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Governo muda atitude, mas 'corte' é ilusório

Embora bem-vindas, interrupção da verborragia de Lula e revisão de gastos não tornam política fiscal menos insustentável

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Fernando Haddad, ministro da Fazenda, e Luiz Inácio Lula da Silva (PT) - Gabriela Biló /Folhapress

O governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT) enfim decidiu fazer algo para estancar a escalada de incertezas acerca da política econômica, que se materializava por meio da alta do dólar e dos juros.

A providência mais óbvia a tomar cabia tão somente ao presidente da República —interromper a recente enxurrada de bravatas e diatribes contra o Banco Central, a política de juros, o mercado financeiro e as medidas sugeridas para conter gastos públicos.

Na quarta-feira (3), um Lula calculadamente comedido esquivou-se de uma pergunta sobre o BC e o dólar. "Eu agora vou conversar sobre feijão e arroz", disse, antes de discursar no lançamento do plano para a safra agrícola.

"Responsabilidade fiscal não é uma palavra, é um compromisso deste governo desde 2003. E a gente manterá ele à risca", foi a conclusão de seu pronunciamento.

Houve mais. No mesmo dia, o ministro Fernando Haddad, da Fazenda, declarou ter ouvido de Lula a determinação de que as regras orçamentárias para a contenção da dívida pública devem ser preservadas "a todo custo".

Isso significa, segundo Haddad, que o governo está disposto a bloquear despesas para cumprir a meta de reduzir o déficit do Tesouro para perto de zero neste ano.

Ademais, anunciou-se que análise técnica conduzida nos últimos 90 dias identificou despesas indevidas de R$ 25,9 bilhões em benefícios sociais, que serão "cortadas" do Orçamento do próximo ano.

A inflexão da administração petista produziu algum alívio imediato, também refletido nas cotações do dólar. Mitigam-se, ao menos por ora, os piores temores quanto às inclinações gastadoras e intervencionistas reveladas pela verborragia de Lula. O conjunto de anúncios, porém, é fragílimo.

Um contingenciamento emergencial de gastos será bem-vindo, mas neste momento as projeções do governo para receitas e despesas —e, portanto, para o cumprimento da meta fiscal— estão plenamente desacreditadas. Não parece provável, assim, que a medida se dará na dimensão necessária.

O "corte" prometido para 2025 não passa de uma reestimativa de custos, a ser verificada. O pente-fino nos benefícios é sempre salutar, porém equivalerá a enxugar gelo se não forem revistas as regras que impõem a alta contínua de desembolsos obrigatórios.

Não merecem maior consideração, por fim, as juras de responsabilidade do mandatário, desmentidas por outras declarações e, sobretudo, por atos. Lula, que instituiu uma regra fiscal cada vez mais percebida como insustentável, ainda governa como se desfrutasse da fartura circunstancial de recursos de seus primeiros dois mandatos.

editoriais@grupofolha.com.br

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