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16/01/2003
-
04h46
Diretora da sucursal da Folha de S.Paulo em Brasília
Os arroubos de hegemonia na América do Sul e as ostensivas manifestações favoráveis ao presidente venezuelano, Hugo Chávez, começam a criar constrangimento em setores do Itamaraty, que ontem se preocupavam com os protestos diante da Embaixada do Brasil em Caracas.
A atuação do presidente Luiz Inácio Lula da Silva pró-Chávez e sua simpatia pelo ditador Fidel Castro, de Cuba, insinuando um confronto com os Estados Unidos, podem gerar o primeiro conflito interno do novo governo. Mas nos bastidores, porque diplomatas em geral são cuidadosos, disciplinados e muito apegados à carreira.
Os descontentes acusam o governo Lula de, além de interferir em questões internas de outro país, tomar partido de um dos lados, quando a Venezuela está rachada ao meio. Uma aposta de risco. Caso os opositores vençam, o Brasil terá criado dificuldades com os EUA e simultaneamente perdido a aliança histórica com a Venezuela.
A postura indicada como ideal pelos setores contrariados é a do presidente do Chile, Ricardo Lagos, que não se intrometeu diretamente na crise venezuelana, acompanhando à distância.
"Fora ianques"
A reação dos opositores de Chávez contra a Embaixada do Brasil em Caracas, exposta, por exemplo, na primeira página de ontem da Folha de S.Paulo, lembrou a embaixadores mais experientes o "Fora ianques" que a esquerda brasileira gritava contra os EUA na década de 60. Ou seja: os protestos estão sendo contra o que esses embaixadores classificam de "ameaça hegemônica" do Brasil.
Quando o presidente norte-americano Richard Nixon disse que "para onde o Brasil se inclina a América do Sul se inclina", achou que era um elogio, mas a frase até hoje causa mal-estar.
A diplomacia brasileira tenta se livrar do estigma de "liderança" ou de "hegemonia" nas relações com os vizinhos. Para fugir de disputas, ciúmes e reações não só dos governos mas também de setores organizados das populações da região.
Nos corredores do Itamaraty, aponta-se como o principal responsável pelos erros da política externa logo no início do mandato de Lula o seu assessor especial Marco Aurélio Garcia, que foi mentor do PT nessa área nos últimos dez anos e está no Palácio do Planalto agora para orientar o presidente.
Foi Garcia, inclusive, que levou pessoalmente à Petrobras, na semana passada, a lista de reivindicações do governo da Venezuela para tentar driblar os efeitos da greve geral naquele país, iniciada em 2 de dezembro. Até agora, não houve uma resposta formal do Brasil, mas o presidente da estatal, José Eduardo Dutra, foi chamado a Brasília amanhã.
Em alguns gabinetes do Itamaraty, Garcia vem sendo chamado de "amador" e de "franco-atirador". No balcão de apostas sobre o que deverá acontecer, dá-se como certo de que a médio prazo deverá ser "premiado" com uma embaixada no exterior.
Fator de equilíbrio
Embaixadores identificados com o governo tucano ou simplesmente independentes resolveram "cerrar fileiras" a favor do chanceler Celso Amorim, elogiado por praticamente todas as correntes como um "diplomata completo", o "melhor de sua geração". Acham que ele é "o fator de equilíbrio" na escalada pró-Chávez.
O mais comum é que, ao falarem de Amorim, seus agora subordinados listem uma série de qualidades: foi primeiro lugar no Instituto Rio Branco, tem sólida formação acadêmica e senso prático, já atuou tanto politicamente quanto em questões econômicas em organismos internacionais.
Ouvido pela Folha de S.Paulo sobre esse tipo de reação, Marco Aurélio Garcia riu: "Tudo isso é uma besteira. É que as pessoas têm dificuldades de entender que este é um governo diferente, com gente diferente, e logo vão entender que eu e o chanceler Amorim temos uma enorme afinidade de pensamento e de visão política".
Depois, acrescentou: "Eu tenho o mais absoluto reconhecimento de que ele [Amorim] é o melhor diplomata da ativa. Eu tenho uma atuação complementar, mas quem formula as políticas é o Itamaraty".
Diplomatas contrariados
Apesar disso, a política externa de Lula começa a contrariar parte dos diplomatas, que vêem reproduzida agora a disputa Planalto-Itamaraty que já houve durante o governo Itamar Franco, justamente quando Celso Amorim também era ministro.
A diferença, disse um diplomata, é que naquela época a "eminência parda" era o então embaixador em Portugal, José Aparecido de Oliveira, que era muito amigo de Itamar e interferia basicamente na política de pessoal (quem serve onde). Hoje, a interferência é tida como mais grave, porque na própria política.
Como pano de fundo das insatisfações, há o veto direto de Lula a embaixadores cuja mensagem de remoção já havia sido enviada ao Congresso pelo governo Fernando Henrique Cardoso. Valdemar Carneiro Leão iria para a Venezuela, Antônio Dayrell de Lima, para Cuba, Antonino Gonçalvez, para a Bolívia, e Marcelo Jardim, para a China. A nomeação de todos eles está em suspenso.
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Assessor de Lula gera crise no Itamaraty
ELIANE CANTANHÊDEDiretora da sucursal da Folha de S.Paulo em Brasília
Os arroubos de hegemonia na América do Sul e as ostensivas manifestações favoráveis ao presidente venezuelano, Hugo Chávez, começam a criar constrangimento em setores do Itamaraty, que ontem se preocupavam com os protestos diante da Embaixada do Brasil em Caracas.
A atuação do presidente Luiz Inácio Lula da Silva pró-Chávez e sua simpatia pelo ditador Fidel Castro, de Cuba, insinuando um confronto com os Estados Unidos, podem gerar o primeiro conflito interno do novo governo. Mas nos bastidores, porque diplomatas em geral são cuidadosos, disciplinados e muito apegados à carreira.
Os descontentes acusam o governo Lula de, além de interferir em questões internas de outro país, tomar partido de um dos lados, quando a Venezuela está rachada ao meio. Uma aposta de risco. Caso os opositores vençam, o Brasil terá criado dificuldades com os EUA e simultaneamente perdido a aliança histórica com a Venezuela.
A postura indicada como ideal pelos setores contrariados é a do presidente do Chile, Ricardo Lagos, que não se intrometeu diretamente na crise venezuelana, acompanhando à distância.
"Fora ianques"
A reação dos opositores de Chávez contra a Embaixada do Brasil em Caracas, exposta, por exemplo, na primeira página de ontem da Folha de S.Paulo, lembrou a embaixadores mais experientes o "Fora ianques" que a esquerda brasileira gritava contra os EUA na década de 60. Ou seja: os protestos estão sendo contra o que esses embaixadores classificam de "ameaça hegemônica" do Brasil.
Quando o presidente norte-americano Richard Nixon disse que "para onde o Brasil se inclina a América do Sul se inclina", achou que era um elogio, mas a frase até hoje causa mal-estar.
A diplomacia brasileira tenta se livrar do estigma de "liderança" ou de "hegemonia" nas relações com os vizinhos. Para fugir de disputas, ciúmes e reações não só dos governos mas também de setores organizados das populações da região.
Nos corredores do Itamaraty, aponta-se como o principal responsável pelos erros da política externa logo no início do mandato de Lula o seu assessor especial Marco Aurélio Garcia, que foi mentor do PT nessa área nos últimos dez anos e está no Palácio do Planalto agora para orientar o presidente.
Foi Garcia, inclusive, que levou pessoalmente à Petrobras, na semana passada, a lista de reivindicações do governo da Venezuela para tentar driblar os efeitos da greve geral naquele país, iniciada em 2 de dezembro. Até agora, não houve uma resposta formal do Brasil, mas o presidente da estatal, José Eduardo Dutra, foi chamado a Brasília amanhã.
Em alguns gabinetes do Itamaraty, Garcia vem sendo chamado de "amador" e de "franco-atirador". No balcão de apostas sobre o que deverá acontecer, dá-se como certo de que a médio prazo deverá ser "premiado" com uma embaixada no exterior.
Fator de equilíbrio
Embaixadores identificados com o governo tucano ou simplesmente independentes resolveram "cerrar fileiras" a favor do chanceler Celso Amorim, elogiado por praticamente todas as correntes como um "diplomata completo", o "melhor de sua geração". Acham que ele é "o fator de equilíbrio" na escalada pró-Chávez.
O mais comum é que, ao falarem de Amorim, seus agora subordinados listem uma série de qualidades: foi primeiro lugar no Instituto Rio Branco, tem sólida formação acadêmica e senso prático, já atuou tanto politicamente quanto em questões econômicas em organismos internacionais.
Ouvido pela Folha de S.Paulo sobre esse tipo de reação, Marco Aurélio Garcia riu: "Tudo isso é uma besteira. É que as pessoas têm dificuldades de entender que este é um governo diferente, com gente diferente, e logo vão entender que eu e o chanceler Amorim temos uma enorme afinidade de pensamento e de visão política".
Depois, acrescentou: "Eu tenho o mais absoluto reconhecimento de que ele [Amorim] é o melhor diplomata da ativa. Eu tenho uma atuação complementar, mas quem formula as políticas é o Itamaraty".
Diplomatas contrariados
Apesar disso, a política externa de Lula começa a contrariar parte dos diplomatas, que vêem reproduzida agora a disputa Planalto-Itamaraty que já houve durante o governo Itamar Franco, justamente quando Celso Amorim também era ministro.
A diferença, disse um diplomata, é que naquela época a "eminência parda" era o então embaixador em Portugal, José Aparecido de Oliveira, que era muito amigo de Itamar e interferia basicamente na política de pessoal (quem serve onde). Hoje, a interferência é tida como mais grave, porque na própria política.
Como pano de fundo das insatisfações, há o veto direto de Lula a embaixadores cuja mensagem de remoção já havia sido enviada ao Congresso pelo governo Fernando Henrique Cardoso. Valdemar Carneiro Leão iria para a Venezuela, Antônio Dayrell de Lima, para Cuba, Antonino Gonçalvez, para a Bolívia, e Marcelo Jardim, para a China. A nomeação de todos eles está em suspenso.
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