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Cúpula da segurança de PE recebeu alerta sobre excessos policiais dois dias antes de protesto contra Bolsonaro

Aviso foi dado pelo Ministério Público a três secretários do estado; ação policial violenta deixou dois feridos graves

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Recife

Dois dias antes da manifestação contra o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) no Recife, o Ministério Público de Pernambuco alertou o secretário de Defesa Social, Antônio de Pádua, sobre a necessidade de orientação do efetivo da Polícia Militar para evitar eventuais excessos no ato.

O protesto pacífico na capital pernambucana, ocorrido na manhã do sábado (29), foi encerrado violentamente pelos policiais do pelotão de choque com bombas de gás lacrimogêneo e tiros de balas de borracha. Dois homens que não estavam no protesto perderam a visão de um dos olhos.

Ensanguentado, Daniel Campelo, 51, leva às mãos ao olho esquerdo. Ele perdeu a visão de um olho pós ser atingido por um tiro de bala de borracha disparado durante as manifestações contra o presidente Jair Bolsonaro no Recife
Daniel Campelo, 51, perdeu a visão de um olho após ser atingido por um tiro de bala de borracha durante as manifestações contra Bolsonaro no último sábado (29) no Recife - Reuters

O alerta ao secretário foi feito pelo promotor de Justiça Westei Conde, titular da 7ª Promotoria da Cidadania da Capital, durante reunião virtual no dia 27 de maio sobre a intensificação na fiscalização das medidas restritivas de combate à pandemia.

Participavam do encontro, além do titular da SDS, os secretários de Saúde, André Longo, e de Justiça, Pedro Eurico.

A portaria que instaurou inquérito civil público para apurar violações de direitos humanos cometidas por policiais militares informa que o encontro foi convocado pela Procuradoria-Geral de Justiça.

“O excelentíssimo senhor secretário de Defesa Social se fez presente, tendo sido informado publicamente, naquela oportunidade, pela 7ª Promotoria de Justiça da realização do ato público do dia 29 de maio e da necessidade da devida orientação ao efetivo da PMPE, de sorte a evitar eventuais excessos”, escreveu o promotor Westei.

De acordo com o Ministério Público, mais de cem promotores de Justiça do agreste e zona da mata de Pernambuco participaram da reunião. O encontro virtual foi mediado pelo coordenador do Centro de Apoio Operacional às Promotorias de Justiça, Édipo Soares.

A 7ª Promotoria da Cidadania da Capital tem entre suas atribuições o controle externo da atividade policial.

Em nota, a Secretaria de Defesa Social afirmou que a orientação das forças de segurança para o acompanhamento de manifestação é sempre a de garantir a ordem e a tranquilidade com a proteção de vidas e a preservação da integridade das pessoas.

“Essa diretriz está no planejamento operacional da segurança em Pernambuco como um todo. Tanto que, cotidianamente, manifestações ocorrem no estado sem que haja violência ou feridos”, diz o comunicado.

A secretaria destacou que, em relação à manifestação do último sábado, no centro do Recife, a Corregedoria-Geral da SDS e a Polícia Civil estão investigando, com seriedade e isenção, a conduta policial adotada, buscando o esclarecimento dos fatos e a devida responsabilização, seja na esfera disciplinar ou criminal.

O Governo de Pernambuco, sob gestão Paulo Câmara (PSB), disse que a operação não foi autorizada. Até o momento, porém, não explicou quem deu a ordem para o ataque.

A cúpula da segurança pública em Pernambuco estava no centro de monitoramento de câmeras da Secretaria de Defesa Social no momento em que policiais militares atacaram a manifestação.

Os policiais militares do Batalhão de Choque começaram a atirar às 11h44 contra os manifestantes que seguiam de maneira ordeira por uma avenida do centro do Recife.

Imagens mostram policiais atirando nos manifestantes quase à queima-roupa. Não há registros de agressões por parte dos manifestantes contra a força policial.

O secretário de Justiça de Pernambuco, Pedro Eurico, afirmou em entrevista a uma emissora de televisão na manhã desta segunda-feira (31) que o governo estava monitorando a manifestação desde o seu início.

“Primeiro, nós acompanhamos a operação desde a praça do Derby [concentração do ato]. Não houve alteração. Na ponte Duarte Coelho, iniciou-se um tumulto que vai ser investigado”, disse.

Logo na saída do ato, policiais do pelotão de choque chegaram a se perfilar na Praça do Derby. Pouco tempo depois, foram desmobilizados e entraram em dois pequenos ônibus da Polícia Militar.

Os dois homens que perderam a visão de um olho após serem atingidos por tiros de bala de borracha disparados por policiais do pelotão de choque estão hospitalizados com quadro de saúde estável.

A vereadora Liana Cirne (PT) foi atacada com spray de pimenta após se identificar como parlamentar. Ela foi recebida pelo governador Paulo Câmara na tarde desta segunda.

Nas redes sociais, perfis não oficiais de batalhões da Polícia Militar comemoraram a ação.

Na tarde de sábado, Câmara disse que determinou a imediata apuração de responsabilidades. O oficial comandante da operação, além de quatro policiais envolvidos diretamente na agressão à vereadora Liana, foram afastados de suas funções.

Os nomes não foram divulgados. O secretário de Defesa Social, Antônio de Pádua, e o comandante da Polícia Militar de Pernambuco, Vanildo Neves de Albuquerque, não se pronunciaram sobre o episódio. Os dois seguem prestigiados pelo governador e permanecem no cargo.

O governo identificou o policial que disparou um tiro de bala de borracha no olho do adesivador Daniel Campelo da Silva, 51.

Ainda não foi identificado o policial que disparou contra o arrumador Jonas Correia de França, 29. Ambos tiveram lesões permanentes —Daniel, no olho esquerdo, e Jonas, no direito.

Um dia antes do ato, o Ministério Público de Pernambuco havia emitido uma recomendação de suspensão do protesto para evitar a disseminação do novo coronavírus. A Promotoria expediu recomendações semelhantes contra aglomerações em manifestações de apoio a Bolsonaro.

Governo Bolsonaro faz pesquisa com policiais

O governo Jair Bolsonaro está realizando, desde o mês passado, uma pesquisa socioeconômica com profissionais da segurança pública de todo o país.

O levantamento inclui diversas categorias, como policiais federais, policiais rodoviários federais, policiais civis e militares, policiais penais (antes agentes penitenciários) e bombeiros. São mais de 650 mil trabalhadores.

De acordo com os organizadores do estudo, 135 instituições foram procuradas pela Senasp (Secretaria Nacional de Segurança Pública), área do Ministério da Justiça, sobre a pesquisa.

A coleta de informações é feita por meio de formulário acessado através de link enviado por email às pessoas que se prontificaram a participar.

Os dados serão armazenados em uma plataforma desenvolvida pela Senasp em parceria com a Universidade de Brasília, parceira do projeto.

Em nota enviada à Folha, o Ministério da Justiça disse que a pesquisa tem como objetivo “levantar informações sobre saúde, segurança, valorização e qualidade de vida dos profissionais de segurança pública e defesa social de todo o país”.

“A partir dela, será possível construir políticas públicas baseadas em evidências para valorizar e dar mais qualidade de vida aos profissionais integrantes do Sistema Único de Segurança Pública.”

A pasta informou ainda que o levantamento se encontra em fase de sensibilização, com envio de email para mais de 400 mil endereços eletrônicos cadastrados na plataforma.

Colaborou Marcelo Rocha, de Brasília

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