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Análise: Chávez atualiza populismo do argentino Juan Perón
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FEDERICO FINCHELSTEIN
ESPECIAL PARA A FOLHA
As eleições próximas na Venezuela nos pedem uma reflexão sobre a natureza do populismo e da democracia na América Latina. O caso de Chávez é notável como exemplo exagerado de uma tendência mais ampla. Suas formas messiânicas, seu ocasional antissemitismo de viés bíblico ou, mais comumente, sua linguagem religiosa para definir amigos como santos e adversários como demônios, o erigem em líder de uma verdadeira religião política populista.
Sua maneira de apresentar-se com a mencionada religiosidade discursiva e ritual define a forma chavista de fazer política na democracia. Essa vinculação com a democracia ignora dimensões fundamentais do sistema representativo.
Embora a existência de um líder que governa apenas para as maiorias que o elegem e contra aqueles que se opõem a ele não seja uma característica especialmente latino-americana, o que o é, sim, é a combinação populista particular de democracia, reforma social, repressão dos meios de comunicação independentes e/ou opositores, nacionalismo, anti-imperialismo e autoritarismo.
As primeiras configurações históricas do populismo aparecem com o caso já clássico de Juan Perón (1943-1955) na Argentina e encontram na Venezuela nos últimos anos um ponto de atualização simbólica, de mudanças e repetições significativas.
Embora Perón e Chávez sejam militares que participam de um golpe de Estado, seus regimes são assentados mediante eleições claramente democráticas. O que define esses regimes é a relação do líder com seu povo. A política mítica e clientelista predomina sobre outras lógicas sociais, econômicas e culturais. O caso da administração personalista do setor petrolífero venezuelano exemplifica essa situação.
Na ideologia populista, não há mediação alguma entre o líder e as massas. Os líderes populistas não são apenas representantes eleitos para mediar entre os eleitores e as instituições de governo. Eles se apresentam como uma personificação da soberania popular. Consideram-se indispensáveis, e, por isso, precisam ser constantemente reeleitos. Se a norma diz outra coisa, ela é modificada mediante decisões coletivas, como fizeram Chávez no referendo de 2009 e Perón em 1949.
Metaforicamente falando, o líder é o povo e é o Estado. Ironicamente, essa ideologia política tende a estabelecer, na prática, uma distância absoluta entre o povo e o governo. Na ideologia populista, o líder é o povo, mas na prática, em vista da falta de ideais e práticas representativas, os cidadãos não decidem nada que tenha importância. Apenas decidem nas eleições se devem continuar a delegar o poder ao presidente e seu movimento.
O populismo de Chávez não é uma ditadura, mas uma democracia com vazios de conteúdo. É um sistema dual. Mistura a legitimidade democrática outorgada pelo voto com a legitimidade messiânica do líder que sabe que sempre tem razão. Líderes como Chávez sentem-se iluminados por estarem convencidos de que são a melhor expressão da nação e que, por essa mesma razão, os opositores são inimigos do país. Eles combinam essa legitimidade narcisista com a legitimidade popular.
O populismo de Chávez representa uma forma de fazer política que está se ampliando em nosso continente? Os casos concretos de outros líderes como Rafael Correa, no Equador, e Cristina Fernández de Kirchner, na Argentina, com suas doses mais moderadas de mitologia, com o avanço do capitalismo de Estado, a redistribuição efetiva mas limitada da renda, a polarização social, lógicas facciosas e lideranças verticais, parecem dar uma resposta afirmativa a essa pergunta.
No populismo, o poder se baseia nessa combinação mútua de prática democrática e prática messiânica. O Estado e a sociedade são afetados por essa combinação, e o resultado é uma desinstitucionalização da política. Se o líder perde as eleições, surgem oportunidades para reconstruir instituições em ruínas. Às vezes a oposição ao populismo compartilha com este a falta de interesse no diálogo. E o legado do populismo para a cultura política de um país define as práticas polarizadoras de seus opositores e herdeiros.
FEDERICO FINCHELSTEIN é professor de história na New School For Social Research no Lang College, em Nova York. É também diretor do programa Janey de Estudos da América Latina, na mesma universidade.
Tradução de CLARA ALLAIN
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