A vitória em Hockenheim tornou agudo um sintoma que Barrichello
vem apresentando desde que assinou pela Ferrari: o discurso
esquizofrênico.
Tentando administrar o inadministrável, suas declarações são
dadas conforme a necessidade e a nacionalidade dos microfones.
Para a mídia brasileira, por exemplo, ele alimenta esperanças,
deixa em aberto a possibilidade de lutar pelo título, reafirma
seu respeito pela escuderia e pelo companheiro, mas nunca
admite sua condição de segundo piloto.
Para o resto do mundo, seu discurso é mais ameno, polido,
como a frase proferida anteontem, quando indagado sobre o
que aconteceria se liderasse uma prova com o alemão na cola.
"Honestamente, não sei. Provavelmente, decidiríamos pelo rádio."
Honestamente, qualquer um que acompanha minimamente a F-1
sabe o que iria acontecer.
Barrichello só desistiu dessa inábil postura política nas
semanas que antecederam a vitória na Alemanha, quando a falta
de desempenhos convincentes o deixou sem saída. Dessa fase,
outra pérola, já registrada em coluna anterior: "É essa minha
paciência, é essa minha vontade que vai me trazer um dia uma
vitória".
A vitória já veio. E a expectativa do público, refletida nas
chamadas da Globo para o GP da Hungria, embaladas com exagero
pelo Tema da Vitória, é muito maior, tornando a situação do
piloto brasileiro ainda mais complexa.
E Barrichello, no lugar de adotar uma atitude mais sóbria,
mais equilibrada, voltou à carga.
Apenas para demonstrar como a realidade européia de Barrichello
é diversa da que experimentamos por aqui, Mika Hakkinen, em
Budapeste, resolveu criticar a Ferrari pela postura adotada
em relação ao brasileiro. "É horrível sair à pista sabendo
que você só pode ser o segundo."
(Faltou perguntar ao finlandês se essa não era a mesma sensação
de seu companheiro de equipe.)
Outro exemplo? A jornalistas brasileiros, Barrichello afirma
que Hungaroring é um de seus circuitos preferidos, onde sempre
obtém bons resultados. Sua melhor posição, até aqui, foi um
quinto lugar, e, no comunicado de imprensa da Ferrari, o piloto
afirma que não gosta da pista.
Neste momento, porém, mais do que o discurso, a situação do
piloto é que é esquizofrênica.
De um lado, precisa satisfazer a expectativa de seu público.
De outro, a expectativa da Ferrari, oposta, que é dar prioridade
para Michael Schumacher.
Falar apenas o conveniente é pouco para resolver o problema.
Ainda mais esquizofrênicos do que Barrichello, pilotos da
Indy foram a Brasília nesta semana tentar uma carência no
projeto de lei que proíbe publicidade de cigarros no país,
aprovado em primeira votação na Câmara.
Um deles chegou a afirmar que "não era a favor do cigarro",
mas que dependia do patrocínio tabagista para continuar a
correr.
Será? É mais fácil crer que ele só está lá por causa do patrocinador,
não por sua capacidade na pista.
Aliás, é a explicação para uma empresa gastar US$ 10 milhões
por ano a despeito do carro com sua marca raramente vencer.
NOTAS
Novidade
A TV digital continua inventando na Europa. Ontem, na transmissão
do treino, uma câmera transmitiu imagens de dentro do cockpit
do Arrows de Pedro de La Rosa, acompanhando o movimento de
seus pés nos pedais.
F-3000
Budapeste abriga hoje a penúltima etapa da temporada. Ontem,
na classificação, Bruno Junqueira obteve a pole. Nicolás Minassian,
francês que divide a liderança do campeonato com o piloto
brasileiro, larga em quarto.
Zonta
Rejeitado pela BAR, que deve promover o novo contratado Olivier
Panis na Bélgica, Ricardo Zonta já tem traçado seu futuro,
que não é a Indy, escapatória de muitos brasileiros nos últimos
anos: vai tentar ser piloto de testes da Jordan ou da McLaren.
E-mail: mariante@uol.com.br
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