Petar oferece aventura raiz com água, lama e vistas monumentais

Parque estadual na região mais pobre de SP ressignifica décadas de isolamento apostando no turismo sustentável

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Caverna Temimina, no Petar (Parque Estadual Turístico do Alto Ribeira)

Caverna Temimina, no Petar (Parque Estadual Turístico do Alto Ribeira) Projeto Luzes na Escuridão

Iporanga (SP)

Ao contar por aí que você está planejando ir ao Petar, duas reações são muito comuns: ou as pessoas não fazem ideia do que se trata, ou dizem: "Legal. Eu já fui lá em uma excursão da escola!".

A dicotomia resume bem o senso comum sobre o Parque Estadual Turístico do Alto Ribeira, uma área de preservação ambiental criada em 1958, reconhecida como Patrimônio Mundial pela Unesco e entremeada por centenas de cavernas.

São cenários monumentais, esculpidos ao longo de milhares de anos e que, de uma forma igualmente bruta e bela, ajudam a contar a história da região (veja o quadro ao abaixo).

"O movimento das placas tectônicas pressionou essas rochas calcárias, originando uma grande cadeia de montanhas que foi erodida pela água, formando as cavernas", explica Paulo Boggiani, professor do Instituto de Geociências da Universidade de São Paulo. "Esse terreno acidentado também deixou a região meio isolada, o que lhe deu características culturais peculiares."

Apesar de estar no meio do caminho até Curitiba, o Vale do Ribeira é a região mais pobre de São Paulo, com níveis bem abaixo da média do estado. No bairro da Serra, em Iporanga, principal porta de entrada para o Petar, a internet banda larga só chegou em 2020. Não à toa, tudo por lá ainda é muito simples.

Mas hoje, sob a ótica da sustentabilidade, as décadas de isolamento estão ficando para trás. O Vale do Ribeira guarda 61% do um quarto de mata atlântica que resta no Brasil.

O ponto de virada foi nos anos 1990, quando o turismo de natureza foi impulsionado pela Rio-92, a conferência das Nações Unidas sobre meio ambiente realizada no Rio de Janeiro. A partir dali, as pouquíssimas hospedarias que abrigavam geólogos e universitários passaram a receber também excursões do ensino básico e algumas famílias mais aventureiras.

Nessa época, lanternas eram um luxo distante. O passeio pelas cavernas era iluminado por carbureteiras à combustão, liberando partículas que escureciam as formações —dano que até hoje pode ser visto em algumas cavernas. Alguns aproveitavam o acesso livre para levar um pedaço das estalagmites e estalactites, destruindo registros históricos de milhares de anos.

Monitor ambiental Coninho guia repórter da Folha na íngreme e desafiadora trilha da caverna Temimina, a mais encantadora caverna do Petar (Parque Estadual Turístico do Alto Ribeira)
Monitor ambiental Coninho guia repórter da Folha na íngreme e desafiadora trilha da caverna Temimina, a mais encantadora caverna do Petar (Parque Estadual Turístico do Alto Ribeira) - Acervo pessoal

Por isso, desde 2008 a visitação só é permitida com acompanhamento de guias locais, que antes sobreviviam da extração do palmito-juçara, palmeira que corre risco de extinção pela exploração indiscriminada. Nos anos 1980, a prática foi proibida, mas seguiu acontecendo de maneira ilegal até que o turismo começou a florescer, transformando os palmiteiros em guias.

Com o turismo de natureza ganhando nova força no pós-pandemia, novos atrativos foram surgindo, incluindo hospedagem mais sofisticadas (como os glampings), rapel em cavernas e cachoeiras dentro e fora do parque, visitações noturnas, observações de estrelas e até de cogumelos que brilham no escuro.

Uma diária de um guia custa em média R$ 150 e pode ser dividida por um grupo. Também é preciso comprar ingressos (R$ 19) com antecedência e alugar capacete, lanterna e colete salva-vidas (o kit custa R$ 30 por dia).

Sim, inevitavelmente você vai se molhar nas cavernas (a água pode chegar até o peito, a depender da época) e, no dia seguinte, vestir a mesma roupa e calçar o mesmo tênis ainda molhados. É estranho, mas logo ele vai molhar de novo.

Apesar de parecerem práticas, papetes são proibidas. Antes de ir, inclusive, vale passar em uma loja esportiva e garantir ao menos duas trocas de roupa dry fit, que secam facilmente, e uma case impermeável para o celular.

O Petar possui quatro núcleos. O principal deles, o Santana, vizinho ao bairro da Serra, tem cinco cavernas, e o Ouro Grosso, o menor, apenas duas —uma delas, a do Alambari, é uma comprida piscina subterrânea que você atravessa com água no pescoço.

Nos outros dois núcleos ficam os atrativos mais desafiadores. No Casa de Pedra, a 10 km de Iporanga, é possível visitar a caverna homônima, com o recorde de maior pórtico do mundo: 215 metros de altura. A visitação interna está suspensa, mas dá para chegar na entrada (três horas de trilha) e também a um mirante.

Já no Núcleo Caboclos fica a Temimina, uma caverna monumental, que resume a experiência do parque —para quem tiver preparo físico. Para chegar lá, é preciso acordar cedo e fazer uma pequena viagem de carro, já que a entrada do núcleo fica a 75 km de Iporanga. Entre ida e volta, a trilha até a caverna tem 9 km de pura lama, em um relevo acidentado que exige equilíbrio.

Como recompensa, a Temimina oferece vistas emocionantes, mergulhos subterrâneos, salões gigantescos (mesmo embaixo da terra) e formações únicas, como um espeleotema que lembra um enorme chuveiro. A depender do calor e da de lama,

Espeleotema na forma de um chuveiro natural, dentro de um dos enormes salões da caverna Temimina, no Petar (Parque Estadual Turístico do Alto Ribeira), em SP
Espeleotema na forma de um chuveiro natural, dentro de um dos enormes salões da caverna Temimina, no Petar (Parque Estadual Turístico do Alto Ribeira), em SP - Ricardo Martinelli /Projeto Luzes na Escuridão

Fora do Petar, mas ainda no bairro da Serra, a caverna do Lago Suspenso (R$ 260) também oferece rapel. A partir de um pequeno buraco em meio às pedras da trilha, duas grandes descidas levam a um lago profundo, garantindo ótimas fotos e um nado no escuro.

Quem quiser experimentar o mesmo deslumbre da Temimina, sem todo o esforço que ela exige, pode se jogar na Caverna do Diabo, no parque vizinho, a 40 km quilômetros de Iporanga.

Nela, é possível explorar bons metros caverna adentro, bem iluminados, garantindo as melhores fotos da viagem —o ingresso custa R$ 19 e o guia, R$ 22 por pessoa. Em seguida, um passeio guiado pago desce de rapel nas profundezas da caverna, com direito a banho em uma cachoeira "no centro da terra". Custa R$ 366, mas já inclui o guia, equipamentos e até um chazinho para aquecer após o mergulho.

O jornalista viajou a convite do Visite Vale do Ribeira

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