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05/11/2011 - 07h14

Texto sobre cineasta Paradjanov é censurado em mostra do artista em SP

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FRANCESCA ANGIOLILLO
EDITORA-ADJUNTA DA ILUSTRADA

Quem, neste fim de semana, for visitar a bela mostra "Paradjanov, o Magnífico" -- com cerca de 60 colagens que o cineasta georgiano de origem armênia fez, ao longo de anos em que foi censurado pelo regime soviético -- vai ver algo diferente do que encontraria se fosse na semana passada.

A Folha verificou, no domingo passado (30) que havia um "branco" no texto de parede em que se explicavam as razões para a prisão de Sergei Paradjanov (1924-1990). Onde as letras adesivas foram arrancadas, podia-se ler, porém, a frase original (o que foi retirado está abaixo entre colchetes):

"Sua postura aberta[mente homossexual] e sua abordagem pouco ortodoxa do cinema não são bem vistos pelos oficiais soviéticos."

Funcionários do MIS informaram que Zaven Sargsyan, o curador do museu dedicado ao artista em Ierevan (capital da Armênia), arrancou "com a mão dele" as letras.

A informação foi confirmada pela produção da Mostra Internacional de Cinema de São Paulo --que trouxe a mostra como evento paralelo ao festival, durante o qual foi exibida também uma retrospectiva de nove filmes de Paradjanov.

Segundo a Mostra, o texto que seria colado na parede inicial da exposição foi enviado, em português e em inglês para o museu armênio, antes da montagem. Pouco antes da abertura da exposição, Sargsyan teria pedido a modificação, explicando que julgava ªreducionistaº a maneira como a prisão de Paradjanov fora descrita no breve texto.

Diante da negativa da organização do evento, após a abertura, Sargsyan descolou o trecho julgava equivocado.

Divulgação
Retrato de Paradjanov feito em 1988
Retrato de Paradjanov feito em 1988

Em e-mail à Folha, o curador expôs as motivações para o ato, que poderia parecer aos olhos dos visitantes uma censura extra a um artista tão censurado em vida.

"Os desastres de Paradjanov começaram em 1963, com o sucesso de seu 'Sombras dos Ancestrais Esquecidos'. Sua arte se configurou como desnecessária e até perigosa aos olhos do regime soviético", disse.

Sargsyan explicou que, desde 1965, o artista vinha sido perseguido e que, em 1971, antes de apresentar em Minsk, na Bielorrússia, seu "Sayat-Nova" ("A Cor da Romã", um dos filmes que vieram para a Mostra), ele falou por três horas sobre o filme e sua visão da arte.

"O discurso foi gravado por membros da KGB [serviço secreto soviético] e enviado a Moscou e, depois, pelo chefe da KGB, Yuri Andropov, para o Kremlin [sede do governo]."

Em seu relato, o curador diz que o cineasta acabou preso em 17 de dezembro de 1973, sem razões claramente estabelecidas. Foi acusado de comprar e vender antiguidades e ícones (figuras religiosas), "o que era considerado especulação na União Soviética e, por isso, proibido".

Após protestos da comunidade artística Europa afora, apareceu uma acusação de homossexualismo. "A KGB deu uma ordem --comprovada em documentos recentemente divulgados-- de atacar sua reputação."

Por fim, Paradjanov foi condenado a cinco anos de prisão --que se tornaram quatro, graças a esforços de Lily Brik (musa de Maiakovski e da vanguarda russa) e do escritor francês Louis Aragon. Ele foi proscrito e exilado, só podendo viver na Geórgia, onde nasceu. "Foi quando produziu a maior parte de suas colagens", conta o curador.

Paradjanov voltaria a ser preso em 1981, após um novo discurso, proferido em Moscou, sobre uma performance teatral proibida. A acusação, dessa vez, diz Sargsyan, foi de subornar autoridades. A prisão durou oito meses, em que "a pressão pública", relata o curador, acabou forçando sua libertação.

"Conto tudo isso em detalhes para que se entendam as razões de suas prisões."

Na segunda passada (31), dia em que o MIS não estava aberto à visitação, o texto da parede foi renovado, com a anuência de Sargsyan. Ele agora diz:

"Acusado de homossexual e com uma abordagem pouco ortodoxa do cinema, Paradjanov não é bem visto pelos oficiais soviéticos. Durante 15 anos --de 1968 a 1983--, não roda um único filme e é preso duas vezes. Os anos passados nos campos de trabalho soviéticos são os mais negros de sua vida."

 

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