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Threads é um retorno aos primórdios empolgantes do Twitter

O lançamento da rede social de Mark Zuckerberg como rival da plataforma de Elon Musk provoca repercussão animada online

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Tim Bradshaw
Londres

Parece que estamos em 2006 de novo. Uma nova rede social pôs fogo na internet, com comentários e discussões.

Mais que tudo, o lançamento do Threads, da Meta, na quinta-feira (6), é uma viagem nostálgica para aqueles de nós que nos inscrevemos no Twitter já em seus primeiros dias de existência. É uma emoção que o spin-off do Instagram se propõe intencionalmente a suscitar, posicionando-se como o Twitter, mas sem spam, assédio ou Elon Musk.

Em questão de horas depois de lançado, mais de 10 milhões de pessoas já haviam aberto contas no Thread, graças em grande medida à possibilidade de importar seus amigos e seguidores do Instagram. Minha própria conta no Instagram (particular, um tanto relegada ao segundo plano) é mais pessoal do que a autopromoção profissional que funciona melhor no Twitter, mas, graças a ela, meu feed no Threads foi povoado instantaneamente por rostos conhecidos.

Logo do Threads e tela do app, em ilustração - Dado Ruvic/Reuters

Essas pessoas não chegam a constituir uma amostra representativa da humanidade: são sobretudo outros jornalistas, pessoal de startups e geeks. Mas muitos pareciam altamente energizados com a oportunidade de um novo começo. Eu senti mais ou menos a mesma coisa, apesar de lamentar muitíssimo ser obrigado a deixar meu identificador @tim para trás, no Twitter, já que o Threads adota por padrão o nome do usuário no Instagram. (Teria o Financial Times contratado um repórter novato em 2008 se eu fosse meramente @timbradshaw? Provavelmente não.)

Esse soco no meu ego foi compensado pela injeção de dopamina (além de alertas constantes no app) que recebi por ter acumulado algumas centenas de seguidores nas primeiras horas depois de entrar para o Threads.

Essa rede instantânea, somada a um design sólido, embora pouco especial, que se assemelha suficientemente ao Twitter para evitar qualquer tipo de curva de aprendizagem, vai permitir que a Meta ultrapasse facilmente outros aplicativos que quiseram se alçar em rivais do Twitter, como Mastodon, Bluesky ou Post, que parecem desajeitados em comparação com o Threads.

A infraestrutura técnica da Meta deve ser suficientemente confiável para evitar o tipo de bugs e panes que têm atingido o Twitter e seus rivais menores. Mas tive alguns problemas com carregamento, quando milhões de usuários correram simultaneamente para experimentar a última novidade. Ainda é cedo para avaliar a outra vantagem que a Meta tem em relação ao Twitter –um sistema mais robusto para sufocar bots e combater trolls--, mas o recurso de ocultar respostas contendo palavras ofensivas ou emojis indesejados é um bom começo.

O resto é tudo coisa conhecida: postagens ágeis (com limite de 500 caracteres), likes, respostas e repostagens, todos presentes e corretos. Na grande tradição dos muitos imitadores do Facebook, o aplicativo é funcional, embora pouco espetacular. A ausência de anúncios dificilmente deve continuar por muito tempo, mas por enquanto, pelo menos, ajuda a fazer do Threads um lugar mais agradável que o Twitter.

Porém, se o Threads pega emprestado o que o Twitter tem de melhor, ele também ostenta um dos piores recursos do Instagram: uma timeline algorítmica que insere postagens de pessoas que não conheço, com base em alguma métrica insondável de "engajamento".

Addam Mosseri, presidente do Instagram e agora do Threads, diz que a capacidade de ver postagens apenas de pessoas que o usuário segue "está na lista", mas a opção de lançar o aplicativo sem ela desagradou a muitas pessoas no primeiro dia. "O mesmo velho Zuck, o mesmo velho Instagram, os mesmos velhos truques para crescer, a mesma merda de sempre", queixou-se Om Malik, blogger de tecnologia baseado em San Francisco que virou capitalista de investimentos.

As timelines algorítmicas são um desses recursos que alguns usuários dizem odiar, mas que as plataformas sociais insistem que a maioria das pessoas gosta. O sucesso do TikTok, cujo feed é puramente algorítmico, corrobora a segunda afirmação. Mas, se os mais entusiasmados primeiros usuários do Thread espelharem os do Twitter, Mosseri talvez faça bem em incluir uma opção alternativa em sua lista de tarefas prioritárias a cumprir.

Deixando essa discussão de lado, o fato de tantos fãs iniciais do Twitter estarem aplaudindo o Threads é um tanto irônico, considerando por quanto tempo a empresa mãe do Facebook foi vista como o império do mal e o Twitter como o pequeno rebelde ousado.

O Twitter foi um de muitos experimentos lançados na primeira década deste século que testou quanto as pessoas comuns poderiam ser persuadidas a compartilhar a seu respeito online. Houve apps dedicados à partilha de fotos de culinária (Foodspotting) e notícias de Wall Street (StockTwits). Algumas startups muito hypadas, como o aplicativo localizador Foursquare, desapareceram; outros, incluindo YouTube, Tumblr, Friendfeed e Instagram, foram comprados pelo que hoje chamamos de Big Tech.

A partir daquela explosão cambriana da "Web 2.0", apenas o Twitter –não obstante um modelo econômico subdesenvolvido e a porta giratória de sua direção--, conseguiu chegar até a etapa de oferta pública inicial, em 2012, como empresa independente. Quando Elon Musk, uma das pessoas mais ricas do mundo, comprou o Twitter, Mark Zuckerberg pôde bancar o azarão outra vez –postura que eu desconfio que tenha por objetivo motivar os funcionários da Meta, desgastados após um ano de cortes brutais.

A questão maior é até onde a nostalgia dos "bons velhos tempos" das redes sociais, reembalada e revendida por uma corporação enorme, poderá levar o Threads. Em uma cultura cada vez mais visual, quantas pessoas que não são jornalistas ou políticos querem uma plataforma social baseada principalmente em texto?

O empurrão dado pela toxicidade do Twitter na era de Musk e a atração social do Instagram podem ser o bastante para fazer o Threads ficar maior que o Twitter em pouco tempo. Quanto tempo esses milhões de usuários vão permanecer vai indicar se precisamos de algo que mate o Twitter ou se podemos simplesmente deixar que morra por conta própria.

Tradução de Clara Allain

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