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Pontos de ônibus, relógios novos e o Google Glass

Os novos pontos de ônibus e os relógios recém-instalados na avenida Paulista parecem destinados, sobretudo, a driblar a Lei da Cidade Limpa.

Trazem pouca contribuição, de fato, às pessoas. Aos cidadãos.

Eles não têm nenhuma funcionalidade preocupada em acolher o usuário. Indicam que quem o fez nunca passou as dificuldades de um cidadão comum, esperando um ônibus.

Até o final deste ano serão instalados 1.400 novos abrigos.

São de vidro, formam um visual "bonitinho", mas não funcionam. São gelados no frio e quentes no calor. Aumentam a sensação térmica desagradável, seja qual for o momento. Não têm proteção lateral nem frontal. Chove de lado, chove de frente.

Alguns tantos, porém, ostentam ao seu lado, bem fornidas peças que são uma espécie de minioutdoor. Bom para quem anuncia. Ruim para a cidade que fez da Cidade Limpa um marco de mudança.

Os relógios, que arriscam uma curva na linha Niemayer, não têm utilidade. Servem para anúncios. Não há hoje alguém sem celular. Ele exibe permanentemente o horário e, se você quiser, informa a temperatura reinante.

O que agregam, então, os relógios, senão a publicidade antes proibida?

O que se observa é que nenhum desses novos equipamentos pensou nas pessoas. O centro da preocupação de todos os discursos políticos, na praça, se iguala, compartilhando o mote: cuidar das pessoas. Na verdade, não se cuida.

O Google Glass é um acessório em forma de óculos que permite você ter acesso a uma série de informações enquanto (se) anda ou faz outras coisas. Ninguém mais se contenta em ter você fazendo uma coisa só.

Exaltou-se que a grande sacada conceitual é a mídia ereta. SEM INCLINAÇÃO.

Segundo especialistas, existe hoje a mídia inclinada, como a TV. Você senta, inclina-se para trás e vê TV. Existe a mídia inclinada para frente. Você senta e olha o seu computador, laptop ou celular. (São inventivos)

Com o Google Glass e seus já novos concorrentes, você acessa tudo sem se inclinar. E é instado a fazer duas coisas ao mesmo tempo. Olha uma enquanto faz outra.

Não bastasse ser hoje quase impossível conversar com alguém sem que seu interlocutor fique o tempo olhando para o celular e conferindo ou enviando mensagens enquanto (finge que) o escuta, agora você vai falar com alguém que estará vendo, por intermédio de um óculos, outra coisa.

É o caminho inverso da aproximação das pessoas. Do diálogo.

Serve também para transformar as ruas em deserto, "uma aglomerada solidão", como diria Tom Zé. Que jamais pensara nisso ao escrever a letra da música.

Ficamos assim: enquanto os equipamentos urbanos servem pouco para atender à necessidade das pessoas. Esperar um ônibus à noite é um misto de ansiedade com angústia. Enquanto os pontos de ônibus, mesmo os da icônica Avenida Paulista, não têm telas avisando quando a linha x ou y vai passar, teremos uns óculos para ver o resto do mundo. Distante da realidade e da necessidade diária da gente.

Talvez eles mostrem uma cidade virtual ideal, sem buracos, sem problemas. Talvez eles impeçam que a gente se olhe no espelho. E perceba o que estamos fazendo.

Acho que estamos perdendo o rumo e não enxergando mais nada. A cidade é mera via de passagem, enquanto nos conectamos mais, só, a nós mesmos. Individualmente.

Falta visão humana.

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