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15/05/2007 - 15h35

Leia a terceira parte da entrevista coletiva concedida por Lula

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da Folha Online

Leia abaixo a terceira parte da entrevista coletiva concedida nesta terça-feira pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva:

11. Jornalista Fernando Rodrigues, Folha de S. Paulo: Presidente, eu queria fazer uma pergunta sobre a crise aérea. Teve um acidente trágico no ano passado, que levou 154 vidas. Agora, mais de meio ano depois, quem utiliza os serviços aéreos no Brasil ainda sente os efeitos dessa crise, com atrasos recorrentes, às vezes mais, às vezes menos, mas a situação ainda não se normalizou. Durante a sua campanha eleitoral em 2006, o senhor usou, entre outros elementos da sua campanha, as obras nos aeroportos em todo o país, realizadas pela Infraero. A Infraero é uma estatal federal, este ano a gente está conhecendo os seus números, e ela teve um aumento de mais de 200% no gasto de propaganda que fez sobre as obras que realiza em relação ao governo anterior. A pergunta para o senhor é a seguinte: durante a sua campanha eleitoral em 2006, o senhor foi informado pelos seus assessores ou sabia que talvez os investimentos realizados no setor aéreo eram insuficientes para deixar o país precavido de uma eventual crise com o setor de controle aéreo?

Presidente:
Fernando Rodrigues, eu penso que para a gente ser justo, precisamos separar essa pergunta em várias outras perguntas. Não vamos confundir o acidente do avião da Gol com o Legacy como um problema dos aeroportos, até porque eles se chocaram no ar. Vamos ver o que aconteceu. Eu não tenho ainda o resultado final da investigação e nem deveria ter porque me parece que, depois de tudo que foi feito aqui, eles ainda têm que mandar para uma comissão especial não sei de onde. E nessas coisas eu penso que a gente não deve ficar adivinhando o que aconteceu. Nós tivemos um acidente, por conta desse acidente tivemos acusações de vários lados e, depois dessas acusações, o resultado foi que houve uma insatisfação nos setores de controladores, nos setores de manutenção, e nós começamos a ter problemas nos aeroportos brasileiros, ainda não ligados às pistas ou às obras brasileiras, mas ligados pura e simplesmente a um sistema de controle aéreo no Brasil.

Eu mesmo fiz várias reuniões com o comandante da Aeronáutica, com o Ministro da Defesa. Detectávamos um problema, consertávamos o problema e tinha outro. Chegamos à conclusão de que tinha um problema de gestão, que era preciso mudar essa questão. E depois percebíamos que o problema era mais complicado, porque os controladores, o aumento que eles queriam ter, a gente não podia dar, porque além de ser controladores, eram sargentos e nós deveríamos estender o aumento para todos os sargentos do Brasil, das três Forças, o que era impossível fazer.

Bem, aí começa a discussão se eles vão ser militares, se vão ser civis, que vocês acompanharam e publicaram. E a divergência foi: vamos discutir se são civis ou militares. E a conclusão é a seguinte: eu estava em Washington [EUA] quando chegou aquele momento da greve deles. Às 10h da noite, em Washington, liguei para o ministro Paulo Bernardo [Planejamento] e falei: Paulo Bernardo, acabe com essa greve, não quero greve aí porque as pessoas já estão sofrendo muito, é preciso respeitar os usuários. O Paulo Bernardo foi lá e disse que ia negociar e assumiu o compromisso de não puni-los. E isso nós cumprimos. Eles não foram punidos por nós, estão sendo investigados por IPM [Inquérito Policial Militar], pela própria Aeronáutica. Uma coisa de que eu não tinha conhecimento prático, eu não sou controlador, portanto, não sei o que acontece dentro da sala de controle ou do Sindacta. Eu não sou especialista. O que fiz? Eu chamei o comandante da Aeronáutica, o brigadeiro Saito, e falei: Brigadeiro, este é um problema seu, resolva com os controladores, não dá para ficar nessa discussão. E até agora está mais ou menos tranqüilo.

Agora é importante, Fernando, que a gente atente para uma coisa. Nós tivemos um problema no Brasil que, muitas vezes, não é levado em conta, que foi a crise da Varig. A Varig, que era a maior empresa brasileira, deixou de existir e os aeroportos ficaram quase órfãos de uma empresa dessa magnitude, aqui e fora do país. Depois, nós temos um crescimento de passageiros do turismo da ordem de 20% ao ano. Nós estamos vendo as promoções que as empresas estão fazendo. Um dia desses até me assustei: R$ 90 uma passagem para o cidadão vir a Brasília. Aí descobrimos o overbooking que a TAM fez no final do ano passado. Então, houve um conjunto de coisas que foram criando um problemão de magnitude quase incontrolável.

Eu penso que estamos resolvendo tudo isso que aconteceu, vamos resolver com tranqüilidade. Faz algum tempo que está tranqüilo e vamos resolver o problema dos aeroportos brasileiros. Estamos com obras contratadas em quase todos os aeroportos. Para não ficar prejulgando ninguém vamos ver o seguinte: quando foi inaugurado o aeroporto de Cumbica, em São Paulo, ele foi construído exatamente para tirar os aviões do centro de São Paulo, portanto, do aeroporto de Congonhas. Quando foi construído o aeroporto de Confins [MG], ele foi construído para tirar os passageiros do aeroporto da Pampulha [MG]. Quando foi construído o Galeão [RJ], foi para tirar a quantidade de vôos do aeroporto Santos Dumont [RJ]. O que aconteceu, na verdade? Os vôos que, três ou quatro anos após a inauguração de Cumbica, tinham sido transferidos para Cumbica [SP], foram voltando gradativamente. E hoje, por exemplo, Congonhas, de lá saem aviões para toda parte do Brasil, quando antes era só para ponte aérea. Então, você tinha a mesma pista que havia há 30 anos atrás. Obviamente que vai ter problema.

Então, nós vamos continuar reformando os aeroportos brasileiros. No final do mês vou reinaugurar o aeroporto de Santos Dumont. Estamos fazendo obras em todos os estados brasileiros e vamos continuar fazendo. E, naquele que for necessário, vamos tentar fazer uma terceira pista. Eu vou dar um exemplo para você, que é paulista também. Quando foi inaugurada a rodovia Bandeirantes, lá para os idos de 1970, quando foi inaugurada a faixa do meio, que vai até Campinas, ela foi deixada para que fosse construído um trem-bala ligando o aeroporto de Viracopos [em Campinas] ao centro de São Paulo. Não tem nem o trem-bala, nem a ferrovia, nem foi modernizado o aeroporto de Viracopos. Então, nós estamos sendo vítimas da falta de planejamento histórica neste país, e nós agora temos que recuperar e criar condições para os aeroportos funcionarem. Se em algum momento a Infraero gastou dinheiro a mais em publicidade, ora, tem um monte de instâncias para julgá-la. Sobre a publicidade, eu li uma carta que o Franklin mandou para a Folha de S.Paulo explicando isso.
No mais, vamos continuar trabalhando nos aeroportos brasileiros, porque eles precisam. E hoje, o tráfego aéreo é tão intenso que, se a gente quisesse fechar Congonhas e mandar todo mundo para Cumbica, Cumbica não teria condições de suportar, porque precisa também de uma terceira pista. E nós precisamos arrumar um dinheirinho e colocar um novo PACzinho para poder fazer. É assim que a gente vai consertar para você viajar mais tranqüilo, entre o Rio e São Paulo, sem problemas.

Jornalista Fernando Rodrigues, Folha de S.Paulo: Só uma pequena observação, à qual eu gostaria que o senhor se referisse. O senhor estava há quatro anos na Presidência da República e esse episódio da crise ocorreu no final do seu primeiro mandato. Eu queria que o senhor dissesse: se houve alguma falha gerencial ou administrativa para que o senhor não fosse informado desse problema, que apareceu como se fosse do nada.

Presidente:
Eu vou dizer uma coisa: quando eu digo que a história vai julgar, é porque quando há julgamentos precipitados a gente cria confusão desnecessária. Quando aconteceu o acidente aéreo, a primeira coisa escrita neste país, era que tinha um apagão aéreo entre o estado do Pará e o estado do Amazonas. E foi no meio do apagão que aconteceu o acidente. Ora, se tinha um problema de apagão, supõe-se que os culpados eram os controladores, ou seja, julgamento precipitado ao dizer que tinha um apagão; julgamento precipitado em culpar os controladores. Então, o que um presidente da República tem que fazer? Ao invés de ficar dando opinião sobre o que aconteceu, eu prefiro esperar o resultado final das investigações. Eu, teoricamente, fui informado pela Aeronáutica de que não tinha apagão. O que pode ter havido foi desobediência à ordem de vôo. Eu sou, Fernando, até pelo cargo que exerço, prudente em não condenar, a priori, ninguém. Se daqui a alguns dias tiver o resultado final, vocês todos da imprensa serão os primeiros a saber o que aconteceu, sem o intuito de punir quem quer que seja, mas com o intuito de informar a opinião pública brasileira do que aconteceu. E aí a justiça vai cuidar do resto. É assim que tem que ser o procedimento.

12. Jornalista Fábio Pannunzio, Band/Band News: Presidente, bom dia. Tudo bem? Presidente, a gente não tem nenhuma dificuldade em entender o cenário que o senhor apresenta para a gente quando se refere, por exemplo, aos resultados da economia. Os números falam por eles mesmos: 125 bilhões no caixa, 40 bilhões de superávit comercial e todos os outros dados que o senhor citou aqui, um novo status de confiabilidade. Então, o país que o senhor projeta aqui é um país que vai muito bem, seguindo seu rumo, essa coisa toda, e a gente acredita nisso. Eu gostaria de saber do senhor qual é a dificuldade que o senhor tem em explicar a mesma coisa ao Copom [Comitê de Política Monetária], do Banco Central, que ainda continua cobrando juros de agiota, quer dizer, os juros mais caros do mundo, juros além dos da Turquia. Qual é o problema?

Presidente:
Fantástico. Uma coisa engraçada é o seguinte: faz quanto tempo que vocês, da imprensa, não vêem uma faixa na rua 'Fora FMI'? Não vêem. Ora, eu não quero interferir no Copom porque eu acredito que, quanto mais autonomia tiver o Banco Central, melhor é para o país, e eu acho que não precisa mandar uma lei para o Congresso Nacional estabelecendo essa autonomia. Eu quero mostrar que é possível um presidente da República, responsável, não ter ingerência nas decisões do Banco Central, quando se trata de discutir assuntos da política monetária brasileira, para o bem ou para o mal. Quero lembrar a vocês que faltava um mês para a eleição para a prefeitura de São Paulo, em 2004, e os juros aumentaram. Não pensem que eu não recebi dezenas de telefonemas: 'Presidente, pelo amor de Deus, interfira, fale com o Meirelles, não deixe os juros subirem'. Meu caro, não seriam as eleições de São Paulo que iriam me fazer ter um comportamento inadequado, como não seria a eleição do Brasil que iria me fazer ter um comportamento inadequado. Meus adversários falavam todos os dias: 'não, porque os juros estão altos, porque os juros estão altos'. Sabe por quê? Porque, quando as pessoas viram oposição, elas colocam uma tapa nos olhos e se esquecem de quanto eram os juros quando elas governaram este país.

Então, hoje, eu estou convencido de que nós temos a taxa de juros mais baixa dos últimos anos, com tendência --tendência não, porque o nome não é bonito-- com viés de baixar, é assim que o Banco Central fala, e nós vamos baixando, mês a mês, ou seja, a cada 45 dias vamos baixando, baixando, sem que haja tensão pré-Copom como existia há algum tempo. Nada de tensão pré-Copom. Vamos manter o Banco Central funcionando do jeito que está funcionando, as coisas estão bem, a economia está crescendo, vai crescer mais ainda, vai gerar mais empregos e o juro vai cair, o juro vai chegar a um patamar que, eu diria, é aquele que todo mundo sonha: juros compatíveis com os juros internacionais de países com quem o Brasil compete. Esse é o nosso desejo. Agora, sem fazer nenhuma estupidez, nenhum ato de bravata. A inflação está controlada 'Meireles, o negócio é o seguinte: baixa logo três pontos, os juros'. Não vou fazer isso, porque, durante 27 anos da minha vida vivi recebendo salário e eu sei que quando a inflação aumentar, o prejudicado sou eu. E mais prejudicados ainda serão os trabalhadores que ganham o salário mínimo, os que recebem o Bolsa Família ou os que recebem auxílio-doença. Então, a partir do controle da inflação, a partir da estabilidade econômica, a partir da seriedade fiscal, o juro vai caindo.

E como você é muito jovem e eu pretendo viver o meu mandato inteiro aqui, você vai perceber que vai chegar um dia em que você não vai me fazer mais nenhuma pergunta de juros. Eu quero saber quando a gente não tiver mais problema de juros, não tiver mais problema de crescimento econômico, qual será a pergunta que vocês farão para mim?

Jornalista Fábio Pannunzio, Band/BandNews: Como esse dia não chegou ainda, Presidente, eu tenho uma complementação.

Presidente:
Já chegou. Eu pergunto se você viveu algum momento em que a economia esteve tão bem organizada como está agora.

Jornalista Fábio Pannunzio, Band/BandNews: Eu estou dizendo que eu vejo o cenário, mas que tenho muita dificuldade em entender como é que o Banco Central não enxerga isso. Mas eu não quero discutir com o senhor.

Presidente:
Ele enxerga. Mas se você for ao BNDES [Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social] e pegar juros a 6,5%, não vai pagar a taxa Selic. Se você for buscar dinheiro em dólar, você vai pagar cinco vezes menos que a taxa Selic. Então, não tome dinheiro emprestado com base na taxa Selic, procure outras fontes de financiamento que o próprio governo oferece.

Jornalista Fábio Pannunzio, Band/BandNews: Presidente, só para complementar, me parece que o status a que o Brasil chegou não combina muito com essa condição de política monetária. O senhor disse o seguinte: "eu não vou ligar para o Meirelles para pedir 3%". Mas não dá vontade?

Presidente:
Dá. Oh, rapaz, dá vontade, mas eu estou convencido de que nós estamos no caminho certo. Agora, isso aqui é como se fosse uma maratona, eu estou vendo a faixa de chegada lá. Eu já estou atingindo a minha perfeição e posso chegar em primeiro lugar. Se eu me meter a forçar um pouco o ritmo, eu posso ter uma distensão e cair antes de chegar em primeiro lugar, ou pode aparecer um daqueles caras que segurou o brasileiro lá e não deixou ele chegar na frente. Então, vamos devagar que eu pretendo entregar para você, no final do meu mandato, o País mais sólido que você já viveu em toda a sua vida.

13. Jornalista Zileide Silva, TV Globo: Bom dia, Presidente. Governadores e prefeitos reclamam muito dos rigores da Lei de Responsabilidade Fiscal e das regras de rolagem da dívida. Agora, o equilíbrio fiscal é apontado por muitos especialistas como a principal, como a maior conquista da economia brasileira nos últimos anos. No entanto, nos últimos meses, alguns ministros acenaram com a possibilidade de mudanças para aliviar esse aperto. Que tipo de mudança, presidente, o senhor poderia oferecer, se é que o senhor concorda com alguma mudança, sem comprometer o equilíbrio fiscal?

Presidente:
Você sabe que a perfeição do ser humano e a perfeição dos entes federados acontece exatamente quando uns querem dar mais, outros querem dar menos, um exige mais e outros exigem menos. Primeiro, eu quero dizer para você que é normal que os governadores queiram mais dinheiro e queiram mais capacidade de endividamento.

Também é importante encarar como a coisa mais normal do mundo o tesoureiro do país sentar em cima do dinheiro e falar: 'aqui ninguém tasca', é assim. Se eu pegar um governador que quer aumentar a sua capacidade de endividamento e colocá-lo na Fazenda [Ministério], na semana seguinte ele estará sentado em cima do cofre, com o mesmo discurso que o Guido está fazendo hoje, porque é da prática e da responsabilidade de quem cuida de finanças. Isso você pode pegar pela sua mãe, na sua casa, que certamente é quem cuida das finanças, ou pela mãe de cada um, é ela quem diz para o filho: 'eu não vou dar o dinheiro, você está pedindo 20, você vai ter 10; você está pedindo 10, vai ter 5', e de vez em quando, o pai tenta afrouxar do outro lado. Então, esses exemplos, e todo mundo entende o que eu estou falando, é o que acontece na economia brasileira.

Os governadores querem aumentar a sua capacidade de endividamento. Eu sou favorável por quê? Porque nós temos duas leis. Nós temos uma lei que é anterior à Lei de Responsabilidade Fiscal, que estabelece a regra que estamos impondo aos governadores hoje. E a Lei de Responsabilidade Fiscal tem uma flexibilidade maior. Ora, o nosso desafio é fazer esse ajuste sem permitir que, ao criar condições para que um prefeito ou um estado tenha um pouco mais de capacidade de investimento, a gente volte a permitir a famosa 'farra do boi', que acontecia neste país durante séculos e séculos, em que os estados deviam quatro ou cinco vezes o que arrecadavam, e os governadores, num mandato de quatro anos, faziam dívidas que precisaria 20 anos para pagar. Essa irresponsabilidade não voltará mais. Posso te afirmar, Zileide, que essa irresponsabilidade não voltará, mas ao mesmo tempo eu tenho idéia de flexibilizar um pouco.

Só quero discutir com o Guido, com o Paulo Bernardo e com os governadores qual é o limite dessa flexibilização, sem criar nenhum problema futuro para este país. Esse negócio de endividamento é como cartão de crédito: se as pessoas têm que colocar a mão no bolso e tirar um centavo para gastar, contam até dez; mas se não têm que tirar, usam o cartão de crédito, se estão no exterior, vão só passando o cartãozinho na máquina, esquecendo-se de que um dia têm que pagar. E quando vão pagar é que descobrem a desgraça que foi feita. Nós não iremos permitir isso.

Eu quero fazer um acordo com os governadores, quero ver o limite das possibilidades que nós podemos acertar com eles, mas sem permitir que as pessoas voltem às gastanças tradicionais neste país.

Jornalista Zileide Silva, TV Globo: Também não tem um prazo, não é Presidente, para esse ajuste?

Presidente:
Tudo isso tem prazo, eu não posso dar uma data para você, Zileide, porque eu tive uma reunião no dia 6 de março, houve uma proposta de que nós voltássemos a nos reunir a cada quatro meses. Teoricamente, essa reunião seria até o dia 6 de julho. Eu não sei se será antes ou não, o Guido está preparando. Na semana que vem, eu vou conversar com o ministro Guido Mantega, e na hora em que estiver pronto, nós vamos chamar a comissão de governadores, vamos discutir e ver se estamos prontos para fazer uma nova reunião.

Jornalista Zileide Silva, TV Globo: Obrigada, Presidente.

14. Jornalista Tânia Monteiro, O Estado de São Paulo: Presidente, têm-se falado muito da aproximação do PT com o PSDB, do governo com o PSDB. Eu queria saber do senhor o que há de concreto em relação a essa aproximação; se ela, por exemplo, pode levar o senhor a apoiar o Aécio em 2010 e, quem sabe, já que o senhor disse que não tem 2010 para o senhor, poderá voltar em 2014, seria possível?

Presidente:
Eu não posso contar a história para vocês, mas eu me lembro que o Juscelino Kubitscheck, quando deixou a Presidência da República, sonhava que cinco anos depois ele voltaria pelos braços do povo e foi cassado. Não voltou nunca mais.

Eu não trabalho com a hipótese de voltar à Presidência da República. Primeiro, eu tenho que cumprir o meu mandato que está no começo. Então, só cinco minutos de insanidade é que me permitiriam ficar discutindo oito anos para a frente. Segundo, eu acho que um ex-presidente da República precisa virar conselheiro dele mesmo. Um ex-presidente da República não pode ficar dando palpite. Se for chamado para alguma coisa, diga o que pensa, mas ele precisa parar. Depois que você chegou aqui, você não tem nada mais alto do que isso, é o máximo. Então, você se recolhe, vai cuidar da família, vai cuidar dos netos, vai fazer conferência, vai fazer alguma coisa. Bom, eu penso assim.

Agora, com relação à candidatura do PSDB, eu sempre tive uma boa relação com o PSDB. Eu não gosto de voltar à história, mas é importante lembrar que, em 1994, se não fosse o Plano Real, o PSDB teria indicado o vice na minha chapa, e não foram poucas as reuniões que nós fizemos para que isso acontecesse. Depois, veio o Plano Real, ele foi uma novidade importante para o país, e aí o PSDB teve candidato e ganhou as eleições de mim. Eu mantenho relações muito boas com muita gente do PSDB, com o Serra, com o Aécio, com o Tasso Jereissati e com outros membros do PSDB. Ora, se em algum momento eles radicalizaram e criaram mais transtorno do que deveriam criar, é um problema de avaliação deles. Nós disputamos as eleições e eles detectaram que o povo não estava combinado com aquilo que eles tentaram fazer com o governo. Isso não impediu, em nenhum momento, que eu tivesse disposição para conversar com o PSDB e vou continuar conversando.

Agora, a partir daí, Tânia, a gente dá um passo adiante e diz: 'o candidato pode ser do PSDB?' Eu só posso te dizer o seguinte: a base do governo terá candidato. Quem vai ser? Não sei. É tão cedo. Nós vamos ter, no ano que vem, eleições para prefeito, e cada eleição nas capitais é quase uma eleição nacional. Vamos aguardar para ver. Eu só posso te garantir que a base do governo terá candidato e eu espero estar com saúde plena e com credibilidade na sociedade para fazer campanha em palanques espalhados por este país afora. Agora, vamos ver qual é o comportamento do PSDB nisso tudo.

Eu acho que muita coisa vai acontecer no Brasil para melhor. Acho que o PFL [atual Democratas] vai deixar de ser tão nervoso, acho que as pessoas vão aprendendo que o povo não quer saber de muita confusão, o povo quer que o país dê certo. A única coisa que o povo deseja é que a gente tenha a responsabilidade de fazer o Brasil dar certo. O povo quer comer mais, quer estudar mais, quer morar bem, quer ter mais segurança. É esse o desafio que está colocado para nós e essa é a proposta que eu tenho para os companheiros da situação e da oposição.

O PAC está aí, o PDE [Plano de Desenvolvimento da Educação] está aí e outras medidas vão sair para que a gente possa ordenar, aproveitar este momento em que o ódio não predomina na política brasileira para tentar criar as condições de o Brasil melhorar ainda mais, melhorar os indicadores sociais, melhorar a questão da educação, porque nós vamos fazer uma revolução na educação brasileira, pode acreditar. Nós vamos fazer coisas, eu diria, que há muitos e muitos anos não são feitas neste País, porque nós conquistamos este momento de fazer isso.

Então, se você quiser, eu posso definir que daqui para frente eu serei um grande conversador, não conservador. Conversador, e aí vale para todas as forças políticas.

Jornalista Tânia Monteiro, O Estado de São Paulo: E ainda dá para conversar com o presidente Fernando Henrique?

Presidente:
De vez em quando, eu vejo o presidente Fernando Henrique Cardoso dizer que eu não o convidei. É importante lembrar que ele também só me convidou depois que eu fui derrotado em 1998, e eu sempre tive relação de amizade com o Fernando Henrique Cardoso. Eu não tenho por que não conversar com ele. Se ele acha que eu errei em não convidá-lo, não será por falta de convite que a gente não vai conversar. Obviamente que nós acabamos de sair de uma eleição, eu também não quero que ninguém venha conversar comigo, achando que está capitulando, eu não quero isso. Eu quero respeitar o direito do PSDB ser oposição, quero respeitar o direito deles fazerem as críticas que tiverem que fazer, mas também quero que eles respeitem a vontade que eu tenho de tê-los como adversários e não como inimigos.

15.Jornalista Carla Corrêa, Jornal do Brasil: Presidente, em 2005, na primeira coletiva que o senhor deu, em que o senhor conversou com a gente nesse formato, o senhor falou da importância que seria juntar o governo federal com os governos estaduais, com os municípios, para desenhar uma estratégia de combate à violência. Dois anos se passaram, desde então, e as mais enérgicas demonstrações de força nesse sentido vieram do outro lado, do crime organizado. A gente teve ondas de criminalidade crescente no Rio de Janeiro, em São Paulo. A primeira vez que o senhor falou, o senhor estava se referindo ao Rio de Janeiro. E eu queria saber do senhor o que está faltando. Onde foram parar aquelas políticas que o senhor sempre defendeu, de empregabilidade do jovem, a escola em tempo integral para manter o jovem longe da violência? O que faltou, nesses dois anos que se passaram, já que o governo ainda não conseguiu dar uma resposta efetiva para a violência? Hoje dia, de qualquer forma, é um ponto fraco do seu governo, as pesquisas de opinião pública dizem isso. O povo está insatisfeito com essa questão da segurança pública. O que faltou para dar essa resposta até agora?

Presidente:
Primeiro, vamos colocar as coisas no seu devido lugar. Hoje, com muito mais tranqüilidade que ontem e, quem sabe, amanhã com mais tranqüilidade do que hoje, na questão da segurança pública, o governo federal não é o foco principal, nós somos a força auxiliar do sistema de segurança pública que é, majoritariamente, controlado pelos governos dos estados.

Você sabe que, com exceção da polícia federal, que muitas vezes para entrar em determinado tipo de coisa que acontece no estado, tem que pedir autorização, normalmente a ação é da polícia estadual e da Polícia Civil. O governo federal só entra quando é pedido, como entramos no Espírito Santo, como entramos no Rio de Janeiro. Agora mesmo o governador Sérgio Cabral pediu e nós fomos lá para que ele colocasse no papel as coisas que eles precisavam do governo federal para que a gente não tivesse uma ação que fosse considerada intervenção no estado.

Eu sei que o problema da segurança é delicado, eu sei que o problema da segurança envolve, sobretudo, uma parte da juventude brasileira com a qual nós estamos trabalhando. Não foram poucas as coisas que criamos para a juventude brasileira. Nós criamos a Secretaria Nacional, criamos o Conselho da Juventude, temos programas da juventude atendendo quase 900 mil jovens, pagando auxílio, uma ajuda de custos, seja no ProJovem, seja no Escola de Fábrica, seja no Consórcio da Juventude, seja no Soldado Cidadão, para que esse jovem possa voltar a estudar.

Eu tenho consciência, e foi um dos assuntos que conversei com o papa, que nós vamos precisar não apenas discutir a questão da juventude, mas discutir também a questão da família brasileira, porque eu acho que há um processo de desagregação da estrutura social a partir da desagregação da estrutura familiar em muitos lugares deste país.

E o ministro Tarso Genro [Justiça] vai, até o final do mês, me apresentar as diretrizes para um novo programa de segurança pública, que só pode dar resultado se for feito combinado com os governadores e, portanto, combinado com a nossa Secretaria de Segurança Nacional, com as secretarias de segurança de cada Estado. Eu acho que é um conjunto de coisas que precisamos fazer, e a primeira delas é tentar recuperar a juventude brasileira, recuperar, sobretudo, aquele estoque que está aí e é resultado de toda a política dos anos 80, jovens de 24, 20 anos, que estão sem estudar, que estão desempregados. É um estoque muito grande, nós podemos cuidar com muito mais facilidade das crianças de hoje para quando virarem adolescentes, não caírem na criminalidade ou no banditismo. E nós precisamos trabalhar com todas as forças da sociedade. E eu digo: o Estado não tem competência de resolver esse problema sozinho, é preciso envolver todas as forças da sociedade brasileira, todos os entes federativos, tudo que é órgão da sociedade estar organizado para que a gente dê uma resposta a essa questão da juventude brasileira. E a questão da violência não está só ligada à questão da juventude. É uma questão de tempo você combater o crime organizado, estar melhor preparado, investir mais na inteligência. Nós estamos fazendo.

Quando chegar o Pan, nós vamos ter um modelo de uma coisa que está sendo preparada para os Jogos e que vai ficar no Rio de Janeiro depois que terminar o Pan. Então, o Rio poderá virar uma espécie de início da virada na política de segurança pública do nosso país, sabendo que por mais que a gente fizer, vamos levar muitos anos para resolver o problema da segurança pública no Brasil, que está ligado a outros fatores, a começar pelos problemas sociais. E não apenas os problemas sociais, as condições de moradia, a qualidade da convivência que as pessoas estão tendo no seio familiar e também o tratamento que o Estado tem que dar aos lugares que mais precisam da sua presença.

Por isso é que no PAC colocamos, dos R$ 40 bilhões que estamos destinando para saneamento básico e urbanização de favelas, estamos priorizando as regiões metropolitanas, que são consideradas as mais nervosas do país. É ali, naquele espaço, que não tem escola, não tem o poder público, não tem saúde, que o cidadão se vê abandonado pelo Estado brasileiro. Então, vamos começar com essa experiência na região metropolitana para ver se a gente consegue, não só gerar emprego, mas melhorar a vida e criar as condições de o Estado estar presente nos lugares onde até agora esteve desaparecido. E quando o Estado desaparece, o crime organizado aparece, o narcotráfico aparece, oferecendo coisas que o Estado brasileiro poderia oferecer. É uma tarefa difícil, não é fácil. Portanto, não vale mais qualquer político fazer discurso fácil com relação à segurança pública, porque todos que fazem discurso fácil, são desmentidos três meses depois das eleições.

Eu vi um jovem nos Estados Unidos fazer o que fez em uma escola, matar 32 jovens, e fico imaginando que o problema não é só de segurança pública, o problema também é da qualidade da formação do ser humano que estamos recebendo no mundo, do que estamos dando.

Jornalista Carla Corrêa, Jornal do Brasil: O que vai acontecer, então, no Pan, vai ser uma espécie de carta de apresentação, um laboratório do que vai ser a política de segurança pública?

Presidente:
Eu não utilizaria o termo carta de apresentação. Eu diria que é uma experiência que estamos fazendo, possivelmente a mais importante na área de segurança pública, e que não tem sentido fazer apenas para dar garantia ao Pan, mas para ficar no Rio de Janeiro depois que os nossos atletas forem embora. E dali, quem sabe, a gente ter formado, com a participação da sociedade civil... você está lembrada que eu fui ao Rio de Janeiro participar de um evento com mais de 10 mil jovens que estão se preparando para ajudar a tomar conta de todos os problemas que envolvem, inclusive, a segurança no Rio de Janeiro. Eu estou convencido de que uma parte do problema se dará com a melhor formação do nosso povo.

Franklin Martins: Carla, muito obrigado pela sua última pergunta. Foi a décima quinta pergunta. Eu queria agradecer em nome da Secretaria de Imprensa da Presidência, a participação de todos vocês. Não sei se o Presidente ainda quer falar sobre algum assunto que ficou fora.

Presidente:
Não, quero só agradecer a vocês. Acho que vale a pena fazer isso. O Franklin, portanto, está incumbido de fazer o que outros não puderam fazer, por minha causa. Como eu já disse a vocês, estou muito mais flexível neste segundo mandato. Aproveitem. Muito obrigado.

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