Caridade
do Taleban aproxima Afeganistão de favela brasileira
Rodrigo Zavala
Equipe GD
O que a guerrilha
do Taleban e uma favela carioca dominada pelo narcotráfico
têm em comum? Adolescentes aliciados, que encontram nas armas
o acesso a bens inatingíveis em condições normais.
Some-se a isso a ingênua concepção de que a
falta de serviços públicos é preenchida pela
assistência comunitária dos dominantes, sejam eles
traficantes ou líderes fundamentalistas.
As semelhanças
impressionam. A idéia de 'bandido social', que diziam fazer
sentido na década de 70 no Brasil, quando uns poucos traficantes
prestavam ajuda aos moradores das favelas cariocas, segue a mesma
lógica no Taleban e sua entidade assistencial Al-Rashid.
O objetivo da entidade é expulsar ONGs ocidentais do Afeganistão
e promover sua própria ação humanitária.
O Al-Rashid
foi criado logo que o Taleban tomou o poder no Afeganistão,
em 1996. Além de fornecer comida a 25 mil afegãos
pobres, cava poços artesianos para as populações
locais. A entidade abriu há pouco também o primeiro
centro de computação na capital Cabul, onde 28 aplicados
estudantes treinam o Lynux sob o estrondo de bombas americanas.
A idéia
pode parecer louvável. A falta de alimentação
decente e cuidados médicos e sanitários fazem com
que 125 mil pessoas a cada ano - 14 por hora - morram por causa
da fome ou da guerra no Afeganistão. Mas a que custo? A inteligência
americana acredita que Osama Bin Laden é a fonte de dinheiro
do Al-Rashid. Sabe-se também que a entidade está ligada
à luta separatista na Caxemira indiana.
O professor
de política e relações internacionais da PUC-SP,
Fernando Abrucio, acredita que a iniciativa é um embuste.
"O Taleban criou um governo de terror e violência, jamais
respeitando os direitos humanos. A ajuda humanitária que
estão oferecendo é um absurdo, simplesmente não
existe", afirma. Segundo Abrucio, eles estão dando migalhas
para que não ocorra um consenso da população
contra os fundamentalistas.
Mesmo assim,
em uma sociedade onde muitos morrem de fome, a adesão à
milícia muçulmana pode ser uma saída. Ainda
mais aliada a um suposto ideal comunitário. Tocar ou ouvir
música, jogar xadrez, beber álcool, dançar
e fazer fotos, atividades proibidas pelo Taleban, não são
restrições tão duras para quem está
faminto. Daí para segurar as armas e defender a família
Laden é um passo.
"Eles recrutam
essas pessoas como bucha de canhão para serem as vítimas
dos ataques norte-americanos", explica o professor Abrucio.
Princípio
semelhante rege o contato entre moradores das favelas brasileiras
e os traficantes. Pesquisa realizada pela Fundação
Oswaldo Cruz do Rio (Fiocruz) aponta que as leis do tráfico
exigem um preço para a caridade.
Ao entrevistar
94 adolescentes, entre 14 e 18 anos, de 22 favelas, o estudo constatou
que garotos são aliciados cada vez mais cedo. Entram para
o tráfico com menos de 10 anos de idade. Entre as leis impostas
pelos traficantes estão o uso de moradias como esconderijo
de armas e bandidos, o toque de recolher, o controle de visitas
e orelhões, as senhas para entrar no morro e a expulsão
dos suspeitos de delação.
As regras são
específicas, como também ocorre no Afeganistão.
Quem as desobedece é punido com rigor e até com a
morte. "Um domínio exercido pelo medo", conclui
o professor.
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