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Livro de Elif Batuman é uma crônica sobre literatura russa
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MANOEL DA COSTA PINTO
COLUNISTA DA sãopaulo
Com o subtítulo "Aventuras com os Livros Russos e seus Leitores", o livro "Os Possessos", da norte-americana de origem turca Elif Batuman trata de seus anos como estudante de literatura na Universidade de Stanford, na Califórnia.
À primeira vista, nada parece menos "aventuresco" do que o cotidiano de um campus universitário, que poderia render, na melhor das hipóteses, uma boa tese e, na pior, um blog ou uma página no Facebook.
Muhsin Akgün/Divulgação |
A autora americana de origem turca Elif Batuman escreveu sobre a sua passagem pela Universidade de Stanford |
Batuman pinça elementos desses registros díspares (teoria literária e banalidade confessional) para compor um catálogo de ninharias acadêmicas, satirizando oficinas
de escrita criativa e o tédio por trás da hiperespecialização erudita.
Entre andanças que a levam do Uzbequistão a São Petersburgo, ela descreve como vasculhou arquivos à cata de detalhes ínfimos sobre a vida de Isaac Bábel ou como, durante congresso sobre Tolstói na sua mítica propriedade de Iasnaia Poliana, um "scholar" lunático mergulhou no riacho, hoje lodacento, em que o escritor se banhava com Tchékhov.
O tom debochado põe em primeiro plano essa excêntrica devoção aos escritores, mas ninguém frequenta impunemente um curso em que lecionam gigantes como Joseph Frank (biógrafo de Dostoiévski) ou o ensaísta francês René Girard.
No capítulo que dá nome ao livro (intencionalmente extraído de uma tradução equivocada de "Os Demônios", de Dostoiévski), Batuman embarca na teoria girardinana do "desejo mimético": ao desejarmos, não estamos cobiçando algo, mas imitando o desejo de outrem, querendo "ser o outro".
O sedutor Matej (colega de Batuman que incorpora o niilismo do Stavróguin de "Os Demônios") é a prova de que os "possuídos" pela literatura russa não fazem outra coisa senão reproduzir, no âmbito aparentemente ridículo da obsessão por autores e livros, a possessão demoníaca pela qual os escritores russos mimetizaram nossas paixões.
Nessa espiral em que imitamos personagens que nos imitam, Elif Batuman faz uma crônica deliciosa, despretensiosamente erudita, de como a literatura ainda cala fundo na vida real.
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