Descrição de chapéu África

Fluxo de turistas entre Brasil e África cresce, mas novos voos ficam na promessa

País tem acordos com 32 nações no continente para viabilizar rotas, mas isso não garante que eles aconteçam

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Vinicius Assis
Rio de Janeiro

O turismo ligado à cultura afro em Salvador é o foco do trabalho da guia baiana Sayuri Koshima, que, além de receber clientes de várias partes do mundo, costuma viajar para o exterior anualmente nas férias. Já foi quatro vezes ao continente africano. Ela diz que escolhe o destino pelo tempo de voo, além do custo e da menor burocracia para conseguir visto.

Afirma que voos diretos costumam ter prioridade, mas nem sempre os encontra. O último destino foi o Senegal, mas para chegar teve de ficar cerca de oito horas em Lisboa em uma conexão. "Sou uma profissional liberal. Um dia a mais que eu gasto num aeroporto fazendo conexão desnecessária é um dia de trabalho que perco", diz.

Passageira embarca em avião da South African Airways (SAA), que recentemente retomou os voos entre o Brasil e a África do Sul - Siphiwe Sibeko - 24.fev.2023/Reuters

A retomada de voos sem escala entre os dois lados do Atlântico nos últimos meses tem trazido otimismo ao mercado. Em média, mais de 13 mil brasileiros por mês voaram daqui para o continente africano neste ano, segundo a Agência Nacional de Aviação Civil, a Anac. Entre janeiro e maio (dados mais recentes informados), a média mensal foi 45% maior que a média de todo o ano passado, quando pouco mais de 9.000 pessoas saíram do Brasil por mês em voos com destino a cidades africanas.

Já a média mensal de africanos vindo ao Brasil em 2024 (13,4 mil) está 37% maior que a média de todo o ano passado (9,8 mil).

Em 2023, quase metade desses brasileiros desembarcaram em Angola, para onde há cinco voos semanais saindo do Brasil. Agora, a África do Sul tem sido o principal destino dos brasileiros —atualmente há sete voos por semana entre o Brasil e o país de Nelson Mandela, operados por duas empresas: Latam (3) e South African Airways (4). A novidade veio dessa última, que agora tem rotas ligando São Paulo à Cidade do Cabo, o que a Varig chegou a ter nos anos 1980.

O Brasil tem acordos com 32 países africanos para viabilizar voos, mas isso não garante que eles aconteçam. Atualmente há viagens sem escala apenas para África do Sul, Angola e Etiópia.

A Latam informou que, em outubro, terá um voo a mais por semana entre Guarulhos e Johannesburgo. Espera-se que em breve tenham também voos disponíveis entre o Brasil e Cabo Verde, Egito, Marrocos e Benin.

A Egypt Air chegou a ter seus aviões decolando duas vezes do Cairo com destino a São Paulo no ano passado. Mas foram voos contratados por uma empresa espanhola que pretendia explorar a rota. A Anac deu uma autorização temporária de um ano. Os voos foram suspensos e a companhia egípcia resolveu operar na rota por conta própria.

Em fevereiro, o assunto foi tratado entre os presidentes brasileiro e egípcio, durante a passagem de Lula pela capital do Egito. Fontes no Itamaraty afirmam que a Egypt Air pretende começar esses voos no segundo semestre deste ano. Mas, segundo a Anac, não há previsão oficial sobre esse início.

A Royal Air Maroc deve retomar, em dezembro, três voos por semana entre São Paulo e Casablanca, no Marrocos. Apesar de suspensos na pandemia, a empresa ainda tem autorização permanente da Anac para voar, assim como a Cabo Verde Airlines. O aeroporto mais cobiçado segue sendo o de Guarulhos, mas Recife deve ser o destino brasileiro dos voos da empresa cabo-verdiana.

O último acordo do setor foi assinado com o Benin, durante a visita do presidente Patrice Talon ao Brasil, em maio. A ideia é que voos liguem Salvador a Porto Novo. As conversas também envolvem a prefeitura da capital baiana e o governo do estado.

Algumas dessas promessas vêm há tempos sendo adiadas. Fontes ligadas ao setor ouvidas pela reportagem afirmaram que alguns aspectos impedem que as negociações avancem.

"O Brasil tem uma oportunidade de ser um dos maiores mercados de transporte aéreo do planeta. E por que a gente ainda não chegou lá? Por causa dos problemas estruturais que são causados por nós. O Brasil tem o combustível de aviação mais caro do planeta. Logo em seguida, essa judicialização que é vergonhosa", diz Dany Oliveira, diretor no Brasil da Associação Internacional de Transporte Aéreo, a Iata.

Ele afirmou que o custo anual de causas envolvendo companhias aéreas que são levadas à Justiça brasileira passa de R$ 1 bilhão.

"Em nenhum país do planeta, exceto no Brasil, as empresas aéreas são responsáveis por efeitos meteorológicos. Operar no Brasil é muito alto risco", diz Oliveira.

Sócio-diretor da NDO Reps, empresa especializada em aviação comercial, Nelson de Oliveira aponta um outro fator que dificulta os voos, mas do outro lado do Atlântico.

"Infelizmente os governos dos países africanos continuam protecionistas nas negociações de liberação dos seus respectivos espaços aéreos. Isso impede o desenvolvimento de uma aviação comercial robusta e competitiva."

O equilíbrio entre a oferta e a demanda foi um ponto levantado por diferentes profissionais do setor com os quais a reportagem conversou sobre o assunto. "A demanda de passageiros entre a África e o Brasil é muito diversificada e depende muito dos destinos", afirmou Nelson de Oliveira.

Ele lembra que, enquanto no caso da África do Sul isso fica basicamente por conta do turismo, com a prometida reaproximação do Brasil com a África espera-se também o aumento de delegações de governos que vinham para participar de reuniões.

Segundo uma outra fonte do setor, que preferiu não se identificar, as companhias aéreas não têm uma preocupação específica de aumentar o tráfego de passageiros.

"Elas planejam seus voos com base na demanda existente, já que os cálculos de viabilidade das operações têm que levar isso em conta", explica. "O início de uma operação regular ou o aumento de capacidade de uma rota já existente por si só tem o potencial de gerar mais demanda, mas a empresa aérea precisa se voltar para a demanda que já existe para viabilizar a nova operação ou aumento de oferta."

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