Saltar para o conteúdo principal

Publicidade

Publicidade

 
 
  Siga a Folha de S.Paulo no Twitter
22/09/2003 - 02h50

Moacyr Scliar : Os inesperados problemas da educação

Publicidade

MOACYR SCLIAR
Colunista da Folha de S.Paulo

Prefeitura no Ceará matricula até aluna morta. Para arrancar mais dinheiro do Fundef, 1.427 alunos fantasmas foram enxertados no censo escolar de 2003. Uma criança morta há dez anos acabou sendo matriculada. Brasil, 4.set.2003

"Esta notícia não passa de uma grosseira distorção da realidade. O que de fato ocorreu foi um grande programa de inclusão de jovens nas escolas. Todos os jovens foram matriculados, independentemente até de sua vontade. Todos: "nenhum aluno sem escola" era o lema.

Claro, nem todos se apresentaram para as aulas. Houve uma menina, por exemplo, que não apareceu durante semanas, durante meses. Chegou o período de provas e com isso se criou um dilema: o que fazer com essa aluna ausente?

Uma ordem foi então dada: para evitar que perdesse o ano, seria ignorada a falta de frequência. Ela poderia comparecer ao colégio e fazer a prova. Mas não compareceu.

Nova ordem, então: a prova seria enviada para o endereço da aluna. O que efetivamente ocorreu. Nada. Nenhuma resposta.

Aventou-se a hipótese de que a prova fosse muito difícil. Foi decidido facilitar a tarefa. A questão que pedia os afluentes do Amazonas foi modificada: bastaria fornecer os afluentes da margem esquerda. De novo, nenhuma resposta foi recebida.

Seria ainda difícil a prova? Por ordem superior, houve uma reformulação no enunciado: "Tudo indica que o Javari é um afluente do Amazonas. É mesmo? Hein? O que você acha?".

Nada. Nenhum retorno. A essa altura, ficou claro que alguma coisa de anormal deveria estar ocorrendo. A aluna, matriculada, não aparecia, não dava respostas às perguntas, mesmo facilitadas. Conclusão: só poderia estar doente. E, se estivesse doente, ficaria automaticamente dispensada da frequência às aulas e das provas. Desde que isso fosse devidamente documentado.

Mensagem urgente foi enviada aos pais solicitando que providenciassem atestado médico. E eles mandaram um atestado. De óbito.

O que é uma clara demonstração dos problemas enfrentados pela educação em nosso país. Pede-se um atestado médico, vem um atestado de óbito. Quando nem os pais atendem o que é solicitado, o que se pode esperar dos alunos? Os afluentes do Amazonas fluem inutilmente. Seu nome será esquecido para sempre."

Leia mais
  • Evasão escolar aumenta em quatro anos
  • Mães criticam formação insuficiente
  • Escolas que adotam ciclos no Brasil são minoria
  • Repetência volta a crescer no ensino médio
  •  

    Publicidade

    Publicidade

    Publicidade


    Voltar ao topo da página