Brasilianista Frank McCann, especializado em militares, morre aos 82 nos EUA

Historiador americano escreveu sobre relação dos fardados com a política no Brasil

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São Paulo

Um dos principais brasilianistas dos Estados Unidos, o historiador Frank Daniel McCann, morreu na sexta (2) em Durham, New Hampshire, em decorrência de um derrame.

Ele tinha 82 anos e era professor emérito da Universidade de New Hampshire, onde lecionou de 1972 a 2017.

O historiador Frank McCann, especialista em militares brasileiros, em 1999
O historiador Frank McCann, especialista em militares brasileiros, em 1999 - Ricardo Bonalume Neto - 1º.ago.1999/Folhapress

McCann é autor de um estudo seminal sobre a formação das Forças Armadas do Brasil, "Soldados da Pátria - Uma História do Exército Brasileiro, 1889-1937" (ed. Companhia das Letras, 2004).

Na obra, ele esmiuçou a interconexão entre o desenvolvimento da identidade militar com a atuação política a partir do papel dos fardados no golpe que enterrou o Império e nas inúmeras crises e revoltas que marcaram a infância da República até a era Vargas.

Um tema mais do que atual, como a crise militar da semana passada evidencia.

"Ele apontou elementos fundamentais para entendermos a relação entre civis e militares, além de como os militares se envolveram na política. E o fez de uma maneira não apaixonada, mas analítica", afirmou Vinicius Mariano Carvalho, diretor do Brazil Institute do King's College de Londres e especialista em história militar.

Nascido em Lackawanna (Nova York), em 1960 ele se graduou em história.

Seu encontro com o Brasil ocorreu em 1965. Incentivado por um grupo de estudantes, com a brasileira Teresinha Souto Ward e húngaro George Fodor à frente, ele aceitou a primeria das quatro bolsas que ganharia da Fundação Fullbright e mudou para o Brasil com a mulher e as duas filhas pequenas.

Morou no Rio e depois voltou ao país em dezenas de viagens, na qual adquiriu conhecimento e gosto pela música popular, como o samba. Mas foi nos fardados que concentrou sua atenção acadêmica.

Escreveu "A Aliança Brasileiro-Americana, 1937-1945", livro no qual desenvolve a ideia de que os EUA menosprezaram o Brasil após a Segunda Guerra Mundial (1939-45).

Para McCann, Washington aproveitaram a relação com a ditadura de Getúlio Vargas e sua base aeronaval em Natal (RN) no conflito, mas depois preferiu dividir as atenções subcontinentais com a Argentina para que o Brasil não se tornasse hegemônico na América do Sul.

O livro também passa por um episódio pouco conhecido, no qual o Brasil, segundo McCann, foi convidado a integrar as forças de ocupação aliadas na Áustria após a guerra.

O livro ganhou um Prêmio Bernath e McCann seria feito comendador da Ordem do Rio Branco em 1987, além de receber do Exército a Medalha do Pacificador, em 1995.

Seu último trabalho finalizado, em 2018, voltou ao tema: "Brasil e Estados Unidos Durante e Depois da Segunda Guerra Mundial".

"Ele foi um precursores de uma historiografia militar crítica no Brasil, e não apenas apologética", diz Carvalho.

Em 2019, McCann se encontrou com o vice-presidente, general Hamilton Mourão, e lhe fez elogios em entrevistas subsequentes.

Já Jair Bolsonaro era visto, nas poucas vezes em que ele se expressou sobre o tema, como alguém que povoara seu governo de militares para tentar adquirir "uma estatura que ele não tem".

Ele também lamentava que a aproximação preconizada entre Brasil e EUA se desse no momento em que ambos os países eram governados por Bolsonaro e Donald Trump. Até aqui não se sabe se ele tomou conhecimento da crise militar da semana passada, pouco antes de sua morte.

Nesta segunda (5), o vice postou no Twitter uma homenagem ao americano. "Sua obra sobre o Exército Brasileiro e as relações Brasil-Estados Unidos são referências para o estudo da nossa história", escreveu.

McCain deixou a mulher Diane e as filhas Tibi e Kaydee, além de netos e outros parentes. Ele será enterrado com honras militares nesta terça (6) em Durham.

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