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11/10/2011 - 07h00

Governo prepara nova regra para montadora estrangeira, diz ministro

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DE BRASÍLIA

O ministro do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, Fernando Pimentel (PT), participou do programa "Poder e Política - Entrevista" conduzido pelo jornalista Fernando Rodrigues no estúdio do Grupo Folha em Brasília, gravado em 10.out.2011. O projeto é uma parceria do UOL e da Folha.

Leia a transcrição da entrevista:

Fernando Pimentel - 10/10/2011

Narração de abertura: Fernando Pimentel tem 59 anos e é filiado ao PT. No governo Dilma exerce a função de ministro do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior.

Pimentel é formado em economia pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, a PUC-Minas. É amigo pessoal da presidente Dilma Rousseff. Ambos militaram na luta armada contra a ditadura e foram presos políticos no início dos anos 70.

Pimentel já foi prefeito de Belo Horizonte, até 2008. Na eleição de 2010 tentou uma vaga de senador por Minas. Perdeu para seus opositores: Aécio Neves, do PSDB, e Itamar Franco, do PPS.

Sem mandato, Pimentel foi nomeado por Dilma Rousseff para ser ministro a partir de 2011.

Folha/UOL: Olá internauta. Bem-vindo a mais um "Poder e Política Entrevista".

Este programa é uma realização da Folha de São Paulo, do portal UOL e da Folha.com. A gravação é realizada aqui no estúdio do Grupo Folha em Brasília.

Folha/UOL: O entrevistado desta edição do "Poder e Política" é o ministro do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, Fernando Pimentel.

Folha/UOL: Ministro, muito obrigado por sua presença. Começo perguntando sobre a viagem da presidente Dilma à Europa na semana passada. Ela deu conselhos aos governantes europeus sobre como tratar a crise econômica. Ela não exagerou um pouco?

Fernando Pimentel: Primeiro deixa eu te agradecer o espaço aqui. Nós já estivemos juntos, mas num momento anterior, nesse mesmo espaço. E te dar parabéns pelo trabalho que eu sei que está sendo muito bem avaliado.

No caso da presidenta Dilma lá na Europa, não. Eu não acho que ela exagerou. Eu acho, Fernando, que ela desempenhou o papel que se esperava da chefe de Estado de um país que, de fato, alcançou uma notoriedade, uma visibilidade hoje internacional. O Brasil hoje é muito respeitado. E espera-se do chefe de Estado de um país como o Brasil que tenha posturas claras, decididas. Enfim, que diga o que tem que dizer. E ela disse. Disse claramente, em todas as intervenções públicas, que a crise, para além de ser uma crise econômico-financeira, é uma crise de liderança política, isso é visível. O continente europeu neste momento está perdido num emaranhado de discussões e de disputas políticas que não propiciam soluções, uma saída para a crise... E deu exemplos relativos a nossa história. História do Brasil. Nós enfrentamos crises muito agudas, muito profundas e soubemos sair delas. Enfim, fez uma síntese dessa experiência brasileira em várias ocasiões.

Folha/UOL: Qual a principal diferença, em sua opinião, entre os estilos da presidente Dilma e do ex-presidente Lula?

Fernando Pimentel: Eu não fui ministro do presidente Lula. E sou ministro da presidenta Dilma. Então, para avaliar, eu faria uma avaliação capenga. O que se pode talvez dizer, sem querer ir muito longe, é que o presidente Lula tinha uma presença mais ampla. Eu acho que ele se movimentava de maneira mais ampla no cenário nacional e internacional. Tocava em vários pontos, assuntos, conduzia negociações com muita desenvoltura. E a presidente Dilma é mais estrita a seu papel de chefe de Estado. Ela trabalha muito com essa ideia, da hierarquia, da noção de espaço que ela deve ocupar. Mas ela não vai, não generaliza muito a atuação dela. O presidente Lula generalizava mais. Talvez um pouco pela sua própria história de vida, pela sua formação. Não vejo nisso nenhum demérito nem pra um nem pra outro.

Folha/UOL: O aumento do IPI, Imposto sobre produtos Industrializados, sobre carros importados seria uma diferença possível a ser apontada entre a política econômica de Lula e de Dilma?

Fernando Pimentel: Olha, eu tenho visto muitas análises falando isso: "houve uma mudança na política econômica" ou "inflexão" etc. Eu não acho que houve. Acho que houve uma mudança no cenário. O cenário mudou muito. O cenário internacional, em relação ao governo Lula, mudou muito. Nós temos hoje a emergência de uma crise diferente da crise de 2008 e 2009. Essa crise agora é uma crise que dá a ideia do esgotamento de um modelo. 2008 e 2009 foi uma crise aguda do sistema de crédito especialmente nos Estados Unidos. E uma devastação enorme no sistema financeiro mundial, mas era coisa que se esperava que podia ser resolvido. Deveria ter sido resolvido com medidas fiscais e monetárias adequadas do governo norte-americano. Bem, não foi resolvida. Ela se prolongou e ela agora se transformou em outra coisa. Agora é uma ruptura de modelo. Eu acho que o modelo econômico vigente nas economias desenvolvidas está condenado. Eles vão ter que mudar. Não é possível sobreviver e alavancar economias com déficit público de 9% do PIB, é o caso dos Estados Unidos. Ou de 6%, 7%, como é o caso da maioria das economias europeias. Então eu estou só falando que há uma mudança muito grande do cenário. Como houve uma mudança muito grande do cenário, obviamente o governo reagiu a isso. Como reagiu à crise de 2008 e 2009 com os instrumentos adequados. E essa coisa do IPI para carro importado está dentro deste grande cenário. Uma reação ao momento difícil para nossas empresas, para nossas indústrias. Nós temos a obrigação de defender os emprego gerados no Brasil e agimos desta forma. Não é protecionismo, de forma nenhuma. Mas é uma medida que tinha que ser tomada, acho que foi correta. E não está em desacordo com a política industrial.

Folha/UOL: Houve estudos antes de ser tomada essa medida do IPI? O sr. participou do processo decisório antes que a medida fosse tomada?

Fernando Pimentel: Participei do processo sim, claro. E houve estudos. Nós tivemos que, de certa forma, tomar decisão com mais agilidade do que a gente imaginava. Nós imaginávamos um processo mais longo de negociação com o setor automotivo, mas acabou que isso não foi possível. O quadro era muito grave. Nós tínhamos fábricas já começando a... não digo paralisar a produção, mas reduzir o ritmo de produção, férias coletivas. Isso tem a ver com aquele cenário de antes. Fomos também, de certa forma, ajudados pelo câmbio, porque logo em seguida dessa medida, em função do eminente defaut da Europa, o dólar voltou a se valorizar, e o real voltou a se desvalorizar. Então nós voltamos a um patamar de câmbio de R$ 1,75, R$ 1,80, que é bem mais confortável que aquele de R$ 1,50, R$ 1,54, que era mais ou menos o que estava quando tomamos a medida do IPI. Então tudo isso somado dá um cenário bem melhor do que aquele em que tivemos que adotar a medida.

Folha/UOL: Não teria sido melhor, ainda que o sr. diga que tenha sido necessário uma agilidade extra, ter negociado um pouco mais com o setor todo e não tomar a medida, como parece ter sido, quase que do dia para a noite?

Fernando Pimentel: Esse conjunto de ações que fizemos, no caso do IPI, ele não esgota a ação do governo para a indústria automobilística. Esse não é o regime automotivo definitivo. Esse é um pedaço dele. Eu diria, para ficar mais claro, que nós fizemos um regime automotivo para as indústrias que estão estabelecidas no Brasil. E isso vai abranger a todas. Nenhuma vai ficar de fora, das que estão aqui. Resolveu bem a questão delas.

Agora, nós temos que construir um outro regime automotivo para as indústrias que não estão no Brasil e que querem vir. E são muitas. E são muitas. Nós temos recebido sinalizações de vários países de várias industrias que querem vir para o Brasil. Então o regime que fizemos não se adapta para essas que querem vir. Ele se adaptará daqui a três, quatro, cinco anos, quando elas já estiverem funcionando aqui. Mas nesse período de transição nós vamos ter que estudar uma regra que absorva essas indústrias. É isso que, no momento, a gente está começando a negociar.

Folha/UOL: Parece que nós temos as indústrias que já estão instaladas. As que não vão se instalar nunca, talvez. E algumas que já estão começando a se instalar e apresentaram projetos que, aparentemente, têm intenção real de produzir no Brasil. Mas também que, por óbvias razões, não teriam como, de uma vez, nacionalizar a produção. Para essas qual deveria ser o modelo de implantação?

Fernando Pimentel: Pois é. É isso que nós estamos neste momento começando a discutir com o setor. Evidentemente tem que ser um modelo gradual. Nós não podemos exigir que a indústria comece com 65% de conteúdo local porque esse é um índice que as próprias indústrias que já estão aqui levaram anos para obter. Nós temos que graduar isso. Agora, qual a graduação, se é 20%, se é 30%... Quanto é no primeiro ano, quanto é no segundo, quanto é no terceiro... Qual o horizonte de tempo? Isso tem que ser objeto de um estudo mais aprofundado que, neste momento, ainda está sendo feito.

Folha/UOL: Algumas montadoras estrangeiras argumentam o seguinte: eu tenho intenção real de entrar, vou fazer uma fábrica, está aqui o meu plano. Mas nesse período de tempo, até a fábrica construir eu preciso continuar a importar alguns veículos para desenvolver o meu mercado. Neste período de tempo elas vão ter que amargar os 30% a mais de aumento no IPI ou é possível também neste caso haver um escalonamento?

Fernando Pimentel:Não. Esta questão nós não chegamos a discutir ainda. Nós estamos neste momento discutindo a outra questão, essa do conteúdo local, da gradação da exigência ao longo do tempo. Eu acho, e aí não é opinião, eu posso falar um pouco pelo Ministério [do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior], mas eu acho difícil que essa regra dos 30% de IPI mude imediatamente. Mesmo diante do pedido dessas indústrias, considerando o argumento que você mencionou. Por quê? Porque a medida foi tomada com prazo de validade. Os 30% de IPI foram tomados até dezembro de 2012. Quer dizer, é um ano só. O final deste ano e mais o ano que vem. Eu não acho que seja tão relevante assim para a implantação de uma indústria que venha para o Brasil este um ano e três meses de imposto. Então é possível que a gente não mude. Mas não vou dar uma resposta definitiva. Vamos ver as reivindicações, vamos ver o que as indústrias estão pedindo. Se for alguma coisa razoável, evidentemente o governo pode adotar.

Folha/UOL: O que seria razoável?

Fernando Pimentel:Não sei, tem que esperar ver as propostas dela.

Folha/UOL: Agora, o escalonamento de 65% do carro produzido aqui, o sr. acha que é exequível haver esse escalonamento?

Fernando Pimentel:Eu acho que é. Acho que é exequível e acho que é justo. Porque nenhuma das que estão aqui começou com 65%. Nem Volks, nem a Ford, nem a Fiat, nem a GM, para falar só das quatro grandes. Mas tem outras. Tem a Honda, tem a Toyota, que já estão produzindo. A própria Nissan-Renault. A Peugeot, os franceses que estão aqui. Ninguém começou com 65%. Todo mundo começou com menos. Então, por uma questão de equidade, nós vamos ter que graduar. Isso eu acho que não tem muito problema essa decisão. Tem que ver as propostas que virão das empresas nesse momento elas estão começando a apresentar. Vamos aguardar.

Folha/UOL: Tem uma frase antiga que, todos nós conhecemos: "O Exemplo vem de cima". Tem essa ideia ou percepção de que a economia do Brasil ainda é pouco eficiente em determinados setores, uma visão mais geral, apesar dos avanços recentes. E quando a gente olha para o governo federal, por exemplo, são 38 ministérios. Nunca o Brasil teve tantos ministérios. Logo terá o 39º, já foi pré-anunciado, da Pequena, Micro-Empresa. Esse grande número de ministérios não é um contraexemplo para a sociedade?

Fernando Pimentel:Mas eu não sei se a forma de medir a eficiência, a capacidade, é a quantidade de órgãos. Nós podíamos ter oito ou dez ministérios enormes, gigantescos, paquidérmicos e que também seriam criticados por não funcionar porque eram grandes demais, paquidérmicos demais e o ministro não tinha condição de operar com todos.

Folha/UOL: Mas precisa ter tanto ministério?

Fernando Pimentel:Eu acho que sim. O Brasil é um país grande, de dimensões continentais. Os temas são múltiplos. Você pode estudar um outro modelo. Um modelo em que você tivesse alguns ministérios de coordenação e outros ministérios de execução. Mas ao fim e ao cabo seriam ministérios. Quer dizer, essa ideia de você ter um ministério e um subministério... no fundo eu não sei se esse é o nosso problema. Sinceramente, eu não sei se esse é o nosso problema.

A presidenta Dilma no começo do governo, três, quatro meses depois de ter iniciado, criou a Câmara de Gestão, que é um organismo importante. Está produzindo um bom efeito. São quatro ministros e quatro empresários. O presidente da Câmara de Gestão é o empresário Jorge Gerdal. O que é a Câmara de Gestão? É um fórum criado para tentar trazer para dentro do governo a visão gerencial que a iniciativa provada utiliza. Nós não vamos ter a ilusão de que o governo vá funcionar como empresa porque não é assim, nem pode ser assim. Empresa é empresa. Mas que nós podemos adotar as melhores práticas da iniciativa privada naquilo em que elas foram aplicáveis à atividade pública, podemos. A Câmara de Gestão tem feito isso. Está fazendo um trabalho de acompanhamento das iniciativas da Copa do Mundo [de 2014, que o Brasil vai sediar], está fazendo um trabalho de acompanhamento da questão dos aeroportos. Muito importante, muito interessante, dando reforço considerável para a Secretaria da Aviação Civil que foi recém criada. Enfim, está desempenhando um papel importante. Esses resultados, claro, demoram um pouco para aparecer. Não vai ser de hoje para amanhã. Mas ao longo de quatro anos eu tenho certeza de que a qualidade de gestão, a qualidade gerencial do governo federal vai mudar para melhor. E isso vai ficar visível.

Folha/UOL: A oscilação do dólar tem deixado investidores, empresários um pouco aflitos. Qual é a sua expectativa para a taxa de câmbio real-dólar neste ano e no ano que vem?

Fernando Pimentel:Pois é. Falar de taxa de câmbio sempre é um risco porque você não sabe. O câmbio é flutuante e nós estamos... Hoje a economia brasileira é muito suscetível à flutuação das moedas a nível internacional. O câmbio é flutuante e nós temos hoje uma relação econômica com o exterior muito maior do que já tivemos na nossa história. Mas eu acho, para não ficar enrolando, eu acho o seguinte: eu não prevejo que o dólar vai cair de novo a um mês, dois meses atrás e que assustou todo mundo. R$1,54, R$ 1,53. Porque é insustentável. Nós não... a relação econômica entre a nossa moeda e o dólar realmente não é tão baixa. Também não acho que o dólar vá para três reais. Então o que é a ideia? O dois por um é razoável. Alguma coisa perto de R$ 2... R$ 1,80, R$ 1,74, R$ 1,75... É o que eu acho que é. É o que eu acho que corresponde hoje à nossa realidade. Agora, as flutuações também tem a ver com os movimentos do mercado. O mercado financeiro você conhece, investidores executam operações para fazer lucro de curto prazo. Isso pode impactar. Mas se nós fizermos uma curva mais de longo prazo eu acredito que a posição do real em relação ao dólar vai ser mais ou menos isso. Em torno de dois [reais] por um [dólar]. Pra baixo disso.

Folha/UOL: Abaixo de R$ 2?

Fernando Pimentel:Abaixo de R$ 2, mas não R$ 1,5.

Folha/UOL: No ano que vem [2012] idem?

Fernando Pimentel: Aí tem que ver o que vai acontece com o comércio internacional, com o mundo financeiro internacional. Porque o ano que vem é uma incógnita. O ano que vem depende muito do que a Europa fizer nesses três últimos meses deste ano [2011].

Folha/UOL: Juros: o Banco Central deve manter a trajetória descendente da taxa de juros?

Fernando Pimentel: Não sei... Esse aí é um assunto tabu. Quem decide isso é o Copom [Comitê de Política Monetária] que tem total autonomia para decidir. Agora, o que nós podemos dizer e que a presidenta Dilma tem dito e nós todos, ministros da área econômica, temos dito também é que o governo está fazendo o maior esforço para criar condições para baixar a taxa de juros. Agora, se ela vai baixar ou não, a última ata do Copom mostrou que baixou em função da expectativa que eles têm sobre a crise externa. Não acho que isso tenha mudado. Mas se eles vão continuar baixando ou não depende deles. Cabe ao governo não ficar arbitrando nem sugerindo nada no que diz respeito à taxa de juros porque isso aí é autonomia do Banco Central e do Copom mas sim criar condições fiscais para que o Banco Central fique confortável para tomar sua decisão.

Folha/UOL: Na sua avaliação já há condições fiscais, macroeconômicas dadas para que o Banco Central se sinta à vontade para baixar mais?

Fernando Pimentel: Tanto que ele baixou né.

Folha/UOL: Na próxima?

Fernando Pimentel: Bom, na próxima eu não sei. Estão sendo criadas as condições. Nós aumentamos o superávit primário num volume bastante significativo. E acho que o resultado de setembro das contas do governo, setembro acabou... não tem ainda as contas, mas quanto tiver eu tenho a impressão de que vai ser um resultado muito bom também.

Folha/UOL: Quem serão, nos próximos cinco ou dez anos, os principais parceiros comerciais do Brasil?

Fernando Pimentel: China em primeiro lugar. Sem sombra de dúvida. Não tem como nós substituirmos o mercado da China por outro mercado. Isso daí é uma relação estratégica, de longo prazo, que vai perdurar. Em primeiro lugar a China. Acho que teremos relações também com os Estados Unidos, que nós somos do bloco do dólar, nós somos ligados até pela continuidade territorial do nosso continente aos Estados Unidos. Acho que o segundo parceiro importante nosso vai continuar sendo o Estados Unidos.

Depois, aí depende muito do que vai acontecer com a comunidade europeia. Eu tendo a crer que nós vamos aumentar muito a nossa presença na América Latina. Tendemos a aumentar muito a nossa presença no mercado latino-americano. Temos um comércio muito forte com a Argentina, mas nós podemos expandir. Nós podemos aí nessa iniciativa da Unasul [XXX] eu acho que o Brasil pode conquistar uma posição importante. Seja como exportador de mercadorias, seja como exportador de serviços. Porque a presença de empresas brasileiras em todos os países do continente hoje é muito forte e muito bem quista, muito querida. As empresas de serviços, não só as construtoras, mas outros tipos de serviços que podem ser prestados. E a Europa vai depender muito da crise, como nós vamos entrar no mercado europeu ou continuar presentes no mercado europeu.

Folha/UOL: O sr. é ministro de uma área técnica-econômica, mas é também político. Que conselho o sr. daria com um pé nessas duas canoas para seus colegas governadores, políticos em geral, que negociam hoje um acordo para divisão dos royalties do petróleo da chamada camada do pré-sal?

Fernando Pimentel: Assim, não é conselho, né. Conselho a gente não dá. Eu poderia fazer uma observação.

Folha/UOL: Qual seria?

Fernando Pimentel: É o seguinte: é hora de ser generoso. A riqueza do pré-sal é incomensurável. O Brasil teve um... é quase que uma dádiva isso aí. Quase, não. É uma dádiva. Então nós temos, todos nós brasileiros que ser generosos uns com os outros. Eu acho que os Estados produtores têm sim o direito de ter uma parcela maior que os demais Estados. É natural que seja assim. Mas eles têm que entender que o Brasil inteiro precisa se beneficiar dessa dádiva. Ela foi dada para todos. Não foi dada só para os produtores. Que eles tenham o quinhão maior, sem dúvida. Mas que haja alguma equidade na hora de distribuir o restante. Eu não vou além disso. Porque senão seria entrar no detalhe e aí nós podemos... [risos]

Folha/UOL: Uma pergunta mais política então. Um dos Estados produtores mais notórios que é o Rio de Janeiro tem em sua defesa os políticos do Rio, sobretudo o governador do Rio Sérgio Cabral, do PMDB, aliado do governo federal. E ele tem sido muito enfático nas suas declarações sobre a irredutibilidade da proposta que ele tem para manter esses lucros aí do petróleo do pré-sal. Ficou numa situação difícil porque se ele for generoso como o sr. diz, o que talvez fosse bom para o Brasil, ele talvez fique mal com seus eleitores no Rio. Como ele acha uma saída agora?

Fernando Pimentel: Não sei. Esse é o ônus de ser governador de Estado numa República Federativa em que os governadores têm um papel muito importante. Os governadores não são peças decorativas. Viajando pelo mundo e vendo como é que funciona em outros países desenvolvidos a gente chega à conclusão que no Brasil, de fato, a federação funciona. Aqui o prefeito tem poder, o governador tem poder e o presidente da República também tem. Então o nosso amigo Sérgio Cabral, de fato, tem um...

Eu acho, se me permite outra observação, que nesses momentos é sempre bom pensar em uma transição. Pode ser que, e o governador tem razão em certa medida, deverá ter razão quando alega que o Rio precisa muito de recurso agora nessa fase em que ele está começando a se recuperar e tem problemas graves de segurança e de saúde e vai precisar de recurso para reestruturar o seu Estado. Mas isso não é permanente. Então vamos construir uma regra de transição em que os Estados produtores comecem com um pouco mais e, depois, caminhem para uma situação em que ele, aí sim, possam praticar a generosidade que eu mencionei antes.

Folha/UOL: A revista "Veja", recentemente, publicou imagens nas quais o sr. aparece com outros políticos em um hotel visitando o ex-ministro José Dirceu. O que o sr. conversou com ele?

Fernando Pimentel: Conversei sobre política. O ministro é um quadro político importante do meu partido. O ex-ministro. Um quadro político importante do meu partido, é meu amigo, companheiro de muitos anos. E ocasionalmente a gente conversa. Não é frequente, mas coincidiu que naquele período ali eu tinha de fato estado lá. De vez em quando eu converso com ele. É normal. É da vida política. O Zé Dirceu é uma pessoa que tem papel na política brasileira, ainda que tenha sido cassado pela Câmara [dos Deputados]. Ele está com os direitos políticos suspensos mas ele tem um papel.

Folha/UOL: O PT, seu partido, deve continuar com a política que tem apresentado nas últimas eleições de fazer amplas alianças e coalizões com quase todos os partidos do espectro político-partidário brasileiro?

Fernando Pimentel: Eu creio que sim. E eu defendo essa posição já há muito tempo. Eu acho que desde que, pelo menos desde que nós elegemos o presidente Lula pela primeira vez em 2002. Eu acho que nós passamos daquela fase, o partido, de ter que apresentar candidatos a todos os cargos, em todas as eleições, quase que de forma compulsória para conquistar espaço, para marcar posição, para fazer propaganda da sua agenda, do seu programa. Isso passou. Nós somos o maior partido político do Brasil, um dos maiores do mundo. Nós não precisamos estar fazendo isso. Essa é a forma adequada de gerir, de conduzir um partido que tem 30% da preferência nacional. Pelo menos é o que eu vejo nas pesquisas. Inclusive no Datafolha. E que elegeu duas veze sum presidente da República e, agora, a terceira vez. Um partido com essa dimensão, ele tem que ser flexível, realista. Onde ele não tiver chance de ganhar, para que lançar candidato se nós temos partidos da base aliada que podem eleger prefeitos e governadores com o nosso apoio e nós participarmos do governo? É assim que tem que ser.

Folha/UOL: Em 2008, o sr. participou dessa operação em Belo Horizonte, o sr. era prefeito, para fazer o seu sucessor que foi Márcio Lacerda, do PSB, com apoio do PSDB, dos tucanos. Uma parcela do PT até hoje o critica por essa aliança com os tucanos em Belo Horizonte. O sr. acertou ou errou?

Fernando Pimentel: Eu acho que nós acertamos. Tanto é assim que o governo do Márcio é bem avaliado pela população de Belo Horizonte. Eu acredito que ele vá ser reeleito. Agora no ano que vem. E quero crer que com nosso apoio de novo, com apoio do PT. Provavelmente mantendo o que temos hoje no governo, inclusive o vice-prefeito de Belo Horizonte que é nosso, é do PT. Não acho que houve qualquer equívoco ali. Aquele momento provocou muito celeuma porque o governador, que era tucano, era do PSDB, deu seu apoio à candidatura do Márcio. Não foi um apoio formal do PSDB à chapa. Eles não entraram na coligação. Mas isso na política às vezes importa pouco. Importa menos o conteúdo real e mais a forma. Como na forma o governador Aécio Neves [do PSDB] teve uma presença muito grande na campanha, na televisão, ficou muito forte que tinha tido uma aliança integral entre os dois. E nunca houve isso formalmente.

Folha/UOL: Mas alguns dizem que o sr. teria apostado numa aproximação maior com o PSDB mais adiante. Tanto é que não ocorreu que o sr. em 2010 sofreu porque não foi eleito senador. O candidato ao Senado pelo PSDB e o outro pelo PPS, na época Itamar Franco, acabaram eleitos e o sr. não foi eleito.

Fernando Pimentel: Sim, mas não havia nenhum cálculo eleitoral naquele momento. Falei exaustivamente na época, mas... enfim, as pessoas acreditam no que quere e não necessariamente no que é real. Eu dizia: "Não existe acordo eleitoral, futuro. O que nós estamos fazendo é um acordo pela cidade. A cidade quer a continuidade do modelo que construímos aqui". Que era um modelo em que o prefeito tinha um bom entendimento com o governador e um bom entendimento com o governo federal. O prefeito era eu. Tinha um entendimento excelente com o presidente Lula e um entendimento excelente com o governador Aécio Neves. A cidade avançou muito. E a cidade não queria romper esse modelo. Então vamos construir um caminho para manter o modelo em benefício da cidade. Vamos lá em Belo Horizonte agora, está cheio de obras. O governo do Estado continua trabalhando em parceria com a Prefeitura, o governo federal continua trabalhando em parceria com a Prefeitura. Eu estou satisfeito com isso. Toda vez que volto à minha cidade, as pessoas estão satisfeitas com aquilo que fizemos.

Folha/UOL: O sr. então, pelo que eu entendi, apoia a decisão de o PT dar o apoio a Márcio Lacerda do PSB para ser reeleito prefeito de Belo Horizonte?

Fernando Pimentel: Sem sombra de dúvida. Eu acho que é o caminho, é o caminho adequado. O ciclo político no Brasil, hoje, é de oito anos. Quando você elege, o eleitor pensa assim: "Se este governo, que eu estou votando agora, for bom, vou mantê-lo mais quatro". Porque ele sabe que tem reeleição. É o que está sendo agora pensado pelo eleitor de Belo Horizonte. Porque o Márcio está indo bem, por que trocá-lo?

Folha/UOL: Vai ser muito difícil reeditar a aliança, ainda que informal, PT, PSDB e PSB, não é?

Fernando Pimentel: Aí tem que ver as circunstâncias do momento. Eu acho que o momento é outro. O governador Aécio Neves não é mais governador. Ele é uma grande liderança do PSDB regionalmente, nacionalmente tenta se firmar. Recentemente vi uma entrevista dele já se lançando candidato a Presidência da República, isso certamente vai dificultar um pouco aquele formato anterior. Mas eu continuo com a mesma posição: o Márcio é um bom prefeito, a população está avaliando bem. Vamos apoiá-lo, vamos trabalhar para ele ser mais quatro anos prefeito.

Folha/UOL: 2014, o sr. mencionou. Quem deverá ser o candidato do PT a Presidência da República em 2014: Dilma ou Lula?

Fernando Pimentel: Pois é. Nós temos esse bom dilema. Nós temos dois excelentes nomes para presidente da República em 2014. Eu acho que esse é um bom dilema. Vamos deixá-lo para a época adequada. Nós temos só dez meses de governo da presidenta Dilma, vamos deixar para o momento adequado. Mas eu acho que é uma posição muito boa a do partido hoje, a do PT. Tem a maior liderança do mundo eu diria, do ponto de vista político social, que é o ex-presidente Lula, e tem uma presidenta que está se saindo muito bem no cargo, está muito bem avaliada e as pesquisas mostram. Então nós estamos muito bem posicionados. A preocupação é do lado de lá. Ainda bem que nós não estamos do lado de lá/

Folha/UOL: O sr. tem uma relação de amizade antiga com a presidente Dilma Rousseff, desde a época em que ambos combatiam a ditadura militar. Quando ela foi eleita presidente da República havia expectativa de que o sr. fosse indicado para algum ministério com funções políticas, até porque é um político também. Não obstante o sr. acabou indo para o Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, que é importante mas de outra área.

Fernando Pimentel: Não... Fui escolhi pela presidenta, fui convidado e aceitei o convite. Eu não acho que eu fosse um quadro tão importante assim no cenário político nacional para ir para algum cargo de tanta proeminência. Ponto número um.

Ponto número dois: a presidenta Dilma, e aí isso eu queria deixar muito claro, não confunde as relações pessoais com as relações políticas e profissionais. Eu tenho relação pessoal sim com a presidenta, de amizade antiga, e tenho muito orgulho disso. Mas eu sou um ministro como os outros. Suscetível aos mesmos critérios de avaliação que qualquer ministro. De maneira que, devez em quando eu vejo na imprensa: "Ah, esse é um mais querido, um menos querido". Isso não conta absolutamente nada do ponto de vista profissional, do desempenho gerencial dos ministérios. Eu sou cobrado igual aos outros e tenho que mostrar serviço igual aos outros. Enfim... não tem nenhum privilégio nisso. E tenho uma relação com a presidenta, que está preservada estando ou não no ministério. Sou amigo, vou continuar sendo amigo dela.

Folha/UOL: Dentro do PT é comum ouvir, sempre nos bastidores por ali, que o presidente Lula não gosta muito do ministro Fernando Pimentel. É verdade?

Fernando Pimentel: Olha, eu nunca ouvi isso. Especialmente dele. Eu tenho uma relação muito boa com o presidente Lula. Falei com ele inclusive há pouco tempo, estive lá em São Paulo. Minha relação com ele é muito boa. Eu acompanho o presidente desde a fundação do PT. Quando fui prefeito, tive do governo do presidente Lula o maior apoio, o maior incentivo. Não procede isso não. Nossa relação é excelente, muito boa.

Folha/UOL: Na campanha de 2010 teve aquele episódio rumoroso, de suspeitas de espionagem dentro da campanha da presidente Dilma e o seu nome era citado naquele episódio junto com o de Rui Falcão [deputado estadual em São Paulo, presidente Nacional do PT] e de outros. Esse episódio acabou talvez sendo determinante para que o sr. não fosse para a área política?

Fernando Pimentel: Não, acho que não. Aquilo ali foi um episódio secundário. Foi uma coisa dessas disputas mesmo dentro das campanhas eleitorais. O jogo eleitoral nas democracias é muito pesado, tem sido. Não é só no Brasil. Quando você observa os países, os grandes países democráticos do mundo, a França, a Alemanha, a Inglaterra, os Estados Unidos da América, o jogo é muito pesado. Justamente porque você tem liberdade de imprensa, você tem uma fluência muito grande de informações e você pode construir episódios que seriam absolutamente irrelevantes, você transforma aquilo num cavalo de batalha para efeitos eleitorais. Foi o que aconteceu naquele momento. Não tenho sequela nenhuma. Aquilo tudo não era sólido...[risos] Como é que é? Tudo o que é sólido desmancha no ar. Aquilo não era sólido e desmanchou-se com o final da campanha eleitoral.

Folha/UOL: Deixe-me voltar a um tema anterior. Esse regime de transição que se pensa para fazer para as empresas que estão vindo para o Brasil, as automobilísticas, qual é a sua expectativa sobre o tempo que será necessário para formatar esse tipo de regime de transição se ele for feito?

Fernando Pimentel: Olha, espero que não muito tempo, porque nós temos prazos dados pelo decreto. Primeiro pela Medida Provisória, mas também pelo decreto. Nós vamos ter, creio, 90 dias para avaliarmos os projetos das empresas que estão protocolando esses projetos. As empresas que querem vir para o Brasil estão protocolando os projetos. Nós vamos ter 90 dias. Antes disso, nós vamos ter 90 dias para avaliar as empresas que se enquadram ou não no regime automotivo. Elas vão ter que mostrar se cumprem os 65% de nacionalização, enfim... E depois, o mesmo prazo para as empresas que estão chegando. Então acredito que até o fim do ano isso tem que estar equacionado.

Folha/UOL: Quantas empresas demonstraram já interesse firme, real, de vir ao Braisl e construir fábricas?

Fernando Pimentel: Olha, primeiro a Nissan-Renaut que já anunciou duas fábricas novas. Isso pós o anúncio do regime automotivo, do novo regime automotivo. As empresas chinesas continuam manifestando interesse, não mudou nada nisso aí. E uma grande empresa alemã também manifestou interesse está fazendo consultas nessa direção. Então eu acho... pelo menos de três ou quatro empresas nós temos com certeza sinais de interesse para vir para o Brasil.

Folha/UOL: E para terminar: o sr. é político. Quando é que o sr. volta às urnas para disputar algum cargo.

Fernando Pimentel: Pois é. Eu não sei. Certamente não agora, no ano que vem [2012]. Eu já fui prefeito, não pretendo sê-lo de novo. Eu fui prefeito muito tempo, eu fui oito anos prefeito...

Folha/UOL: E em 2014?

Fernando Pimentel: 2014 vamos esperar né. Eu acho que há um cenário interessante sendo desenhado em Minas Gerais. Eu acho que nós vamos ter, quem sabe, uma oportunidade interessante de participar do processo eleitoral lá. Mas tudo a seu tempo né. Nesse momento eu sou ministro, tenho trabalhado com muito empenho para construir condições de competitividade para a indústria brasileira, que é uma das tarefas do meu ministério. Ampliar as linhas de comércio internacional do Brasil. Eu acho que eu estou fazendo o meu esforço nessa direção. E observando lateralmente o cenário de Minas Gerais. Eu não posso dar prioridade a isso agora. Eu tenho que cuidar do meu ministério.

Folha/UOL: Não vai ser uma surpresa em 2014 se seu nome estiver numa cédula? Na urna eletrônica?

Fernando Pimentel: Não [risos]. Não vai ser uma surpresa se o meu nome estiver cotado para um cargo. Porque tendo sido prefeito da capital do Estado eu sempre serei lembrado. Mas daí a ser candidato, vamos esperar um pouquinho.

Folha/UOL: Ministro Fernando Pimentel, muito obrigado por sua entrevista.

Fernando Pimentel: Obrigado a você, Fernando, e aos internautas.

 

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