Tarcísio terá Orçamento maior, mas precisará lidar com cortes e promessas de Rodrigo

Governador eleito de SP deve ter R$ 30 bilhões para investir e enfrentará gargalos

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São Paulo

A primeira tarefa da equipe de transição que o governador eleito Tarcísio de Freitas (Republicanos) anunciará nesta segunda-feira (21) é preparar um aditivo da Lei Orçamentária de 2023 para lidar com as heranças do atual governador Rodrigo Garcia (PSDB).

Por um lado, o tucano deixou seu sucessor em situação confortável ao prever cerca de R$ 30 bilhões para investimentos.

Por outro, desfez uma série de medidas de ajuste fiscal da sua própria gestão, gerando novos gastos. Sobrará para Tarcísio honrar promessas de campanha de Rodrigo e convênios com prefeitos no interior.

Rodrigo Garcia (PSDB) e Tarcísio de Freitas (Republicanos) na primeira reunião para iniciar a transição de governo, no Palácio dos Bandeirantes - Rubens Cavallari - 17.nov.22/Folhapress

De acordo com auxiliares de Tarcísio, a equipe de transição, liderada pelo ex-vice-governador Guilherme Afif (PSD), tem até o fim do mês para listar as mudanças que quer implementar no Orçamento e deve apresentar um aditivo à Assembleia Legislativa até a primeira semana de dezembro —o que daria tempo para a aprovação no plenário. Ainda não há um relator designado para a matéria.

O cenário é favorável para Tarcísio, já que Rodrigo turbinou o Orçamento acreditando que ele mesmo, reeleito, iria executá-lo no ano que vem, mas o PSDB, que vencia no estado desde 1994, sofreu uma derrota histórica.

Tarcísio terá um Orçamento com um crescimento de cerca de 5% já descontada a inflação —ele passará de R$ 305 bilhões em receitas previstas em 2022 para R$ 339 bilhões em 2023.

De imediato, Tarcísio terá que lidar com o efeito em cascata nos salários da elite do funcionalismo caso a Assembleia aprove um projeto que aumenta em 50% o salário do governador —e, assim, amplia o teto para os servidores. O impacto é de R$ 1,5 bilhão ao ano, segundo Rodrigo, e isso não está previsto no Orçamento —teria que ser acrescentado na transição.

A proposta tem o apoio das bases de Tarcísio e de Rodrigo, além de parte da oposição, e deve ser votada na semana que vem. Na quinta-feira (17), na primeira reunião com Rodrigo para tratar da transição, Tarcísio deu apoio à aprovação da medida.

"Foi feito um exercício por parte da transição de adaptar nosso plano de governo ao Orçamento atual. Então uma das primeiras tarefas da transição vai ser o ajuste do Orçamento", disse Tarcísio, que promete mudança sem ruptura.

O projeto de Lei Orçamentária (PLOA) tampouco prevê a revogação, que foi prometida por Rodrigo na campanha e sancionada por ele após a eleição, da contribuição previdenciária de aposentados e pensionistas que ganham abaixo do teto do INSS.

O impacto anual é de R$ 2 bilhões. "A medida não está prevista, portanto deverá ser proposto um ajuste ao PLOA 2023, a ser confirmado durante o processo de transição", afirma em nota a Secretaria de Orçamento e Gestão.

O chamado confisco dos aposentados faz parte de um pacote de maldades promovido por Doria e Rodrigo durante a gestão, que gerou reação negativa e que o governador prometeu, na campanha, rever em parte —o que amplia despesas e diminui receitas para os próximos anos, gerando um problema para Tarcísio.

Mesmo após a derrota nas urnas, Rodrigo retomou a gratuidade no transporte para pessoas maiores de 60 anos (desde que comprovada a renda baixa), algo que ele havia prometido. Essa medida está prevista no PLOA, mas gera um gasto de R$ 112 milhões para o próximo ano.

A elevação da gratuidade apenas para maiores de 65 anos e o confisco dos aposentados foram medidas tomadas no âmbito da reforma de 2020, quando o governo estimava um rombo nas contas públicas e precisava de caixa para lidar com a pandemia.

Isenções de ICMS que foram suspensas em 2020, levando a protestos contra Doria, também voltam a valer em 2023, o que significa R$ 6 bilhões a menos para Tarcísio.

Por isso, a maior preocupação para os aliados de Tarcísio é mapear se, de fato, há R$ 30 bilhões reservados para investimentos, o que seria um patamar mais elevado do que o praticado por João Doria (2019-2022) e Geraldo Alckmin (2015-2018), ou se outros gastos não previstos ainda vão aparecer.

"Estamos estudando mais a fundo e checando se haverá esse valor, se não há restos a pagar ou mais despesas com convênios não empenhados", diz o vice-governador eleito Felicio Ramuth (PSD) à Folha.

Segundo a nota da Secretaria de Orçamento e Gestão, a equipe de transição pode remanejar o Orçamento, mas alguns gastos são engessados, como "os mínimos constitucionais (em Saúde e Educação, incluindo universidades), manutenção da folha de pagamento de ativos, inativos e pensionistas do Poder Executivo, universidades e outros Poderes, pagamento do serviço da dívida, precatórios, além de despesas de custeio e investimentos cujos contratos já estão firmados e em andamento".

"São Paulo termina no azul, com todos os contratos em andamento, há recursos empenhados. O governo fez os ajustes necessários e entrega a gestão com uma capacidade ímpar de investimento", diz Marcos Penido, secretário que comanda a transição pelo lado de Rodrigo.

A equipe de Tarcísio avalia se será possível implementar já no primeiro ano duas propostas sociais que teriam que figurar no Orçamento de 2023. A primeira é que o estado dê bolsas de trabalho a jovens em micro e pequenas empresas. A segunda é pagar a 1,2 milhão de estudantes do ensino médio R$ 120 por 12 meses para combater a evasão escolar.

Hoje uma das ações do Bolsa do Povo, principal programa social de Doria/Rodrigo, é um auxílio de R$ 1.000 por ano para cerca de 300 mil estudantes. Embora Tarcísio queira expandir as bolsas, o Orçamento enviado por Rodrigo à Assembleia prevê que seja gasto o mesmo valor deste ano.

Um estudo do Orçamento feito pelo gabinete do deputado estadual Paulo Fiorilo (PT), de oposição a Rodrigo e Tarcísio, mostra que, no total, as despesas com o Bolsa do Povo terão um aumento real de apenas 2,1% entre 2022 e 2023. Porém, há cortes previstos em ações de auxílio aluguel e em programas voltados a jovens e idosos.

Fiorilo aponta problemas em cortes relacionados à saúde. Entre eles, está a extinção da Sucen (Superintendência de Controle a Endemias), o que fez o governo Rodrigo excluir a previsão de recursos para o combate a endemias.

O estudo também aponta perdas na produção de medicamentos pela Furp (Fundação para o Remédio Popular) e o subfinanciamento do Iamspe (Instituto de Assistência Médica ao Servidor Público Estadual).

Fiorilo sintetiza dizendo que Tarcísio herda um estado com muitos recursos, mas com problemas a resolver. "O governador eleito precisa dizer o que quer com o Orçamento. Até agora não disse. Agora, o tempo está ficando curto."

Tarcísio ainda prometeu honrar convênios feitos por Rodrigo com prefeitos do interior —boa parte deles apoiou o governador no primeiro turno e migrou para o bolsonarista no segundo.

Na tentativa de se reeleger, além dos convênios, Rodrigo apostou em diversas obras que devem seguir no ano que vem. Neste ano de eleição, a execução do Orçamento já supera em R$ 18 bilhões o que foi vislumbrado.

Só a Secretaria de Logística e Transportes deve gastar R$ 3 bilhões a mais do que o planejado, chegando a R$ 12,1 bilhões. A pasta é área de influência do presidente da Câmara Municipal de São Paulo, Milton Leite (União Brasil), aliado de Rodrigo que apoiou Tarcísio no segundo turno e quer manter seu domínio na máquina estatal.

Após a publicação da reportagem, a assessoria do governador Rodrigo afirmou que os outros candidatos também prometeram o fim do confisco e a retomada da gratuidade do transporte para maiores de 60 anos.

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