia com a cultura brasileira de gestão, administração e liderança.

Desde que dom João fugiu de Lisboa para o Brasil,  nós nos comportamos como os atores da peça de Pirandello chamada "Seis atores em busca de um autor" . Temos o roteiro e atores preparados e ansiosos por protagonizar o espetáculo, mas não encontramos um teatro que nos aceite para encenar nossa peça.

Por que isso aconteceu? Foi durante a Guerra Fria que a maioria das escolas de negócios da América Latina ganhou vida. As aulas foram dadas em inglês, com livros didáticos no mesmo idioma. Os melhores estudantes (entre aqueles fluentes ​​em inglês) foram convidados para realizar estudos adicionais nos EUA, de onde voltaram ensinando o “mantra” administrativo americano.

A falta de sintonia do mantra americano com o Brasil fica evidente em exemplos como a recomendação de selecionar candidatos recrutados no mercado; embora nos EUA o nível de confiança em pessoas desconhecidas é quase sete vezes maior do que no Brasil.

Por isso, o contratado no mercado brasileiro será o melhor desconhecido e enfrentará uma resistência dos colegas maior do que o americano nos EUA, sacrificando a eficácia da equipe brasileira.

A desvantagem do Brasil perdura porque o “evangelho” da escola de negócios americana funciona para a pequena classe que fornece o quadro gerencial das corporações. A cultura da obediência que predomina no Brasil, do tipo “cada macaco no seu galho”, dificulta que esses quadros gerenciais se posicionem frente a empregadores que os administram apenas para vender.

É assim que essa pequena classe gerencial é privada dos desafios de promover inovações, de buscar novos mercados  ou —até mesmo— de criar oportunidades.  

Um exemplo óbvio foi a miopia dos gestores das corporações de bebidas sem álcool diante da oportunidade de adicionar sucos de frutas ao leite de soja  —que, uma década antes, um professor brasileiro mostrou como extrair.

Uma vez que a bebida alcançou êxito, apareceram meia dúzia de empresas copiando a ideia. Os empresários e os gestores brasileiros formados pelas escolas de negócios literalmente “dançaram” , e predominou um advogado, aliás, argentino. Em miúdos, essa é uma das histórias, mas há muitas outras.

Como podemos mudar? Tomando consciência das nossas responsabilidades para transformar as empresas em “auditórios” mais receptivos ao roteiro nacional. Esse enfoque é mais paternalista e mais gregário do que nos EUA.

Por isso, no Brasil precisamos gostar das pessoas com as quais trabalhamos, inclusive precisamos gostar do chefe. Somos obedientes, mas obedecemos melhor quando gostamos. Demoramos mais em confiar, por isso preferimos trabalhar com quem já conhecemos; somos competitivos sim, mas contra outras organizações —não contra os colegas. E por aí vai.

Em cada escola de samba ou em cada escola de negócios, há mais de mil atores à procura de um teatro, todos prestes a explodir, realizar, mas do nosso jeito. Porém, se continuarmos a discriminar mulheres, negros e segmentos economicamente mais carentes da população, se continuarmos a "erosionar" uma das nossas principais vantagem competitivas —trabalhar em equipes— não haverá Pirandello nem um “Deus brasileiro” que dê conta de fechar o hiato que há um século separa o PIB brasileiro do PIB americano.

Alfredo Behrens

É PhD pela Universidade de Cambridge, professor de liderança na FIA (Fundação Instituto de Administração) e coordena os encontros de executivos Winvest Cafés

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