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Cadeirada em Marçal vira 'cai-cai' de Neymar e municia desafetos da direita

Reação do candidato do PRTB após ataque de Datena em debate é vista como exagerada

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São Paulo

Se Donald Trump e Jair Bolsonaro instrumentalizaram atentados que por pouco não lhe custaram a vida para extrair dividendos políticos, por que não ele?

Pablo Marçal (PRTB) tenta surfar na mesma onda após ser atacado com uma cadeira por José Luiz Datena (PSDB) no debate entre candidatos a prefeito de São Paulo. Mas há boas chances de levar um caixote eleitoral se insistir nessa narrativa.

Claro que cautela nunca é demais ao avaliar um cenário dado a reviravoltas mil. Basta lembrar que quase ninguém tomava Marçal como competitivo poucas semanas atrás, e de repente ele disputava a liderança com Ricardo Nunes (MDB) e Guilherme Boulos (PSOL). O impacto da cadeirada na TV Cultura deve ficar mais claro ao longo da semana, com nova rodada de pesquisas de intenção de voto.

Pablo Marçal (PRTB) posta foto em leito de hospital após ser agredido com cadeirada por José Luiz Datena (PSDB) durante debate na TV Cultura neste domingo (15)
Pablo Marçal (PRTB) posta foto em leito de hospital após ser agredido com cadeirada por José Luiz Datena (PSDB) durante debate na TV Cultura neste domingo (15) - Instagram @pablomarcalporsp

Mas já dá para dizer que, ao menos em parte da direita, a versão de Marçal não colou. Atores importantes para esse eleitorado concordam que Datena passou e muito do ponto, mas também pintam o nome do PRTB como um Neymar no gramado, forçando quedas para se fazer de vítima.

E buscam grudar nele a imagem do valentão que achava que tudo podia, mas foi lá e levou um pau de quem era alvo de seu bullying. Ficou a sensação de que chutou cachorro morto ao mirar num Datena já combalido eleitoralmente. Não é fácil simpatizar com esse tipo.

O deputado Nikolas Ferreira (PL-MG) foi um dos que compartilharam memes caçoando de Marçal, como a reconstituição da agressão de domingo (15), agora com efeito sonoro do programa do Ratinho.

Também circula um vídeo do humorista Marcelo Marrom pedindo o dinheiro de volta após se sentir enganado pelo autodenominado ex-coach. Pura tiração de sarro: o mesmo vendedor de cursos que ensinam a levar a melhor em embates corporais com tubarões e onças apanhou de "um senhorzinho gordinho de cabelo branco", zomba.

Já havia, é verdade, uma turma à procura de motivos para tripudiar o candidato do PRTB, que chegou como tufão no campo conservador. Marçal avançou sobre eleitores bolsonaristas e, sem pedir permissão aos donos da bola, agiu como se o jogo já estivesse ganho. Debochou do pastor Silas Malafaia, xingou filho de Bolsonaro e sugeriu que o ex-presidente que tanto questionava o tal "sistema" agora se curvara a ele.

Deixou vários líderes cabreiros, clã Bolsonaro incluso, ao deslanchar na campanha à revelia do desdém da cúpula bolsonarista. Poucos se arriscavam a criticá-lo abertamente, com medo de represália na base. A disposição para comprar briga aumentou após a bravata algo messiânica no 7 de Setembro, quando Marçal deu a entender que o povo estava com ele.

Depois, pesquisas revelaram que ele havia estacionado ou, pior, recuado na preferência do paulistano —possivelmente, reflexos do latifúndio de tempo de Nunes na propaganda eleitoral, mas também do confronto com personagens que tiveram poder de fogo subestimado por ele, como Malafaia (que o chamou de "psicopata") e o próprio Bolsonaro ("arregão").

A surra na TV Cultura, e como ele lidou com ela, deram munição ao pessoal que já estava com o dito ex-coach entalado na garganta. "Nós repudiamos o ato de Datena", diz Malafaia. Mas vá lá: "Marçal é um lacrador, tenta o todo tempo atingir a fraqueza dos adversários para o desequilíbrio emocional. [...] E depois ele vai usar isso. Como ele põe imediatamente na rede social se comparando à tentativa de assassinato de Trump e Bolsonaro? Isso é coisa de doente mental".

Na mesma noite do ataque, sua equipe publicou uma montagem com o tiro que quase fulminou o americano, a facada que o ex-presidente recebeu em 2018 e a cadeirada que atingiu o candidato a prefeito. O comentário mais curtido em outro post, que o mostra de máscara de oxigênio na ambulância: "Tá parecendo eu fingindo pra minha mãe só pra faltar aula". Foi feito por um pastor, por sinal.

Não que os escudeiros de Marçal estejam dormindo no ponto. Quando o jornalista Paulo Figueiredo, neto do último presidente da ditadura militar brasileira, afirmou que ele se esquivou de Datena com a "destreza de um bicho-preguiça", seguidores o criticaram pelo "comentário nada a ver" de quem estaria validando "agressão física" para um "desafeto político".

Para Renato Meirelles, do Instituto Locomotiva, os próximos dias definirão se a cadeirada estará para Marçal como a bolinha de papel esteve para José Serra em 2010 —o então presidenciável tucano tratou como bigorna o que adversários afirmaram ser apenas de um montinho de celulose arremessado em sua direção. "Será a guerra de narrativas. Ele conseguiu voltar a chamar a atenção e ser o assunto da eleição, mas é difícil colar que um cara que enfrenta tubarões apanhou de um idoso."

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