Nina Horta

Escritora e colunista de gastronomia, formada em educação pela USP.

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Nina Horta

Decisões para o novo ano

Crédito: Ricardo Bastos/Fotoarena/Folhapress SÃO PAULO, SP - 31.12.2016: REVEILLON NA PAULISTA - Queima de fotos no Reveillon na Paulista, evento organizado pela Prefeitura para comemorar a passagem do ano de 2016 para 2017 na Avenida Paulista, um dos cartões postais do centro da cidade. (Foto: Ricardo Bastos /Fotoarena/Folhapress) ORG XMIT: 1248462 *** PARCEIRO FOLHAPRESS - FOTO COM CUSTO EXTRA E CRÉDITOS OBRIGATÓRIOS ***
Queima de fogos no Réveillon na avenida Paulista

Em matéria de comida a minha pequena bandeira durante a vida inteira foi simplesmente ser sincera. Contar sobre as novidades, estudá-las com muita curiosidade, explicá-las sem parti pris. Comi tomate seco durante um ano, todos os dias, até enjoar para sempre, mergulho em batatas fritas com ketchup, em batatas em geral quando me apetece, segui nos mais ínfimos detalhes a nouvelle cuisine, estranhei e vi o que havia de bom no Ferran Adrià, passei pelas medicalidades do ovo, da manteiga e da barriga de porco sem prestar atenção e sem culpa. Não gosto de leite condensado nem de cubinhos de carne, e calmamente vou voltando para a nossa comida de todo dia.

Sempre tive uma mínima hortinha pessoal, nunca achei que ela salvaria o mundo, comida orgânica sempre foi considerada o máximo na nossa família, mas não posso plantá-la, quero comprar muito boa no supermercado, esse será um dia feliz.

Nos outros temas da vida, da velhice, em 2018 vou me dar ao trabalho de não ser politicamente correta. Vou ser educada, escutar o outro, refazer minhas opiniões, se precisar, mas chega de me curvar à babaquice e ter medo de que me agridam por isso. Já me calaram sobre empregadas, era preciso fingir que não existiam e as poucas que sobraram eram funcionárias e secretárias, como se o resto do mundo inteiro fosse empregado, só elas que não. Vou continuar falando sobre o serviço caseiro e como melhorar as condições tanto do patrão como do empregado, ou nada disso, vou escrever umas croniquetas que reflitam sobre o assunto. Com humor. Desconfio que o politicamente correto, a crítica politicamente correta mata o humor, e isso faz mal.

Tia Nastácia voltará a ser preta, para mim, danem-se os politicamente corretos que se enraivecem por ela ter lábios mais grossos e a pele escura. Façam-me o favor!

Adorei ser mulher e brasileira e por sorte, entendo que por sorte, nunca fui oprimida por homem nenhum, ai deles... (Os homens que conheci era firmes na sua masculinidade, só me ajudaram e puseram pra frente para que os alcançasse. A minha geração sofria de má educação em colégios religiosos e tivemos que suplantar esse problema com a ajuda dos homens de boa vontade).

Enfim, 2018 vai me livrar do politicamente correto, vou usar turbante e colar indiano sem me apropriar da cultura de ninguém, vou tentar afiar o bom senso, o discernimento e a simplicidade, o que me livrará de ativistas histéricos.

Em matéria de leitura vou ser muuuuito exigente. Passei da página 10 sem me interessar, é esquecer e pegar um belo clássico para releitura e me rejubilar com os novos que me dão prazer.

Já ia me esquecendo do assédio sexual, e as diversas formas que toma nos muitos lugares do mundo. Estupro, perseguição, assassinatos, perseguições físicas e psicológicas são casos de polícia. Mas, devagar com a louça, transformar os homens em monstros predadores não vai ajudar ninguém.

Alguma coisa a reclamar? O terror de ruindade da nossa TV, com seus programas repetidos à exaustão (com as devidas exceções).

Prometo só falar em gênero quando a algaravia de Judith Butler se tornar mais límpida. A Camille Paglia já entendi.

Ah, ia me esquecendo, emagrecer uns quilos para que os joelhos não doam e para que a roupa velha entre nesse tempo de crise.

Procurar um bico, por mal pago que seja para ajudar minhas finanças mambembes.

Ser grata sem falar em gratidão, ser boa sem entrelaçar os dedos em coração, escapar de narrativas, me livrar de pautas óbvias, e comer o que aparecer que já estaremos no lucro.

E viva, 2018!

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